A reforma da Previdência acaba com o plano especial de aposentadoria do Congresso Nacional para os próximos parlamentares, mas você, contribuinte, vai continuar pagando 85% do valor das pensões já concedidas. Elas custam R$ 136 milhões por ano aos cofres públicos, enquanto que as contribuições previdenciárias dos parlamentares e pensionistas somam apenas R$ 20 milhões por ano – o equivalente a 15% das despesas com aposentadorias e pensões.
O plano de previdência do Congresso é deficitário, mas as aposentadorias dos deputados federais são generosas (veja lista com nomes e valores no final deste post). Vinte e dois deputados recebem mais de R$ 30 mil, enquanto 91 têm pensão entre R$ 20 mil e R$ 30 mil. A média fica em R$ 14,3 mil – 146% acima do teto do INSS. A maior parte do déficit vem do Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC), que foi extinto em 1999, mas deixou 444 aposentados – 13 deles com o benefício suspenso porque estão exercendo mandato na Câmara ou no Senado. O custo anual dessas pensões soma R$ 74 milhões.
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O IPC foi extinto porque estava praticamente falido. Não teria como pagar as pensões. O instituto precisaria de R$ 522 milhões para honrar os benefícios já concedidos, mas contava com reservas de apenas R$ 138 milhões. E ainda viriam novas aposentadorias, que consumiriam mais R$ 135 milhões. Mas as despesas não pararam por aí. Os deputados e senadores aprovaram uma lei que transferiu para União a responsabilidade de pagar as pensões do IPC – uma entidade de direito privado. E criaram o Plano de Seguridade Social dos Congressistas (PSSC) para atender aos novos e antigos deputados.
O PSSC tem hoje 79 deputados aposentados, com pensão média de R$ 17 mil, sendo três deles com o benefício suspenso por exercício de novos mandatos. Mais uma despesa de R$ 15,6 milhões por ano. Mas ainda tem os 487 pensionistas dos dois planos, com um gasto anual de R$ 46 milhões. O Orçamento da Câmara reserva R$ 139 milhões para pagar aposentarias e pensões do “extinto IPC” neste ano. Sem contar aqueles que voltaram a exercer mandato, são 507 deputados de pijama.
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Os deputados e senadores que estão com o benefício suspenso terão outra regalia que não é oferecida aos segurados do INSS. Quando encerrarem os novos mandatos, as pensões serão recalculadas – para cima, claro. São as chamadas reaposentadorias. O procedimento está previsto nas leis que criaram o IPC e o PSSC.
Condições generosas
A lei que criou o IPC (4.284/1963) tinha regras bastante generosas. Os parlamentares podiam se aposentar aos 50 anos, com um mínimo de oito anos de mandato. Quem não se reelegesse poderia continuar contribuindo até completar os oito anos. Eles também podiam pagar de uma vez só as cotas correspondentes a esse prazo para assegurar a aposentadoria. Podiam contribuir para o instituto inclusive os parlamentares da legislatura anterior.
Com tantas facilidades, quatro anos após a criação do instituto já havia cinco aposentados. O deputado Paulo de Tarso (PDC-SP) aposentou-se apenas cinco meses após a criação do IPC, em abril de 1964. Naquele mesmo período, ele teve o seu mandato cassado pela ditadura militar. Recebe hoje pensão de R$ 8,76 mil. Retornou à vida pública em 1983, como secretário de Educação de São Paulo. Foi conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de 1985 a 1991, assegurando nova aposentadoria no valor de R$ 35,4 mil.
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O mandato mais breve foi o de Djacyr Cavalcanti (UDN-PB) – apenas 19 dias, de 28 de agosto a 16 de setembro de 1964, como suplente em exercício. Pagou as contribuições que faltavam até completar oito anos de mandato, como previa a lei, e aposentou-se em 22 de novembro de 1967. Recebe pensão de R$ 8,7 mil – 50% acima do teto do INSS. Considerando o valor atual, após 51 anos, já recebeu o equivalente a R$ 5,4 milhões.
