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“Eu tive a inteligência de perceber que era uma deputada promissora e fui trabalhar com ela”, afirmou o ex-assessor parlamentar e atual chefe de gabinete da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, para explicar como surgiu a oportunidade de ser selecionado para o cargo de adido agropecuário no Canadá, com salário de R$ 70 mil. Paulo Márcio Araújo deixa claro a sua força no ministério: “Ela foi muito generosa em me liberar porque hoje eu sou o braço direito dela”. O adido será indicado pela ministra e nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro.
Em entrevista ao blog, Araújo explica como ingressou na carreira de especialista em políticas públicas, aprovado em concurso público, tendo como curso superior Publicidade e Propaganda. “Foi a opção que eu fiz na adolescência. Em 2004, fiz o concurso público e fui aprovado numa carreira de Estado. Nessa carreira, qualquer pessoa com curso superior pode ser aprovada. Temos lá economistas, engenheiros, formados em educação física, em filosofia”.
Araújo foi questionado se o fato de ser chefe de gabinete da ministra não exerceu pressão sobre quem estava selecionando. “Eu não vejo dessa forma. Ao me indicar para ser adido agrícola, a ministra está colocando o nome dela em xeque sobre os holofotes. Está assumindo uma responsabilidade sobre a indicação. Não é que estejam fazendo um favor para mim. O processo foi conduzido pela Enap [Escola Nacional de Administração Pública]”.
Mas o servidor admite ter uma preocupação: “A única coisa que me preocupa é a exposição da ministra. Seria muito injusto com ela colocar dessa forma: ‘ah, ela pegou um ex-assessor e indicou para ser adido’, como se fosse um favor pessoal”. E acrescentou que outras “autoridades” também foram selecionadas. “Uma pessoa que foi diretor lá e foi selecionada para Genebra. Existem outras autoridades do ministério que participaram do processo seletivo e foram selecionadas”.
Experiência em comércio exterior? Nem sempre
Reportagem publicada no blog no dia 14, registrou que o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Agropecuários defende a vinculação dos adidos agrícolas à carreira que representa. Também reivindica maior transparência no processo de seleção. Em ofício enviado ao Ministério da Agricultura, o sindicato alerta que “retirar a exigência técnica para o cargo é reduzir a eficiência na abertura de mercados e até colocar em risco as exportações já em vigor”.
O blog lembrou a Araújo que a sua participação na Secretaria de Relações Internacionais do Ministério foi por pouco tempo. “Foi pouco tempo em função do convite que recebi da ministra para trabalhar com ela enquanto deputada”, respondeu. Mas logo destacou: “Eu acho que nem sempre os adidos selecionados, mesmo os fiscais federais agropecuários, tiveram experiência específica em comércio. Tem exemplo de quem trabalhou em superintendência e foi para a adidância”.
Ele citou o caso da adida que poderá substituir em Ottawa: “A Luciana [Ambrozevicius], adida que está hoje no Canadá, nunca trabalhou com comércio, até onde eu sei. Ela trabalhava, se não me engano, no laboratório e foi para o Canadá porque tinha experiência em biodiversidade, por conta CDB, a Convenção da Biodiversidade. Então, você faz parte de uma equipe. Você é um facilitador das coisas, não precisa ser necessariamente um especialista”.
“Eu adoraria morar em Paris”
Araújo também argumenta que as atribuições dos adidos agrícolas são diferentes para cada posto. “Eu adoraria morar em Genebra, adoraria morar em Paris, mas eu reconheço que não tenho as qualificações necessários para concorrer a esses postos. Eu não teria qualificação para trabalhar na China porque ela exige que a pessoa seja especialista em questões fitossanitárias. Tem que ter um veterinário especialista em inspeção. Em outros postos, você vai trabalhar mais com promoção comercial”.
Sobre o posto de Ottawa, comentou: “O Canadá é um mercado muito diverso. Nós não temos grande expectativa de exportar carne para lá porque é difícil concorrer com os Estados Unidos. Então, temos que buscar uma diversificação de pauta. Aí que entra a minha experiência. Fui indicado à deputada por conta da experiência que eu tinha no Ministério da Agricultura e da rede de relacionamentos que eu fiz tralhando na coordenação das Câmaras Setoriais. Então, eu entendo que tenho qualificação para o cargo de Ottawa em função da diversidade de temas que teremos ali. É um reducionismo muito grande você dizer que só o fiscal pode ser adido agrícola”.
Araújo destacou ainda que fez um curso de formação de 440 horas na Enap após a posse no cargo de especialista em políticas públicas. “Existe um processo de distribuição de acordo com o interesse e as aptidões das pessoas. Eu fui produtor rural, sou de família de produtores rurais. Eu lido com questões agrícolas desde a minha infância. Escolhi vir trabalhar no Ministério da Agricultura porque eu estava desconte com a publicidade, com a comunicação. Então, surgiu a oportunidade. Eu tive a inteligência de perceber que era uma deputada promissora e fui trabalhar com ela.”
“Ele mexe com sementes”
Araújo foi selecionado na primeira colocação para o posto em Ottawa pelo presidente da comissão de seleção, o secretário de Relações Internacionais, Orlando Ribeiro. O candidato comenta sobre os dois concorrentes: “O Zanata eu conheço. Se não me engano, ele é agrônomo. Eu sabia que era o concorrente mais forte. Não sei se ele tem alguma experiência com comércio e com relações internacionais. Mas acho que não, ele mexe com sementes aqui há muito tempo”.
“O outro é o Rogério. É servidor da Secretaria de Relações Internacionais (SRI) há bastante tempo. Muita gente pede para trabalhar na SRI para se preparar para o concurso. Mas temos uma série de adidos que nunca passaram por lá. No concurso passado, o superintendente do Rio Grande do Sul foi selecionado pra Roma”, conta o chefe de gabinete.
E os critérios para adidos militares?
O “braço direito” da ministra afirma que o Ministério da Agricultura “é o único que tem um processo seletivo aberto, transparente. Por exemplo, você tem o adido militar. Eu não sei qual o critério que o Ministério da Defesa usa para escolher seus adidos. O Jorge Rachid foi secretário de Receita. Quando deixou o cargo, foi designado como adido tributário nos Estados Unidos. Quais critérios foram utilizados lá? Não sei”.
Ele afirma que está tranquilo quanto ao processo de seleção. “A única coisa que me preocupa é a exposição da ministra. Ela tem pautado a atuação dela pela maior correção do mundo. Seria uma injustiça com ela colocar essa pecha de que ela teria me indicado por conta dessa relação pessoal com ela. Essa é a única coisa que me magoa. Do ponto de vista da competência, estou muito tranquilo”.
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