Em setembro do ano passado, o deputado Cabo Daciolo pediu o fechamento do Congresso Nacional. “Deus está no controle. E que se feche o Congresso Nacional, com intervenção federal, com um governo provisório para acertar a nação”, afirmou o parlamentar então filiado ao PTdoB – hoje candidato a presidente da República pelo Patriota. Disse que ali só havia corruptos. A crítica ao Congresso, porém, não o impede de continuar aproveitando as suas mordomias, como viagens pelo país com passagens pagas pela Câmara.
Em quase quatro anos, ele gastou R$ 1 milhão da cota para o exercício da atividade parlamentar. A despesa com passagens aéreas consumiu a maior parte desse recurso: R$ 448 mil, sendo R$ 98 mil para cidades de outros estados, em missões religiosas ou políticas. Ele também gastou R$ 287 mil com consultorias e pesquisas, R$ 106 mil com divulgação do mandato, R$ 70 mil com combustível, R$ 51 mil com telefone, R$ 33 mil com aluguel de veículos e R$ 16 mil com pedágios e táxis. Ele ocupa um apartamento funcional de 225 m² em Brasília desde abril de 2015.
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No dia 10 de março, Cabo Daciolo divulgou nas redes sociais sua viagem a Fortaleza, onde lançou a pré-candidatura ao Planalto. “O mar se abriu e vamos atravessar. Pré-candidatura à Presidência da República com a benção de Deus. Intervenção Divina”, diz o título da postagem no Facebook. “Hoje demos o primeiro passo em Fortaleza e continuaremos a nossa caminhada, visitando outras capitais e municípios”, avisou o deputado. Obteve 153 mil visualizações com essa postagem.
A viagem a Fortaleza não foi de graça. Nos registros da Câmara, há cinco passagens em nome do deputado para a capital cearense – três de ida e duas de volta. Ele deve ter usado apenas duas. Os preços das passagens de volta variam de R$ 1,1 mil a R$ 2 mil. As passagens de ida variam de R$ 710 a R$ 1,3 mil.
No dia 26 de maio, Daciolo alugou um helicóptero para se deslocar do Rio de Janeiro até o quilômetro 91 da Via Dutra, onde teria um encontro com caminhoneiros em greve. Como o tempo estava fechado, não pode prosseguir viagem e fez uma transmissão ao vivo pelo Facebook. “Olha como está o tempo. Não tem como passar. Avisem para que estejam juntos em Brasília”, avisou o deputado. A postagem traz palavras de ordem: “Intervenção do governo provisório de Michel Temer já. Fora Temer!”. Rendeu 85 mil visualizações.
“Mensagem de Deus” para Eduardo Cunha
Em 28 de abril, o pré-candidato do Patriota causou polêmica em evento religioso em Santa Catarina, o 36º Congresso de Gideões, em Camboriú (SC). Ele subiu ao palco e falou: “Deus me traz aqui e fala: não quero pastores maçons em cima deste púlpito”. Ele também disse que Deus esperava dos líderes religiosos presentes que eles repartissem com os fiéis o dinheiro das ofertas que estavam sendo arrecadadas. As passagens aéreas para Navegantes (SC), cidade próxima a Camboriú, foram pagas pela Câmara.
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Num compromisso político/religioso, Daciolo foi a Curitiba em 13 de julho do ano passado. Dois dias antes, relatou um sonho que teve com o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha: “Ele vai falar. Eu quero deixar um recado ao presidente temporário Michel Temer que ele vai falar”. Decidiu, então, levar uma “mensagem de Deus” a Cunha no Complexo Médico-Penal de Pinhais, na região metropolitana da capital paranaense, onde o deputado cassado do MDB está preso na Operação Lava Jato.
Naquele dia, postou no Facebook: “Mensagem de Deus para Eduardo Cunha. Toda honra e glória seja dada ao Senhor Jesus Cristo”. As passagens de ida e volta para Curitiba custaram R$ 2,3 mil. Também ficou registrada uma passagem Curitiba/Brasília para Marcelo Batista, funcionário do seu gabinete, no valor de R$ 1,3 mil.
Como mostram os registros da Câmara, Daciolo comprou 136 passagens para viagens a cidades fora da sua base eleitoral – o Rio de Janeiro. Esteve em Campinas, São Paulo, Fortaleza, Belo Horizonte, Porto Alegre, Vitória, Ribeirão Preto, Curitiba e Navegantes/Camboriú.
Outro lado
O blog procurou contato com o deputado Cabo Daciolo por meio do seu gabinete na Câmara. A esposa dele, Cristiane Daciolo, foi apresentada como responsável pelo contato com a imprensa. Informada sobre o conteúdo da reportagem, afirmou que as viagens para fora do Rio de Janeiro foram para contatos políticos em função do seu mandato.
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“Campinas é um polo próximo a cidades do interior de São Paulo. Ele usa esse aeroporto para fazer esses deslocamentos, ou faz em Campinas mesmo. Geralmente são encontros com políticos. Ele vai muito a Pirassununga porque ele ajuda a Escola da Aeronáutica. São compromissos com o mandato parlamentar”, disse Cristiane.
Ela afirmou que o deputado viaja geralmente de carro quando vai a algum compromisso religioso. Mas confirmou que Daciolo voou até Navegantes para chegar a Camboriú. Acrescentou, porém, que o deputado também fez uma reunião com integrantes de uma caravana para receber alguns projetos.
Em Fortaleza, afirmou Cristiane, o deputado teve um encontro com dirigentes da Associação de Militares. “A maioria dos projetos de lei deles é voltada para os militares. Não tinha a ver com a pré-campanha”, garantiu.
Antes de entrar para política, Daciolo foi cabo do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. Foi expulso da corporação em 2012, após se envolver em movimentos grevistas, mas acabou anistiado no ano seguinte pelo então governador Sergio Cabral. Está em seu primeiro mandato como deputado federal.
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