Com poucos integrantes, mas contando com o apoio do governo Bolsonaro, a Frente Parlamentar em Defesa do Carvão Mineral renasce com força no Congresso Nacional. O objetivo é ampliar a participação do carvão como fonte de geração de energia elétrica – hoje estacionada em torno de 2%. Outra meta da “bancada do carvão” é derrubar o estigma do mineral como fonte de energia que mais agride o meio ambiente.
A frente parlamentar mista é bastante diversificada. Vai do deputado Daniel Freitas (PSL-SC) – do partido de Bolsonaro – ao senador Paulo Paim (PT-RS). Conta ainda com os senadores senador Esperidião Amin (PP-SC) e Lasier Martins (PODE-RS) e com os deputados Afonso Hamm (PP-RS) e Afonso Motta (PDT-RS).
Os 18 integrantes são do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, onde se concentram as termelétricas movidas a carvão. As usinas dos três estados somam 1.567 MW. A maior delas, o Complexo Jorge Lacerda (SC), produz 857 MW, Mas o foco para a expansão está no Rio Grande do Sul.
“Hoje, é possível minerar sem degradar tanto o meio ambiente”, afirma ao blog o presidente da frente, Daniel Freitas (PSL-SC). “É uma energia segura. Se não fosse, a Alemanha não teria 40% da sua energia gerada a carvão”, diz.
No lançamento da frente, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirmou que o setor elétrico brasileiro precisa diversificar a matriz. “Nesse sentido, considera-se a possibilidade de que novas usinas a carvão façam parte da expansão”, disse.
“O ministro vai incentivar o carvão”
Freitas afirma que a proximidade com o governo Bolsonaro vai ajudar a frente: “A minha relação com o ministro e com o governo Bolsonaro é algo que vai fazer bem para essa frente. Nós tivemos a presença do ministro no lançamento desta frente. Foi muito positivo escutarmos o discurso do ministro Bento Albuquerque de que acredita, apoia e vai incentivar o carvão”.
O presidente da Associação Brasileira do Carvão Mineral (ABCM), Fernando Zancan, integrante do Conselho Consultivo da frente parlamentar, está otimista. Ele participou, no governo Temer, da elaboração de um projeto para modernizar o parque termoelétrico. O relatório diz que o governo tem que fazer essa modernização pelas questões econômicas, sociais e de segurança energética no Sul. “O ministro já se mostrou favorável a contratar 1.800 MW nesse programa. O carvão estará em todos os leilões até 2021. Isso dá uma visão de previsibilidade para os investidores que querem desenvolver projetos na área de carvão”, diz Zancan.
Zancan afirma que “o sinal do governo Bolsonaro nesse momento é positivo para a indústria do carvão. Precisamos definir alguns detalhes, como financiamento”. “O BNDES, no início do governo Temer, tinha vetado financiar carvão. Agora tem que discutir esse ponto. E tem que olhar a forma de fazer os leilões.”
Minas a céu aberto
Doze bilhões de toneladas de carvão mineral estão armazenadas no subsolo de Candiota (RS), município com 930 km² de área e apenas 9 mil habitantes, na fronteira com o Uruguai. Isso representa 38% de todo o carvão mineral do país. As minas são exploradas a céu aberto.
Já existem duas usinas em funcionamento no município. A mais antiga, a Presidente Médici, ligada à Eletrobrás, atualmente com 350 MW, foi instalada em 1974. A mais nova, Pampa Sul, com 338 MW, começou a funcionar há um mês. Mas pode dobrar a sua capacidade de geração de energia.
Outras duas termelétricas estão em fase de instalação. A Ouro Negro, associada a grupos chineses, com capacidade para 600 MW, está cadastrada para o leilão de energia de outubro. A Nova Seival, com a mesma capacidade, também está cadastrada, mas terá dificuldades para conseguir o licenciamento ambiental a tempo. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) tem sido rigoroso no controle da poluição do ar e das águas na região.
