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Lúcio Vaz

Lúcio Vaz

O blog que fiscaliza o gasto público e vigia o poder em Brasília

Milhões em autopromoção

Deputados descobrem como ser “digital influencer” com dinheiro público

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Os gastos dos deputados federais com assessores, verbas para o exercício do mandato, viagens e auxílio-moradia em 2019 já somam R$ 723 milhões. E ainda falta o registro de muitas despesas feitas em dezembro. Só os gastos com divulgação – ou autopromoção do mandato – já chegam a R$ 37 milhões: uma estratégia que "ensina" como ser digital influencer com dinheiro público. Nas redes sociais e em site oficial tem até nota de desaparecimento de gato de filha de deputada.

A maior despesa é com o salário dos assessores dos gabinetes dos deputados. Eles contam com cota mensal de R$ 111 mil para contratar até 25 “secretários parlamentares”, com salários que chegam a R$ 15,7 mil.

Os assessores trabalham em Brasília ou em estados dos deputados. Já foram contabilizados R$ 548 milhões, sem contar 13º salário e auxílio-alimentação, pagos pela Câmara fora da cota mensal. Também não estão computados os 785 cargos de natureza especial cedidos para 390 gabinetes de deputados a um custo anual de mais R$ 93 milhões, como revelou o blog em agosto.

O partido que proporcionalmente mais utilizou a verba foi o PV, com 90,8% do total disponível. O PSOL e o PT estão entre os que mais usaram essa cota, com 89,7% e 88,6%, respectivamente.

Em números absolutos, o PT foi quem mais gastou – R$ 61 milhões. Com o mesmo número de deputados, o PSL – partido que elegeu o presidente Jair Bolsonaro – gastou R$ 52 milhões com assessores, ficando na terceira colocação do ranking dos que menos utilizaram a cota – 78% da verba disponível. O campeão desse ranking foi o Novo, que gastou R$ 4,9 milhões com seus oito deputados – apenas 50,3% dos recursos disponibilizados. (Veja lista completa abaixo)

Deputados “digital influencer”: os campeões da autopromoção

As despesas com a cota para o exercício do mandato, o “cotão”, já somam R$ 162 milhões. Muitos deputados utilizam a verba para brincar de como ser digital influencer.

Mais uma vez, foi o Novo quem menos gastou proporcionalmente. Foram apenas R$ 710 mil gastos por oito deputados durante o ano – média R$ 89 mil por integrante da bancada. O partido mais gastador foi o PT, em termos absolutos e proporcionais. A despesa ficou em R$ 19,6 milhões – média de R$ 370 mil por deputado. O PCdoB vem logo atrás, com gasto de R$ 2,9 milhões e média de R$ 362 por deputado.

Líder da bancada do Novo em 2019 e vice-líder em 2020, Marcel Van Hattem, afirmou que “os números e a atuação dos nossos deputados estão demonstrando que os deputados do Novo, apesar de não gastarem muito, tiveram mandatos muito elogiados, inclusive premiados ao longo desse ano. A gente colocou muita ênfase na questão de dar o exemplo e buscar reduzir o máximo possível os gastos nos nossos gabinetes”.

Já o ranking das despesas por deputado é liderado por Jaqueline Cassol (PP-RO), irmã do ex-senador e ex-governador Ivo Cassol. Ela já declarou gastos de R$ 474 mil em 2019, sendo R$ 217 mil com divulgação do mandato. Ela promove o seu mandato em veículos locais e por meio das redes sociais. Também aplicou R$ 12,5 mil em quatro outdoors instalados na praça central de Cacoal para divulgar as suas ações na área de saúde.

Jaqueline também contratou a empresa AZ Soluções Web para desenvolver e instalar o novo layout do seu site. E manteve contrato com a NDA digital para a produção de vídeos e posts para as redes sociais. Entre muitas postagens sobre o seu trabalho parlamentar, ela reservou espaço para declarações de amor ao seu marido e até para comunicar o desaparecimento da gata da sua filha num bairro em Cacoal, inclusive no seu site de deputada federal. (Veja aqui a resposta da deputada sobre os gastos)

Informativos, livros, painéis LED e um "digital influencer apaixonado"

O Delegado Éder Mauro (PSD-PA) consumiu R$ 468 mil, com R$ 229 mil investidos em divulgação. Ele aplicou R$ 71 mil na impressão de boletins informativos e R$ 130 mil na instalação de 280 placas de outdoor sobre a reforma da Previdência na Grande Belém.

Quarta colocada no ranking geral de gastos, a Dra. Vanda Milani (Solidariedade-AC) torrou R$ 261 mil em divulgação, de um total de R$ 459 mil do seu “cotão”. Ela imprimiu 220 mil informativos da atividade parlamentar ao custo de R$ 85 mil. Mas também investiu muito nas redes sociais.

Vinícius Gurgel (PL-AP) gastou um total de R$ 450 mil, sendo R$ 150 mil em divulgação. Ele dividiu a sua verba entre a veiculação de mídia em painéis LED e postagens nas redes sociais. Ele manteve contrato com uma empresa para produção de material e gerenciamento das suas redes. Além da divulgação de verbas que teria conseguido para municípios, postou também declarações de amor à sua mulher, como aconteceu em 12 de junho, quando escreveu: “Vinícius Gurgel está se sentindo apaixonado”.

