Despesas de deputados com combustível, aluguel de carros e aviões, passagens aéreas, divulgação, consultorias, hospedagem, alimentação, táxi, pedágio, enfim, tudo, já consumiram R$ 1,5 bilhão dos cofres públicos desde 2009, quando foi criada a “cota para o exercício da atividade parlamentar” – mais conhecida como “verba de gabinete”. Em oito anos, os deputados gastaram, em média, R$ 515 mil por dia.
O R$ 1,5 bilhão é mesmo valor que foi empenhado (reservado) este ano no programa Minha Casa, Minha Vida para atendimento a famílias com renda mensal de até R$ 1,6 mil. Só nesta legislatura, os gastos dos deputados somaram R$ 522 milhões. O valor mensal da cota é definido de acordo com o estado de origem do parlamentar – quanto mais longe de Brasília, maior é a verba.
As maiores despesas no atual mandato foram com divulgação parlamentar e passagens aéreas: R$ 123 milhões e R$ 122 milhões, respectivamente (veja infográfico no fim deste post). Desde 2009, os dois itens superam a cada dos R$ 300 milhões. As passagens são necessárias porque permitem o deslocamento dos parlamentares dos seus estados até Brasília. Para a divulgação das suas atividades, eles contratam produtoras de vídeos, agências de publicidade, pagam cotas mensais a veículos de comunicação e blogueiros, imprimem jornais, cartilhas.
Apenas uma produtora de vídeos, a Incine Vídeo Web, já faturou R$ 2,3 milhões nesta legislatura, em contratos com 24 deputados. A sede da empresa, no Setor Comercial Sul de Brasília, ocupa duas salas com cerca de 30 metros quadrados cada (veja vídeo abaixo). Ali trabalham editores de vídeos, videografistas, editores, produtores. Cinco equipes de TV estão permanentemente no Congresso. No total, são 32 profissionais. Eles acompanham os parlamentares nas comissões, plenário e até em audiências nos ministérios. A empresa também atende emissoras de TV regionais e associações de classe. A empresa Nacom, do mesmo ramo, faturou R$ 1,2 milhão desde 2015.
O deputado que mais gastou com a divulgação do seu mandato foi o líder do PRB, Cleber Verde (MA), um total de R$ 770 mil. A maior parte – R$ 289 mil – foi investida no jornal Folha do Trabalho, distribuída no seu estado com matérias de vários parlamentares (veja foto abaixo). Além desse produto, a empresa oferece um folheto informativo individual para os parlamentares. De 2009 até hoje, a divulgação das atividades do deputado já custou R$ 1,85 milhão aos cofres públicos.
O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) gastou R$ 1,58 milhão no mesmo período, mas com outro foco. Todo o dinheiro foi gasto com duas gráficas: a Balcolor (R$ 940 mil) e a Três Pontas (R$ 612 mil). “Eu imprimo cartilhas com o Estatuto do Idoso. É a minha área de atuação”, explica o deputado. Ele atua junto a aposentados, que preferem o material impresso a mensagens pela internet.
Viagens por terra, água e ar
Nas despesas com passagens aéreas, a liderança neste mandato é de Paulo Pereira da Silva (SD-SP), com R$ 688 mil, e desde 2009 é de Wladimir Costa (SD-PA) – o deputado que tatuou o nome do presidente Michel Temer no braço –, com R$ 1,5 milhão. Entre as empresas aéreas, a TAM lidera no faturamento geral, com R$ 139 milhões – 9% do total da verba de gabinete –, seguida pela Gol, com R$ 102 milhões.
O deslocamento dos deputados nos estados acontece por terra, água e ar. O aluguel de carros consumiu R$ 69 milhões na atual legislatura. Mais R$ 43,8 milhões foram gastos com combustível. Flaviano Melo (PMDB-AC) foi quem mais gastou com combustível: R$ 171 mil. Givaldo Carimbão lidera o fretamento de veículos, com R$ 316 mil.
O aluguel de aviões gerou gastos de mais R$ 7,3 milhões neste mandato. Quem mais gastou nesse item foi Átila Lins (PSD-AM), com R$ 701 mil. Considerando despesas feitas a partir de 2009, quem mais faturou foram as empresas Tope Line (R$ 951 mil) e a Ceará Táxi Aéreo (R$ 912 mil).
O fretamento de embarcações custou apenas R$ 107 mil na atual legislatura e R$ 455 mil desde 2009. O maior usuário foi o Delegado Éder Mauro (PSD-PA), com R$ 66 mil. Gastou R$ 44 mil com sete locações da lancha Focker 280 de Jerre Adriano.