Na próxima década, o município poderá ter quatro usinas funcionando com capacidade para gerar 2.600 MW. Fernando Zancan, afirma que, pelos estudos feitos pelo Ibama na bacia aérea de Candiota, “pode colocar mais uns 4.000 MW, no mínimo, sem ter comprometimento da qualidade do ar”.
Violação dos limites de emissão de cinzas e dióxido de enxofre
Nos últimos dois anos, as fases A e B da usina Presidente Médici, com potência de 446 MW, foram desativadas depois que o Ibama apurou emissão de gás e cinzas acima dos limites permitidos por lei. Mas as duas fases serão reconstruídas. Está em funcionamento apenas a fase C, que foi construída no governo Lula e começou a funcionar no início do governo Dilma. A usina é administrada pela Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (CGTEE), uma subsidiária da Eletrobrás.
O Ibama apontou, em agosto de 2016, após fiscalização nas fases A e B, descontinuidade nos monitoramentos ambientais de emissões atmosféricas e qualidade do ar, violações dos limites máximos de emissão atmosférica e dos padrões de qualidade do ar de dióxido de enxofre. Diante desse cenário, o instituto concluiu pelo descumprimento dos “critérios de proteção ao bem-estar da população, fauna, flora e ao meio ambiente em geral”.
Em setembro daquele ano, a CGTEE apresentou as informações solicitadas quanto às emissões atmosféricas: “A usina Presidente Médici, fases A e B, não possui tecnologia instalada para redução das emissões de dióxido de enxofre, impossibilitando o atendimento aos padrões definidos em seu licenciamento ambiental. As emissões de material particulado apresentaram-se acima dos limites de emissão devido à perda de eficiência dos precipitadores eletroestáticos”. A CGTEE optou pela desativação das duas fases.
O município já conta com enormes áreas degradadas. O carvão é extraído a céu aberto, sem a utilização de túneis, o que torna o processo mais barato. Durantes décadas, após exaurida uma mina, a Companhia Riograndense de Mineração (CRM), uma estatal gaúcha, passava a ocupar uma nova área, sem recuperar aquela já utilizada. Não havia lei ambiental que exigisse isso. Esse trabalho tem sido feito na última década, mas o passivo ambiental é expressivo.
“Carvão entocado lá no Rio Grande”
O presidente da ABCM fala das vantagens do carvão: “É uma reserva enorme, mas está entocado lá no Rio Grande do Sul. Gera energia elétrica a um preço bastante competitivo. Uma energia nacional que não tem problema de variação cambial. Ou seja, contrata a usina e, por 25 anos, você sabe o preço que vai ter. Não depende de São Pedro, não depende do humor do [Donald] Trump [presidente dos EUA]. E não tem impacto ambiental, com tecnologias que foram aprimoradas. O único problema que o carvão tem é o CO². Mas há projetos no Canadá e Estados Unidos que capturam 90% do CO². A tecnologia avança. Digamos que lá, perto de 2030, a gente já tenha a captura de CO² a preço competitivo”.
Zancan afirma que o carvão mineral é um “ilustre desconhecido” no resto do Brasil porque é uma indústria localizada no Sul. “É usado na produção de aço, de freio de carros, no tratamento de água. Mas também tem a influência de mídia externa muito pesada, os ambientalistas, que estão olhando a questão da fonte, não a questão da emissão. O que interessa para o planeta é reduzir a emissão. Aí, tem que investir em tecnologia para a redução da emissão dos fósseis, não tentar acabar com os fósseis, acabar com o carvão”.
Para o presidente da ABCM, faltou aos últimos governos a decisão de dizer: “Vou usar carvão, sim, porque não tem problema se usar as melhores tecnologias ambientais. Isso não é significativo em termos de emissões globais. Hoje, na China, estão construindo quase um Brasil em usinas térmicas a carvão. São 120 GW. O que estamos fazendo aqui é um grão de areia no clima em termos de emissão. O Brasil vai precisar crescer, vai precisar de todas as fontes, tem reservas de carvão e precisa gerar emprego e renda”.