O presidente Jair Bolsonaro adota um discurso dúbio sobre o corte de privilégios na aposentadoria das Forças Armadas. Ao mesmo tempo em que defende um aumento no tempo de serviço e na alíquota de contribuição dos militares, Bolsonaro fala também em restabelecer “todos os direitos dos militares” que foram retirados, segundo ele, pela medida provisória 2.115, editada em 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso. Um desses direito era a promoção automática no ingresso para a reserva – medida que resultou na explosão do número de generais aposentados nas Forças Armadas.
O Exército, por exemplo, conta hoje com 148 generais na ativa e outros 5,2 mil na reserva (aposentados), como mostrou reportagem publicada pelo blog em 17 de dezembro. Questionado sobre o motivo do acúmulo de generais na inatividade, o Comando do Exército citou a legislação extinta em 2001: “Cabe destacar que esses números incluem os coronéis que foram transferidos para a reserva remunerada antes da promulgação da MP 2.215/2001, bem como as pensionistas desses coronéis falecidos”. Na prática, coronéis foram para a inatividade com remuneração de general de Brigada.
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Bolsonaro quer que os militares deem a sua parcela de contribuição na reforma das regras de aposentadorias, mas não diz que o projeto de lei a ser entregue no Congresso não resolverá o bilionário déficit na previdência das Forças Armadas.
Em live transmitida pelas redes sociais direto dos Estados Unidos, na noite de segunda-feira (18), o presidente falou sobre a reforma dos militares. “Deu problema na proposta. Mas pode ter certeza, essa proposta vai ser justa. Conversei com o comandante da Defesa longamente ontem. Vai aumentar em cinco anos o tempo de permanência do militar. Nós jamais pensamos em privilegiar um lado em detrimento do outro”.
“Foram retirados todos os direitos”
Em seguida, passou a falar de supostas perdas dos militares. “As Forças Armadas têm que ser preservadas. Nós passamos ao longo de 30 anos, desde o governo do FHC, com as Forças Armadas sendo maltratadas, na questão de material, na questão salarial. Nós temos uma MP, originalmente 2.131, desde 29 de dezembro de 2000, agora completa 19 anos, sem ser votada. Nós vamos resolver essa questão agora”. Diferentemente das regras de hoje, medidas provisórias editadas naquela época não caducavam após 120 dias sem votação no Congresso.
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Segundo Bolsonaro, com a edição dessa MP “foram retirados todos os direitos dos militares. Inclusive, nem na Justiça poderíamos entrar, por quê? Porque o juiz dizia, olha, é uma medida provisória, não pode decidir em cima dela. Agora, eu costumo dizer, quando reclamam dos militares: tem tanto privilégio que eu não conheço filho de deputado, de senador, que tenha ingressado na Academia Militar das Agulhas Negras”.
Tanto a MP 2.215/2001 quanto a MP 2.131/2000 asseguram o direito à remuneração correspondente ao grau hierárquico superior ao militar que tenha completado os requisitos para se transferir para a inatividade até 29 de dezembro de 2000.
Déficit mantido
A proposta de aumento da contribuição de 7,5% da renda dos militares para 10,5% está longe de eliminar o déficit previdenciário das Forças Armadas. Primeiro, porque essa contribuição é destinada a cobrir apenas as pensões dos seus dependentes. Segundo, porque ela paga apenas 14% dessa despesa. Com o percentual de 10,5%, cobrirá cerca de 20% dos gastos. Os cerca de 200 mil pensionistas – mulheres, filhos menores, filhas solteiras, entre outros – custam R$ 21 bilhões por ano.
Mas os militares continuarão sem pagar contribuição para a própria aposentadoria. Essa despesa fica em R$ 23,8 bilhões por ano. Os militares costumam dizer que não se aposentam, entram para a reserva a ficam à disposição para uma eventual convocação. Mas o Brasil não participa de uma guerra há mais de 70 anos.
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A Marinha afirma que “a remuneração do militar inativo é um encargo financeiro da União, não havendo, portanto, necessidade de contribuições para tal fim. O militar das Forças Armadas não se aposenta, ele ingressa na reserva mantendo o vínculo com a profissão militar, podendo ser mobilizado a qualquer momento”.
O Exército diz que os militares “não têm um regime previdenciário estatuído. As peculiaridades da carreira sempre levaram os militares a terem um tratamento diferenciado, o que não significa privilégio. Os militares não usufruem de uma série de direitos de um trabalhador em geral ou de um servidor público, como horas-extras, adicional noturno, adicional de periculosidade e FGTS”.
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