Além dos elevados salários e aposentadorias, os servidores da Câmara ainda recebem valores vultosos em indenizações de férias e de licenças-prêmio não usufruídas. Somando os dois benefícios, os pagamentos chegam quase a R$ 800 mil em alguns casos. No total, a Câmara gastou cerca de R$ 260 milhões, em valores atualizados pela inflação, com essas indenizações nos últimos dez anos – a maior parte com a licença-prêmio.
As indenizações de férias consumiram R$ 90 milhões, com a correção monetária. Foram contemplados 1.564 servidores, com média de R$ 57,5 mil. No caso das indenizações de licenças-prêmio foram gastos aproximadamente R$ 170 milhões, em valores atualizados. O valor médio pago a 1.134 servidores ficou em R$ 150 mil.
As férias não gozadas na ativa são acrescidas do terço constitucional. O caráter indenizatório do benefício exclui a incidência do Imposto de Renda. O valor integral da indenização cai na conta do servidor.
Os dados foram fornecidos pela Câmara em atendimento a pedido feito pelo blog Lúcio Vaz por meio da Lei de Acesso à Informação. O documento traz a relação nominal de todos os servidores aposentados beneficiados.
Valores mais elevados
Entre os servidores beneficiados pelos maiores valores nos últimos dez anos está Hamilton Cordeiro, que recebeu R$ 74 mil de indenização de férias e R$ 413 mil de licenças-prêmio, no valor total de R$ 787 mil atualizados. Ele tem hoje uma renda bruta de R$ 53,7 mil como aposentado. Mas a Câmara faz uma aplicação rigorosa do abate-teto, que foi de R$ 20 mil no seu caso. Ele recebe líquido R$ 23,5 mil (veja lista dos dez maiores pagamentos no final do post).
Nos casos mais recentes, é possível identificar o valor do salário base do servidor no momento da aposentadoria. Abner de Abreu, por exemplo, que recebeu R$ 405 mil de licenças-prêmio acumuladas, tinha vencimentos básicos de R$ 26,6 mil no momento da aposentadoria, em abril de 2015. A indenização representou o equivalente a 15 salários.
Sílvio Avelino da Silva também foi contemplado com R$ 405 mil com indenizações de licenças-prêmio, mas em setembro de 2016. Ele também recebeu R$ 112 mil de indenizações de férias. Tem hoje renda bruta de R$ 50 mil como aposentado. Com o abate-teto de R$ 17 mil mais alguns descontos, fica com R$ 23,1 mil líquido.
Direito além “dos limites previstos em lei”
A indenização de férias não gozadas e de férias proporcionais passou a ser devida aos servidores públicos federais com a Lei 8.216/91, que alterou a redação da Lei 8.112/90 – sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis federais.
A Câmara ressalta que, embora a norma legal se refira ao servidor exonerado do cargo efetivo, o mesmo tratamento é deferido ao servidor público aposentado, “uma vez que se trata de verba de caráter indenizatório voltada a reparar o dano suportado pelo servidor que se viu impedido, por interesse da administração, de usufruir férias quando em atividade”.
Em seguida, a Câmara cita decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Tribunal de Contas da União (TCU) para justificar a aplicação do direito aos seus aposentados. Decisão da Sexta Turma do STJ diz que o servidor aposentado, “ainda que voluntariamente, tem direito a receber em pecúnia (dinheiro) as férias não gozadas quando na ativa, acrescidas do terço constitucional”.
A decisão do TCU tratou de pedido administrativo do ministro aposentado Adylson Motta para que lhe fossem pagos, a título de indenização, os períodos de férias adquiridos e não usufruídos relativos aos anos de 2004, 2005 e 2006. Motta salientou que “os ministros do STJ, entre os quais os três últimos presidentes, em situação análoga, receberam o pagamento de todas as férias não usufruídas, em um dos casos alcançando os anos de 1965 e 1966”.
No seu voto, o ministro relator no TCU, Raimundo Carreiro, sustentou que se aplicava ao caso a jurisprudência do STJ e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que ampara a indenização de férias não gozadas a magistrados e servidores, “independentemente dos limites de acumulação previstos em lei, sob pena de enriquecimento sem causa da Administração”.
Vedação ao enriquecimento sem causa da administração
A licença-prêmio por assiduidade era devida ao servidor que não sofresse pena de suspensão ou incorresse em falta injustificada. Pela Lei 1.711/52, correspondia a seis meses de afastamento a cada dez anos de serviço. Com a Lei 8.112/90, passou a ser de três meses de afastamento a cada cinco anos de exercício.
A Lei 9.527/97 extinguiu a licença-prêmio e criou a licença para capacitação. Aos servidores que já haviam completado o quinquênio foi assegurado o direito, com as opções de usufruir da licença-prêmio, contá-la em dobro para fins de aposentadoria ou tê-la convertida em dinheiro, em benefício dos sucessores, em caso de morte do servidor.
Novamente o STJ e o TCU decidiram que a conversão em dinheiro é possível na aposentadoria do servidor público federal, “em virtude da vedação ao enriquecimento sem causa pela administração”, diz nota da Câmara dos Deputados.
A Câmara acrescenta que a questão chegou ao Supremo Tribunal Federal, que considerou constitucional a conversão de férias e de outros direitos de natureza remuneratória – entre os quais a licença-prêmio – em dinheiro, reconhecendo a “repercussão geral” da decisão.