A estratégia de Gonzaga Patriota (PSB-PE) foi diferente. Ele consumiu R$ 447 mil do “cotão”, com R$ 204 mil aplicados em divulgação. Em abril, ele imprimiu um livro de 480 páginas com o título “Reforma da Previdência Social não”. Os 10 mil exemplares custaram R$ 96 mil. Em dezembro, gastou mais R$ 57 mil para imprimir mais 5 mil livros. Também declarou publicações de matérias “institucionais” na Folha do Sertão, por R$ 11,2 mil. São as chamadas “matérias pagas”.

O campeão na área de divulgação foi Wellington Roberto (PL-PB). Ele investiu 74% da sua cota (R$ 430 mil) na promoção do seu mandato, gastando R$ 319 mil. Quase a totalidade foi aplicado na impressão de 1,1 milhão de informativos parlamentares, ao custo de R$ 139 mil.

Consultorias, escritórios, passagens e jatinhos

Mas nem todos investiram seus recursos em divulgação e aparentes tentativas de como ser um digital influencer. Vicentinho Júnior (PL-TO) já declarou gastos de R$ 330 mil com a empresa de consultoria DMD, que acompanha a tramitação de convênios de prefeituras do estado.

A deputada Magda Mofatto (PL-GO) gastou R$ 161 mil com a manutenção do seu escritório em Goiás. Trata-se de um sobrado no bairro Marista. Além do aluguel do imóvel, no valor de R$ 15 mil, a Câmara paga despesas com telefone, luz, água e até o aluguel de uma máquina de café por R$ 750. Em janeiro de 2019, o custo chegou a R$ 25 mil porque foi paga a parcela única do IPTU, no valor de R$ 6,9 mil.

As despesas com passagens aéreas são obrigatórias. Os valores variam de acordo as distâncias. Mas alguns deputados exageram. O líder desse ranking não foi nenhum deputado de Roraima ou do Acre, mas sim Paulo Pereira da Silva (Solidariede-SP). Ele gastou R$ 214 mil com passagens, uma delas no valor de R$ 3,5 mil, no trecho Congonhas/Brasília/Congonha. Boa parte das despesas foi feita com passagens para assessores do seu gabinete. Apenas em fevereiro, de um total de R$ 37,6 mil, R$ 24 mil foram gastos com deslocamentos de assessores.

Os gastos com aluguel de jatinhos foram reduzidos em 2019, mas o deputado Sidney Leite (PSD-AM) esbanjou. Ele torrou R$ 162 mil em sete viagens para 11 municípios do estado. A mais cara foi para o trecho Manaus/Humaitá/Matupi/Manaus, no valor de R$ 52 mil. O roteiro Manaus/Corauari/Envira/Eirunepé saiu por R$ 39 mil.

Deputada justifica posts de site

Questionada pelo blog sobre as postagens de cunho pessoal em seu site, a deputada Jaqueline Carros afirmou inicialmente: “Eu estou deputada, mas sou uma cidadã como qualquer outra.  Uso minhas redes sociais como mãe, esposa e advogada, não vejo porque não seria adequado continuar usando minhas redes como sempre usei, já que eu mesma faço esse tipo de postagem. Os serviços pagos com o dinheiro público, como você cita, são os de divulgação da atividade parlamentar, as coisas não se misturam”.

O blog reafirmou que a nota sobre o desaparecimento da gata da sua filha e as declarações de amor ao marido foram veiculadas no Facebook e também no seu site de deputada federal. Nota fiscal enviada à deputada mostra que o desenvolvimento e a instalação do novo layout do site de deputada foram feitos pela empresa AZ Soluções Web, ao custo de R$ 6,5 mil.

Jaqueline respondeu: “Reforço mais uma vez, as publicações nas redes sociais de caráter pessoal são feitas por mim, sem uso de recurso público. Meu site foi criado antes de eu ser parlamentar. Essa nota que você cita refere-se ao pagamento da implantação do novo layout, a “roupa” do site, e não a criação da plataforma. Como me tornei deputada, precisei incluir isso na página inicial”.

Ela acrescentou que o site “foi desenvolvido com a utilização de uma ferramenta de vinculação de publicações das redes sociais, exatamente como tantos outros do mercado. Não há nenhuma publicação criada em meu site e para o meu site de cunho pessoal. Todas as publicações criadas para o site são sobre minhas atividades parlamentares”.

A deputada também foi questionada se as suas despesas não seriam muito elevadas, considerando o déficit fiscal registrado no Orçamento da União. Ela respondeu que “a transparência dos atos é fundamental para um bom mandato e prestar contas do trabalho aos eleitores é obrigação de quem foi eleito”. Mas acrescentou: “Este foi meu primeiro ano de mandato, e planejei ações para que os cidadãos do meu estado ficassem conhecedores do nosso trabalho e de que seus votos não foram em vão. Para os próximos anos, teremos ajustes e a verba será utilizada de outra maneira”.

Fonte: Câmara dos Deputados

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