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Os deputados não deixam escapar nada. Tiveram reembolsos de R$ 2,88 milhões com despesas de táxis, pedágio e estacionamento. Quem mais faturou – R$ 691 mil – foi o Centro de Gestão de Meios de Pagamentos, que gerencia pagamentos a concessionárias de rodovias e estacionamentos em nove estados. O deputado Zeca Dirceu (PT-PR) gastou R$ 62 mil com a Sipetaxi DF – empresa que recebeu um total de R$ 631 mil de deputados entre 2009 e 2017.
Imóveis de vereadores
A manutenção de escritórios de apoio nos estados é outra despesa pesada. Foram R$ 57 milhões nesta legislatura e R$ 156 milhões desde 2009. O campeão de gastos é Vinícius Gurgel (PR-AP), com R$ 509 mil. Na terceira posição aparece outro deputado do Amapá, André Abdon (PP-AP), com R$ 455 mil. Uma coincidência entre os dois: eles alugaram imóveis de candidatos a vereador e prefeito nas eleições de 2016. Gurgel gastou R$ 439 mil com a locação de casas de aliados políticos, enquanto Abdon teve uma despesa de R$ 146 mil.
Edenilton Pereira aluga uma casa para Gurgel na Avenida Castelo Branco, nº 525, no centro da cidade de Ferreira Gomes (AP). Como as locações começaram em 2011, ele já recebeu R$ 144 mil do deputado. O aluguel está em R$ 3 mil. No ano passado, Edenilton, registrado como “Giro” no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi candidato a prefeito pelo PR no município, mas acabou renunciando.
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Rômulo Nascimento foi candidato a prefeito em Porto Grande (AP), também pelo PR, e conseguiu 2.320 votos, mas ficou apenas na terceira colocação. Ele aluga um imóvel para Gurgel desde março de 2013 no valor de R$ 5 mil – o suficiente para alugar um apartamento de três quartos no Plano Piloto em Brasília. O imóvel de Rômulo fica na Rodovia Perimetral Norte, nº 1.942, salas A, B e C, em Porto Grande. Somando os aluguéis de 2011 e 2012, de menor valor, o total pago pelo deputado pelas locações chega a R$ 275 mil.
Maraína Martins, eleita vereadora pelo PR em Macapá (AP), com 4.707 votos, recebeu R$ 20 mil de Gurgel pelo aluguel de uma casa em 2015 no valor de R$ 2 mil.
No período eleitoral
Rômulo Nascimento também alugou uma sala (H) para André Abdon, por R$ 2 mil, entre fevereiro de 2015 e outubro de 2016 – justamente o mês da eleição – no mesmo endereço do imóvel locado para Gurgel. Recebeu um total de R$ 42 mil.
O deputado Abdon também alugou imóvel de Rarison Santiago (PRP), vereador mais votado em Santana (AP), pagando um total de R$ 60 mil, no mesmo período, até outubro de 2016. Por coincidência, o deputado alugou uma casa de Alzivan Alves (PRP), eleito vereador em Ferreira Gomes, com término do contrato no mês da eleição. Foram cinco meses de locação num total de R$ 15,5 mil.
A candidata a vereadora Irmã Joelma (PP) alugou imóvel para o deputado em Laranjal do Jari (AP), entre fevereiro de 2015 e junho de 2016. Fez apenas 79 votos e não foi eleita. Mas é grata a Abdon, como demonstra constantemente nas redes sociais.
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Questionada sobre o aluguel de imóveis de vereadores, a assessoria de Abdon limitou-se a responder que “esses aluguéis já tiveram seus contratos encerrados ano passado. Nenhum está mais em vigência”. Gurgel não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem.
OPS
Os dados sobre a “Cota para o exercício da atividade parlamentar” estão disponíveis na página da Câmara na Internet. Mas o portal não permite fazer totalizações. Os dados desta reportagem foram obtidos com a utilização de filtros e buscas disponibilizados pela ONG Operação Política Supervisionada (OPS), que fiscaliza os gastos realizados com as verbas de gabinete da Câmara e do Senado.
A OPS conta com a ajuda de colaboradores, espalhados pelo Brasil, para o levantamento de informações necessárias para a conclusão de fiscalizações, como por exemplo, o envio de fotos de endereços suspeitos em diversas cidades do país. O trabalho de fiscalização é coordenado por seu fundador, Lúcio Batista, o Lúcio Big.
Segundo relata Big, já foram economizados mais de R$ 5,5 milhões do dinheiro público graças a estas fiscalizações e às exigências feitas diretamente aos parlamentares para que devolvam o dinheiro público indevidamente utilizado.
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