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Dois projetos em andamento no Senado propõem o fim de mordomias pagas com dinheiro público a ex-presidentes da República condenados por crime de responsabilidade, crime comum ou que esteja preso. Na Câmara, 14 projetos tratam do assunto. Pelo menos seis deles propõem a revogação completa da Lei 7.774/1986, que assegura aos ex-presidentes seguranças, motoristas e assessores, além de diárias e passagens – ao custo total de R$ 6 milhões por ano. Uma das propostas, apresentada pelos então deputado Jair Bolsonaro, foi escolhida pela relatora como a mais adequada para continuar tramitando.
O projeto com tramitação mais avançada no Senado (PL 343/2016), de autoria do senador Alvaro Dias (Podemos-PR), está com relatório pronto para entrar na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desde junho do ano passado. O relator da matéria, Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), lamenta a demora: “está há seis meses na fila. Estou esperando que a senadora Simone Tebet [MDB-MS] coloque na pauta para votação, mas ela não põe”. Ele se refere à presidente da CCJ.
Questionado sobre o motivo de o projeto não entrar em votação, ele comenta: “não sei, pergunta para a Simote Tebet. Alguém está com vontade de segurar por alguma razão que desconheço”. O blog fez a pergunta à presidente da comissão, mas não houve resposta.
Atualmente, seis ex-presidentes usufruem das mordomias – José Sarney, Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Michel Temer. Segundo a Presidência da República informou ao blog, as despesas dos seis chegaram a R$ 5,9 milhões no ano passado. A mais gastadora foi Dilma, com R$ 1,5 milhão, sendo R$ 544 mil com viagens por 14 países. Só a viagem de férias para Nova York, com dois assessores, durante 37 dias, custou R$ 164 mil.
“Não pode um condenado manter esse privilégio”, diz relator
Pelo projeto de Alvaro Dias, apresentado em setembro de 2016, os ex-presidentes mantêm o direito a utilizar quatro servidores para segurança e apoio pessoal, mais dois veículos oficiais com motoristas, com despesas custeadas pela Presidência da República, exceto no caso de perda de mandato por condenação do Senado Federal em processo por crime de responsabilidade, ou pelo Supremo Tribunal Federal, por crime comum. Esse dispositivo corta imediatamente as mordomias para Dilma, e pode alcançar Lula, caso a condenação no caso do tríplex no Guarujá seja confirmada no STF.
Oriovisto afirma que esses direitos existem em vários países, mas faz essa ressalva: “O que não pode é esse privilégio continuar para presidente que foi deposto, condenado pelo Senado ou por crime comum. É o caso do Lula, por exemplo, que perderia o direito. A Dilma e Collor sofreram impeachment, foram condenados por crime de responsabilidade”.
Mais restrições às mordomias de ex-presidentes
Outro projeto com objetivo semelhante (PL 248/2018), de autoria do senador Lasier Martins (Podemos-RS), aguarda a indicação de um relator na CCJ desde junho de 2018. Ele foi apresentado e praticamente não andou. O projeto também barra as mordomias para os ex-presidentes condenados ou presos e impõe ainda mais restrições.
Lasier propõe que o ex-presidente mantenha os direitos pelo prazo máximo de 20 anos e tenha o seu quadro de assessores reduzido para apenas dois servidores, para apoio pessoal, mais um veículo oficial com dois motoristas.
Pelo projeto, os direitos não se aplicam a ex-presidente que tenha sido condenado por improbidade administrativa, tenha perdido o cargo por condenação decorrente da prática de crime comum ou de responsabilidade, ou tenha sido condenado a pena que implique inelegibilidade ou prisão.
Esses dispositivos são dirigidos a Dilma e Lula. Como mostrou reportagem publicada no blog dia 9 de janeiro, as despesas de Lula com assessores durante os 19 meses em que ele esteve preso, em Curitiba, chegaram a R$ 929 mil. Ele mantinha seguranças e motorista, embora estivesse muito bem protegido e sem condições de se locomover.