As regras do PSSC aproximam-se mais das normas do Regime Geral da Previdência Social (RGPS). São necessários 35 anos de contribuição e 60 anos de idade. Mas os parlamentares podem incluir mandatos anteriores e contribuições ao INSS para completar o tempo mínimo exigido para a aposentadoria. Pagando as contribuições pelos mandatos exercidos, ampliam o valor da pensão.
Manuel Rosa Neca (PR-RJ) aposentou-se em 2015 após mandato de dois anos e um mês na Câmara. Juntou mais sete anos de mandatos de vereador e de prefeito de Nilópolis (RJ) e assegurou uma aposentadoria de R$ 8,6 mil. Para completar os 35 anos de contribuição, contabilizou 26 anos de recolhimentos ao INSS.
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Com a reforma da Previdência, os parlamentares que estiverem no mandato na promulgação da PEC poderão manter o atual plano (PSSC). Para completar o tempo de 35 anos de contribuição, terão que pagar pedágio de 30% do tempo que faltar. Também terão que completar 65 anos de idade. Deputados e senadores que tomarem posse após a promulgação da PEC da reforma estarão sujeitos às regras do RGPS.
Acúmulo de pensões
Além das aposentadorias bancadas com dinheiro público, muitos dos aposentados do IPC recebem pensões de outros órgãos públicos, ou mesmo da Câmara. Isso ocorre porque o instituto foi considerado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pelo Acórdão 3.632/2013, como uma entidade de direito privado, em 2013. Assim, as pensões do IPC não entram no cálculo do abate-teto constitucional.
Por coincidência, o presidente do TCU, José Múcio Monteiro, recebe R$ 26,1 mil pelo IPC mais R$ 38,5 mil pelo tribunal, totalizando R$ 64,7 mil. O ex-deputado e ex-ministro do TCU Humberto Souto (PPS-MG) tem direito a R$ 27,8 mil pelo IPC mais a aposentadoria do tribunal – são R$ 65 mil na conta todo mês. O ex-deputado e ex-ministro do TCU José Jorge (DEM-PE) acumula pensões no valor R$ 49,4 mil. Atual ministro, Augusto Nardes soma a pensão de ex-deputado com o salário do tribunal, alcançando renda de R$ 52 mil.
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Com apenas três mandatos na Câmara e sete anos como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-ministro da Justiça Célio Borja acumula R$ 52,4 mil em pensões. São R$ 13 mil pelo IPC mais R$ 39,3 mil pelo Supremo.
Pensões duplas na Câmara
O ex-deputado Paulino Cícero de Vasconcelos, que exerceu cinco mandatos pela Arena e PDS, tem aposentadoria de R$ 26,7 mil, mas também recebe pensão civil paga pela Câmara no valor de R$ 20,9 mil – um total de R$ 47,7 mil. A pensão foi deixada por um parente que era técnico legislativo da Câmara.
Deputado federal por três mandatos, Freitas Diniz (MDB-MA) também acumula pensão parlamentar com aposentadoria da Câmara. São apenas R$ 13 mil pelo IPC, mais R$ 49,5 mil como analista legislativo aposentado, com redutor constitucional de R$ 10,2 mil. Recebe um total de R$ 52,4 mil.
Lúcia Braga começou a trabalhar como servidora da Câmara em 1979. Nas décadas seguintes, intercalou a carreira com a presidência da Fundação Social do Trabalho, na Paraíba, e três mandatos de deputada federal. Recebe hoje R$ 12,6 mil do IPC mais R$ 52 mil como servidora aposentada da Câmara, com abate-teto de R$ 12,7 mil no salário de servidora. A remuneração total fica em R$ 52 mil.
