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Lúcio Vaz

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O blog que fiscaliza o gasto público e vigia o poder em Brasília

Juízes

Fartura no Judiciário: renda de até R$ 573 mil no ano da pandemia

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Em ano de aperto financeiro para milhões de brasileiros, o Poder Judiciário manteve a sua fartura. A renda de pelo menos 40 juízes e desembargadores superou os R$ 300 mil num único pagamento, com o valor máximo próximo de R$ 600 mil para um desembargador aposentado da Justiça do Trabalho – cerca de mil auxílios emergenciais. Essas super remunerações resultam do pagamento de penduricalhos, principalmente retroativos e indenizações de férias.

Os chamados “direitos eventuais” e “indenizações” somaram R$ 3,5 bilhões em 2020. O total de despesas, incluindo o subsídio (salário base) e as vantagens pessoais chegou a R$ 11,2 bilhões. O maior gasto foi do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) – R$ 1,9 bilhão –, que conta com 360 desembargadores.

O desembargador aposentado Leonardo Meurer Brasil, do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul (TRT-4), recebeu R$ 573 mil em dezembro de 2020. Quase a totalidade – R$ 520 mil – resultou de pagamentos retroativos. No mesmo tribunal e no mesmo mês, as desembargadoras Ângela Almeida Chapper e Maria Rotta Tedesco tiveram renda total de R$ 459 mil e R$ 320 mil, respectivamente, sendo R$ 327 mil e R$ 273 mil de retroativos. Referem-se a diferenças na gratificação especial de localidade, pelo exercício em unidades de fronteira entre 1992 e 2005.

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Férias-prêmio e retroativos

No Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) o juiz Eduardo Valle Botti teve renda total de R$ 496 mil em fevereiro do ano passado. As verbas extras foram R$ 122 mil de pagamentos retroativos e R$ 337 mil de indenização de férias prêmio não gozadas e pagas posteriormente. Mais nove juízes e um desembargador receberam entre R$ 319 mil e R$ 426 mil em pagamentos únicos ao longo de 2020, sendo cerca de R$ 300 mil em média por contas das férias-prêmio.

A desembargadora aposentada Silvia Gonçalves Goraieg, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), recebeu um total de R$ 482 mil em dezembro do ano passado, sendo R$ 421 mil resultado de pagamento retroativo. O ex-presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT), desembargador Romão Cícero de Oliveira, que se aposentou em 2020, recebeu R$ 444 mil em outubro. Dessa renda total, R$ 402 mil eram relativos a indenização de férias não gozadas.

No Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), o desembargador Aluisio de Castro Mendes teve renda bruta de R$ 400 mil em dezembro, com R$ 338 mil de pagamento retroativo. Nesse tribunal, 16 magistrados tiveram renda total de R$ 300 mil a R$ 400 mil em dezembro, graças a pagamentos retroativos. O valor total dos retroativos pago naquele mês para 115 magistrados chegou a R$ 20,6 milhões. (veja quadro com maiores salários abaixo)

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Como surgem os supersalários

Os pagamentos retroativos resultam de direitos aprovados por lei, mas os pagamentos são feitos geralmente em parcelas, quando há “disponibilidade orçamentária”. Isso significa que há sobra de caixa. Em 2020, todos os tribunais pagaram um total de R$ 534 milhões em retroativos. Só no TJMG foram R$ 164 milhões. No TJSP, maior tribunal do país, mais R$ 100 milhões. No TJPR, R$ 75 milhões.

No TJSP, R$ 64 milhões de retroativos foram pagos durante a pandemia. Parte desses pagamentos referem-se à Parcela Autônoma de Equivalência (PAE), que estendeu aos magistrados o valor correspondente ao auxílio-moradia pagos aos parlamentares federais entre setembro de 1994 a dezembro de 1997. Esse benefício já rendeu R$ 3 bilhões aos magistrados brasileiros.

As indenizações de férias somaram R$ 420 milhões em 2020. Como os juízes têm direito a 60 dias de férias, grande parte recebe a “indenização” pelos dias “vendidos”. O TJSP pagou R$ 144 milhões em indenização de férias 2.374 magistrados. No TJPR, foram mais R$ 57 milhões.

