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Lúcio Vaz

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Benefício para compensar auxílio-moradia de parlamentares já rendeu R$ 3 bilhões a juízes

Desembargadores e juízes do TJSP já receberam R$ 1,8 bilhão de retroativos de auxílio-moradia.
Desembargadores e juízes do TJSP já receberam R$ 1,8 bilhão de retroativos de auxílio-moradia. (Foto: Divulgação/TJSP)

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O auxílio-moradia para juízes foi extinto no final de 2018, mas outro benefício de nome estranho – Parcela Autônoma de Equivalência (PAE) –, gerado por outro auxílio-moradia, já rendeu pelo menos R$ 3 bilhões a juízes e desembargadores de 10 dos maiores tribunais do país. E o benefício continua sendo pago, restando uma dívida de R$ 830 milhões. Só o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) já pagou R$ 1,85 bilhão e ainda vai depositar mais R$ 397 milhões na conta dos seus magistrados.

A PAE refere-se aos cálculos da diferença correspondente ao auxílio-moradia pagos aos parlamentares federais, entre setembro de 1994 a dezembro de 1997, extensível aos magistrados por força da equivalência determinada pela Lei Federal nº 8.448/1992. No Painel de Remuneração dos Magistrados, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as parcelas estão incluídas na coluna “pagamentos retroativos”.

O Tribunal de Justiça do Paraná (PR) pagou R$ 478 milhões, restando R$ 33,5 milhões a serem pagos a aposentados e pensionistas. O Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul (TRT-4) pagou um total de R$ 235 milhões e ainda deve R$ 10,1 milhões a seus magistrados. O TRT-15, do Interior de São Paulo, com sede em Campinas, já gastou R$ 201 milhões com a PAE e deve apenas R$ 2 milhões. O oposto acontece no Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), que pagou R$ 89 milhões e ainda tem uma dívida de R$ 379 milhões.

No TRT do Rio de Janeiro já quitou R$ 67 milhões da PAE, mas ainda faltam R$ 10 milhões. O TRT de Goiás já liquidou essa despesa, no valor total de R$ 39 milhões. No TRT de Pernambuco, a despesa chegou a R$ 17 milhões. No Tribunal Regional Federal da 5ª Região, o passivo foi liquidado em dezembro de 2016, totalizando R$ 47,6 milhões. O TRT de Santa Catarina quitou a dívida em duas parcelas, em dezembro de 2018 e 2019, no valor total de RR 13,6 milhões.

O blog fez contatos com 40 tribunais e solicitou esclarecimentos sobre os valores pagos e a origem da PAE. A maioria não respondeu aos questionamentos. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais informou apenas que 243 magistrados da ativa, 693 inativos e 83 pensionistas ainda recebem esses retroativos. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, como de praxe, solicitou que o pedido fosse encaminhado pela Lei de Acesso à Informação.

A origem da PAE

O Supremo Tribunal Federal (STF) instituiu a PAE entre as remunerações dos cargos dos três Poderes dos Estados em sessão administrativa em agosto de 1992, segundo informou o TJPR. Com a expedição da Resolução nº 195/2000, incluiu na composição da PAE o valor do auxílio-moradia percebido pelos parlamentares na remuneração dos ministros do STF, em cumprimento da decisão proferida na Ação Ordinária nº 630-DF.

O TJPR disse que a dívida vem sendo paga, administrativamente, de maneira parcelada, desde 2008, “para evitar demandas em juízo, inclusive coletivas, o que certamente faria incidir juros e correção monetária mais expressivos, com o crescimento exponencial desse débito em flagrante prejuízo aos cofres públicos”.

O TRT do Rio de Janeiro acrescentou que a PAE tem por fundamento legal a Lei 8.448/1992, que regulamentou os artigos 37 e 39 da Constituição Federal, e foi estabelecida pelo STF para garantir a equivalência de vencimentos entre os membros do Congresso Nacional, ministros de Estado e ministros do STF.

"O desequilíbrio da equivalência”

"Ocorreu que, em razão do Ato da Mesa nº 104/88, os parlamentares passaram a receber a vantagem denominada ‘auxílio-moradia’, que ocasionou o desequilíbrio da equivalência estabelecida no texto constitucional e na mencionada legislação”, destacou o TRT do Rio. “Nesse contexto, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) ajuizou no STF a Ação 630/DF, para incluir no cálculo da PAE o valor de auxílio-moradia pago aos parlamentares, o que foi deferido liminarmente em fevereiro de 2000”.

O TJSP afirmou que a PAE foi reconhecida aos magistrados da corte em dezembro de 2008, com autorização para início dos pagamentos a partir de outubro de 2009. “Desde então, os pagamentos relativos à PAE vêm sendo efetuados na folha de pagamento dos magistrados, de forma parcelada, tendo em vista que a situação orçamentária e financeira deste Tribunal Justiça impede a realização de outra forma. O saldo que remanesce sem pagamento tem atualização monetária mensalmente, com aplicação de correção e juros de mora”.

A curta história do auxílio-moradia

A Lei Orgânica da Magistratura (35/2079) prevê a ajuda de custo para moradia nas localidades em que não houver residência oficial à disposição do magistrado. Mas a Ação Ordinária 1.773, apresentada ao STF, reivindicou a extensão do benefício a todos os magistrados. Em 15 de setembro de 2014, o relator da matéria, Luiz Fux, deferiu liminar estendendo a todos os juízes federais o direito ao auxílio moradia. A decisão foi logo ampliada para os magistrados estaduais, militares e do Trabalho.

Os pagamentos foram regulamentados administrativamente pelo CNJ e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho em outubro de 2014. Na verdade, o auxílio-moradia serviu, durante quatro anos, de setembro de 2014 a dezembro de 2018, como uma compensação à uma alegada defasagem salarial de 16,37%.

Em março de 2018, Fux remeteu as ações em andamento à Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal, a fim de buscar uma solução consensual. Como revelou o blog em 22 de novembro de 2018, a Câmara apontou duas alternativas – a recomposição do subsídio dessas carreiras mediante a elevação do teto remuneratório, com a extinção do auxílio-moradia, e a provação pelo Congresso de adicional por tempo de serviço.

Efeitos prospectivos “ex nunc”

Em 26 de novembro, Fux reconheceu a impossibilidade do recebimento do auxílio-moradia aos magistrados e membros de outras carreiras. Numa linguagem clara, para o meio jurídico, determinou a revogação com “efeitos prospectivos (ex nunc), afastando qualquer pretensão de ressarcimento pretérito ao Erário”. Isso significa que a decisão valeria daquela momento em diante. Ou seja, quem havia recebido parcelas do auxílio-moradia não teria que fazer qualquer ressarcimento aos cofres públicos.

O ministro também determinou que o corte do auxílio-moradia só ocorresse após o pagamento do subsídio dos magistrados e procuradores “majorado pelas Leis 13.752/2018 e 13.753/2018”. As duas leis elevaram o teto dos ministros do STF e do procurador-geral da República para R$ 39.293 – um aumento de 16,37%. O aumento foi concretizado a partir de janeiro de 2019.

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