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Lúcio Vaz

Lúcio Vaz

O blog que fiscaliza o gasto público e vigia o poder em Brasília

Gastos com cartões corporativos de Bolsonaro somam R$ 10 milhões em 12 meses

Viagem de Bolsonaro para a entrega de títulos de propriedade rural no Pará. (Foto: Isac Nóbrega/PR)

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Os gastos do presidente Jair Bolsonaro com cartões corporativos somaram R$ 10 milhões nos últimos 12 meses – de agosto do ano passado a julho deste ano – período em que intensificou as viagens para inaugurações de obras, cerimônias militares e religiosas, apesar da epidemia que assola o país. Esse valor está um pouco acima da média anual da ex-presidente Dilma Rousseff e representa um acréscimo de 75% em relação ao ex-presidente Michel Temer. Mas teve um ano em que Dilma superou a gastança de Bolsonaro.

Esses 12 meses incluem o mês de agosto de 2020, quando Bolsonaro ainda estava recolhido em Brasília. Naquele mês, gastou apenas R$ 197 mil com os cartões do governo federal. O gasto em um ano deverá ficar perto de R$ 11 milhões no próximo mês. Mesmo assim, será difícil bater o recorde de Dilma em 2014, ano em que ela disputou a reeleição – R$ 12,6 milhões. Mas a comparação será mais precisa se Bolsonaro disputar a reeleição em 2020.

Bolsonaro viajou muito pouco no início da pandemia da Covid-19. De abril a julho, gastou em média R$ 200 mil com cartões corporativos. Mas a queda na sua popularidade, resultante dos seus primeiros erros na condução do combate à crise sanitária, levou o presidente de volta à estrada. Ele havia gasto R$ 8,2 milhões com cartões corporativos em 2019, primeiro ano do seu governo – muito acima de Temer, mas abaixo da média de Dilma. Todos os números da reportagem foram atualizados pela inflação.

Em agosto e setembro do ano passado, Bolsonaro torrou R$ 2,3 milhões com cartões corporativos. Questionada sobre o repentino e considerável aumento das despesas, a Secretaria-Geral da Presidência da República respondeu ao blog que o aumento do valor das faturas deveu-se “ao maior número de deslocamentos presidenciais no território nacional”.

As despesas de Bolsonaro começaram a ser pagas com cartões antes mesmo da sua posse como presidente. Isso ocorreu durante o governo de transição, quando o presidente eleito estava hospedado na Granja do Torto. Ele ofereceu banquetes aos amigos e aliados, fez churrascos e teve direito até a "chá de panela". Os dados vazaram porque a gastança ocorreu ainda no governo Temer. Estavam incluídos na prestação de contas do ex-presidente, agora sem sigilo.

Questionada sobre o repentino e considerável aumento das despesas, a Secretaria-Geral da Presidência da República respondeu ao blog que o aumento do valor das faturas deveu-se “ao maior número de deslocamentos presidenciais no território nacional”.

O presidente transformou eventos como inaugurações, visitas a obras, festividades militares e cultos evangélicos em palanque para propagar as suas teses de combate ao coronavírus. Defendeu incansavelmente o fim do isolamento social, receitou o uso da cloroquina e outros medicamentos sem eficácia comprovada contra o vírus e tentou ridicularizar o uso de vacinas. “Se você virar um jacaré, é problema seu”, avisou. Lembrou muitas vezes o apoio que teria das Forças Armadas e atacou o Poder Judiciário. Percorreu o país promovendo aglomerações, na maioria das vezes sem usar máscara de proteção. Incluindo todas as despesas, como diárias de assessores e seguranças, Bolsonaro já gastou R$ 43 milhões com viagens pelo país desde a sua posse.

Bolsonaro, sem máscara, na cerimônia de entrega de espadins a cadetes da FAB em Pirassununga (SP), em 9 de julho - José Dias/PR (Foto: JOSE DIAS)

Cartões em plena campanha eleitoral

A então presidente Dilma manteve as despesas com cartões corporativos acima de R$ 1 milhão durante oito meses, de março a outubro de 2014. Em agosto daquele ano, já durante a campanha eleitoral, seus gastos chegaram a R$ 1,44 milhão. Em outubro, mês do primeiro e segundo turno das eleições, a gastança bateu em R$ 1,8 milhão. Os pagamentos registrados no Portal da Transparência da Presidência da República são relativos a despesas feitas no mês anterior.

Dilma gastou R$ 8,8 milhões com cartões em 2013, R$ 12,6 milhões em 2014 e R$ 7,6 milhões em 2015, numa média anual de R$ 9,7 milhões. São os dados disponíveis no Portal da Transparência. Temer teve despesas bem mais modestas, até porque passou a maior parte do mandato envolvido em denúncias de irregularidades ocorridas em anos anteriores, com índices de popularidade sempre muito baixos. Isso reduziu o número de viagens. Ele gastou R$ 5,7 milhões em 2017 e R$ 6,1 milhões em 2018. Gastou muito dinheiro com jantares oferecidos no Palácio da Alvorada, num esforço para manter a sua base de apoio parlamentar.

Os cartões corporativos dos presidentes da República pagam despesas de viagens, como serviços em aeroportos, hospedagem e refeições de integrantes da comitiva presidencial e de seguranças; e as despesas pessoais do presidente e de seus familiares no Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente. Também são usados para comprar iguarias como barbatana de tubarão, cachaças envelhecidas, caviar, camarão GGG; e também para pagar passeios de lancha com familiares. Os gastos com os cartões em 2013 e 2014 mês a mês não estavam disponíveis até poucos meses atrás.

As despesas dos ex-presidentes quando ainda estavam no exercício do cargo foram mostradas pelo blog, com exclusividade, no final de 2019. Elas ficam em sigilo durante o mandato presidencial, mas são liberadas após o seu término. Bolsonaro prometeu algumas vezes que abriria o sigilo dos seus cartões corporativos, mas nunca cumpriu a promessa. Além do seu cartão pessoal, mais dois assessores pagam despesas do presidente e da família com os corporativos.

Havana e camarão GGG

O blog mostrou a gastança com cachaça Havana e outras bebidas sofisticadas com os corporativos na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A compra de cachaças Havana e Tonel teve continuidade no governo Dilma, como mostram cópias de notas fiscais obtidas pela reportagem. Em janeiro de 2012, por exemplo, foram compradas oito garradas de garrafas Tonel da Fazenda Boa Vista, em Araguari (MG), ao valor unitário de R$ 480. Uma despesa de R$ 3,8 mil, em valores atualizados. No mesmo mês, foram adquiridas mais seis garrafas de Havana a R$ 422 a unidade, na Casa do Vinho.

Em 10 de fevereiro, foi feita mais uma compra para o Palácio do Alvorada na Peixaria do Guará. Foram comprados 12 quilos de camarão GGG, ao preço de R$ 250 o quilo. Sem contar os 29 quilos de pescada amarela e 12 quilos de congrio rosa. Na Viande Boutique de Carnes, compraram 89 quilos de filé mignon, Picanha Uruguay e outras iguarias. Tudo pago pelo contribuinte.

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