Até três pensões
O ex-deputado Henrique Córdova (Arena-SC) recebe pensão de R$ 8,7 mil da Câmara, mas também conta com pensão de R$ 30,4 mil por ter exercido por 10 meses o governo de Santa Catarina na década de 1980. Recebe ainda pensão de R$ 11,7 mil do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina. Um total de R$ 51 mil. Emílio Hoffmann acumula R$ 12 mil do IPC com a aposentadoria de ex-governador do Paraná, num total de R$ 42,5 mil.
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O ex-deputado Ariosto Holanda (PDT-CE) soma a pensão de R$ 21,3 mil da Câmara com a pensão de anistiado político, no valor de R$ 33,7 mil. Foi demitido da Petrobras na década de 1970, por causa da atuação como líder estudantil anos antes. Tem renda de R$ 55 mil.
A ex-deputada Rita Camata (PMDB), a “musa da Constituinte”, exerceu cinco mandatos na Câmara e conta com aposentadoria de R$ 20,9 mil. A partir do início deste ano, recebe também pensão no valor de R$ 16,9 mil deixada pelo marido, o ex-senador Gerson Camata. O total (R$ 37,7 mil) não ultrapassa o teto constitucional, mas supera o salário dos deputados que exercem mandatos – R$ 33,7 mil.
Dois ex-deputados acumulam pensões da Câmara com salários no Executivo. Marcos Montes (PSD-MG) tem aposentadoria de R$ 15,4 mil pelo PSSC e salário de R$ 17,3 mil como secretário-executivo do Ministério da Agricultura. Ele não ultrapassa o teto, nem poderia porque o PSSC é considerado uma entidade de direito público. O ex-deputado Paulo Bauer (PSDB-SC) recebe R$ 17 mil como assessor da Presidência da República e R$ 28 mil da Câmara. São R$ 45,4 mil, mas como era filiado ao IPC pode superar o teto constitucional.
Processados, condenados, presos
O IPC tem uma lista ampla de ex-deputados que foram processados por corrupção, alguns condenados e presos. O ex-deputado e ex-ministro da Casa Civil no governo Lula, José Dirceu (PT), acaba de voltar à prisão. Foi condenado a 30 anos de regime fechado por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Ele recebe pensão de R$ 9,6 mil do PSSC. Para completar o tempo mínimo de contribuição, ele contou o período de anistia, de outubro de 1968 a dezembro de 1979, mais períodos de contribuição ao INSS.
Ex-presidente da Câmara e ex-ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves (MDB-RN) exerceu 11 mandatos de deputado federal. Recebe hoje pensão de R$ 33,7 mil – máximo possível. Ele foi preso preventivamente em junho de 2017, acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro na Operação Manus, que apurou fraude de R$ 77 milhões na construção da Arena das Dunas, em Natal. Aguarda julgamento.
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O ex-deputado e ex-ministro Geddel Vieira Lima (MDB-BA) responde a processo sob acusação de ocultar R$ 51 milhões em malas encontradas pela Polícia Federal num apartamento em Salvador. Exerceu cinco mandatos como deputado e recebe R$ 20,3 mil da previdência dos congressistas.
Os ex-deputados Roberto Jefferson (PTB-RJ), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e José Genoino (PT-SP) foram condenados por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do mensalão do PT. Os dois primeiros tiveram a pena perdoada em 2016. Quando presos, não deixaram de receber pensão do IPC.
Costa Neto recebe R$ 21,3 mil do IPC. Jefferson tem direito a R$ 23,3 mil. Genoíno foi presidente do PT naquele período. Ele foi condenado a quatro anos e oito meses por corrupção, mas teve a pena extinta em 2015. Com sete mandatos como deputado federal, recebe pensão de R$ 25,2 mil.
A Câmara afirma que, assim como acontece no Regime Geral da Previdência e também no regime dos servidores públicos, não existe previsão legal de perda do benefício em caso de condenação em ação civil ou criminal.
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