Nem todos os tribunais informam detalhes sobre as indenizações de férias. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) gastou R$ 24,8 milhões com essas indenizações no ano passado, quase a totalidade durante a pandemia. Questionado pelo blog, o tribunal informou que foram pagas indenizações a 572 magistrados. E explicou que essas indenizações consistem na conversão em pecúnia [dinheiro] do saldo acumulado de férias que, em regra, é oriundo de anos anteriores. “É a venda do saldo de férias, em decorrência do seu não usufruto em época oportuna, por imperiosa necessidade de trabalho”, disse o tribunal.

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Os auxílios mais caros

Outro benefício que pesa no orçamento do Judiciário é a gratificação por exercício cumulativo de jurisdição (em mais de um órgão). Criada por lei em 2015, a gratificação corresponde a um terço do salário base do juiz e tem natureza remuneratória, ou seja, o seu acréscimo não pode resultar em valor superior ao teto remuneratório do serviço público – R$ 39,3 mil. Custou R$ 328 milhões no ano passado. O maior valor foi pago pelo Tribunal Regional da 1ª Região (TRF-1) – R$ 52 milhões.

O auxílio-alimentação somou mais R$ 183 milhões no ano passado. Em números absolutos, o maior valor foi pago pelo TJSP – R$ 28 milhões. Mas o maior auxílio-alimentação é pago pelo Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP): média de R$ 3 mil e valor máximo de R$ 3,5 mil – quase seis “auxílios emergenciais” do ano passado.

O auxílio-saúde custou mais R$ 145 milhões em 2020. O TJMG pagou o maior valor – R$ 48 milhões –, seguido pelo TJPR – R$ 28 milhões. Nos dois casos o valor do benefício corresponde a 10% do subsídio: R$ 3,5 mil no máximo. O TJPR afirmou que o auxílio, previsto em leis estaduais, é concedido a magistrados e servidores efetivos, ativos e inativos, e ocupantes de cargos em comissão que comprovarem a contratação particular de plano ou seguro saúde.

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Projeto para barrar penduricalhos

Em valores menores, há ainda outros penduricalhos, como auxílio-moradia (agora em casos excepcionais), abono permanência, substituições, bolsa de estudos, bolsa-livro, e diversas indenizações criadas por legislações estaduais.

Na lista dos 35 projetos prioritários apresentados pelo governo federal ao Congresso Nacional, no início de fevereiro, está o PL 6762/2016, que regulamenta a aplicação do teto remuneratório do servidor público, já aprovado no Senado. O relator no projeto na Câmara, deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR) afirma que o objetivo é ampliar as regras para barras os penduricalhos, gerando uma economia anual de R$ 2,3 bilhões nos três poderes.

Bueno acrescenta que Proposta de Emenda à Constituição 435/2018), de sua autoria, acaba com as férias de 60 dias para juízes e promotores. “Imagina só que juízes e promotores têm hoje direito a dois meses de férias e mais dois períodos de recesso", critica o parlamentar.

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Tribunal justifica indenizações de férias

O TJSC afirmou ao blog que o saldo acumulado de férias é resultado do crescimento das demandas judiciais e das restrições orçamentárias e legais de reforço do quadro funcional. “A partir do ano de 2015, com o surgimento da crise econômica que assolou o país, o PJSC reduziu a contratação de novos servidores e magistrados. O cenário austero seguiu, em 2018 e 2019, com o contingenciamento para evitar o crescimento de despesas correntes acima da inflação do período e a restrição de novas contratações prevista na Lei Complementar 173/2020.

“Com o quadro enxuto, muitos servidores e magistrados tiveram que abrir mão de seu direito ao gozo de férias para enfrentar as demandas sociais que eram apresentadas ao Poder Judiciário. Assim, esse saldo acumulado de férias foi convertido em pecúnia e pago aos trabalhadores do PJSC”, concluiu o tribunal.

O TRT-4 disse ao blog que os pagamentos retroativos pagos aos desembargadores Leonardo Meurer Brasil, Angela Almeida Chapper e Maria Rotta Tedesco foram autorizados pelo Conselho Nacional de Justiça, em pedido de providências, e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho, em procedimento de controle administrativo. “Os pagamentos foram realizados em parcela única, representando a quitação do passivo em relação a eles e a outros magistrados que também tiveram esse direito reconhecido”, concluiu a nota.

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