A assessoria de Lasier entende que Collor não seria atingido porque ele renunciou ao mandato de presidente e depois foi inocentado pelo Supremo Tribunal Federal. Mas outro dispositivo do projeto, que trata de ex-presidente que esteja no exercício de mandato eletivo federal, excluiria Collor dessas mordomias. O ex-presidente é atualmente senador da República por Alagoas.
Além dos R$ 960 mil que gastou como ex-presidente no ano passado, Collor também usou R$ 256 mil da cota para o exercício do mandato no Senado, tudo em divulgação e consultoria. Ainda conta com 63 assessores no seu gabinete de senador, alguns deles com salário acima de R$ 30 mil.
Câmara é mais radical com ex-presidentes
Os deputados são mais radicais do que os senadores, como de costume. Pelo menos seis projetos de deputados simplesmente revogam a Lei 7.774. Foram todos apensados (juntados) ao PL 6.280/2016, de autoria do Major Rocha (PSDB-AC). Rocha argumenta que, “em um país com alto índice de desemprego e com grave crise econômica, que detém uma das mais altas cargas tributárias do mundo, não é razoável que a população arque com as despesas para manutenção de funcionários à disposição de ex-presidentes”.
Ele acrescenta que “a lei ganha contornos absurdos ao permitir que ex-presidentes julgados e condenados por crime de responsabilidade, venham a usufruir de tal benefício cassados em processos de impeachment”.
Mas o grupo de projetos mais radicais foi apensado ao PL 6.272/2016, de autoria do deputado Laerte Bessa (PR-DF). Ele propõe que, no caso de perda do mandato em decorrência de processo de impeachment, o ex-presidente da República não terá direito aos benefícios previstos em lei, independentemente de manifestação do Senado Federal. Aplica-se o mesmo no caso de renúncia ao mandato.
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Reviravolta
Em maio de 2019, a deputada Caroline de Toni (PSL-SC) foi nomeada relatora do projeto 6.272. Ela apresentou parecer no dia 13 de agosto daquele ano. Ela analisou 14 projetos apensados e concluiu que o mais adequado é o PL nº 9.895/2018, de autoria dos ex-deputados federais Delegado Francischini (SD-PR) e Jair Bolsonaro (PSL-RJ), que propõe a revogação da Lei 7.474/86.
A relatora afirmou que “a revogação dá consequência ao princípio da moralidade. Extingue privilégio incabível num regime republicano onde se assegura a igualdade entre todos os cidadãos. Destacamos, ainda, que dois dos atuais ex-presidentes foram destituídos de seus mandatos, e ainda assim dispõem de servidores e carros oficiais”.
O que diz o projeto de Bolsonaro
Na justificativa do projeto 9.895/2018, Francischini e Bolsonaro destacaram que dois ex-presidentes “tiveram seus mandatos cassados e ainda assim dispõem dessas regalias. Em um momento de crise financeira, quando se exige esforço da sociedade e do governo para reequilibrar as contas públicas, não é cabível a existência de uma legislação ultrapassada, a qual inclusive tem sido copiada por governos estaduais e municipais”. Depois de eleito presidente da República, Bolsonaro não tratou mais do assunto publicamente.
O deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP), autor do projeto 4.042/2019, afirma que, “no momento da sanção desta lei [7.474], o Brasil acabava de se redemocratizar e havia um contexto totalmente diferente. Hoje, o que se constata é um gasto vultoso com diárias e passagens e manutenção de carros injustificadamente”. O deputado Cabo Sabino (PR-CE) propôs a redução do número de assessores para apenas dois. “Acreditamos que os benefícios concedidos aos ex-presidentes são demasiadamente fora da realidade da economia brasileira, além de desnecessários. Não existe justificativa plausível para um ex-presidente receber tantas regalias”, argumentou o deputado. .
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