Enquanto alguns parlamentares esbanjam dinheiro público com jantares e viagens internacionais luxuosas, aviões fretados e gabinetes com mais de 80 assessores, o senador José Reguffe (DF), atualmente sem partido, foi na direção contrária e abriu mão de todas as mordomias que vêm junto com o cargo. Ele se recusa a receber verbas indenizatórias, salários extras, auxílio-moradia, carro oficial, gasolina, viagens internacionais, correios, aposentadoria especial, plano de saúde e mantém apenas nove assessores no seu gabinete (veja alguns ofícios no final deste post). Em três anos no Senado, a economia chega a R$ 6 milhões.
Ao completar o mandato, em 2022, ele terá feito uma economia direta de R$ 16,7 milhões. Mas ainda há a economia indireta, como encargos sociais sobre o salário dos servidores não contratados, terço de férias e serviços de saúde. Como comparação, em 2017, o Senado gastou R$ 10 milhões com serviços médicos a senadores e ex-senadores. Se todos os senadores fizessem o mesmo que Reguffe, a economia em oito anos seria de R$ 1,3 bilhão.
“Abri mão do plano de saúde vitalício dos senadores. É para a vida inteira e sem limite de despesas. Fui o primeiro senador na história a abrir mão”, relata o senador. Ele também renunciou à aposentadoria especial de parlamentar, que oferece muitos privilégios. “Fiz a opção formal de continuar contribuindo para o INSS. Não terei outra aposentadoria”, complementa. Há hoje 60 senadores aposentados e mais 86 pensionistas, todos pagos com dinheiro público.
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Como abriu mão de carro oficial, ele chega ao Senado dirigindo o seu Fiat Mobi. Mas não pode estacionar nas vagas destinadas aos luxuosos carros oficiais. Estaciona nas “vagas privativas para senadores que conduzem veículos particulares”.
Mas por que Reguffe abriu mão das mordomias oferecidas pelo Senado? Ele mesmo explica: “Considero esse custo um desrespeito ao contribuinte brasileiro e um desperdício de dinheiro público. O custo do Parlamento no Brasil hoje é extremamente excessivo para o contribuinte. Não existe democracia sem um Poder Legislativo forte e atuante. Mas, para ser forte e atuante, não precisa ser gordo e inchado como ele é no Brasil”.
Decisão em caráter irrevogável
No primeiro dia de mandato, em fevereiro de 2015, ele enviou ofícios à Direção Geral do Senado abrindo mão de todos os benefícios oferecidos aos senadores, em caráter irrevogável. “Nem que eu queira eu posso voltar atrás”, acrescenta. Ele justifica o seu ato: “Não adianta eu apenas defender que o Congresso custe menos para o contribuinte brasileiro. Eu tenho que dar o exemplo e fazer a minha parte no meu gabinete”.
Reguffe destaca que as mordomias e regalias não são exclusividade do Senado: “Não é só o Legislativo. O Executivo e o Judiciário também estão repletos de mordomias, privilégios e regalias. Não dá para aceitar, por exemplo, que ministros viagem todo final de semana para os estados de origem em aviões da FAB, custeados pelo contribuinte. Há carros oficiais a rodo, há cargos comissionados a rodo. Isso para mim é absolutamente inaceitável”.
O senador inclui em suas críticas o Judiciário, “que tem uma série mordomias, de regalias, como o auxílio-moradia, que eu também não concordo. Acho que isso ajuda a prejudicar a imagem de um poder que é importante para a população brasileira e que vem cumprindo um importante papel. Os três poderes no Brasil tem regalias e privilégios que não deveriam ter”.
Nada de salários extras ou “ajuda de custo”
Nos ofícios, ele também abriu mão de salários extras que os senadores ainda recebem. “Não existem mais o 14º e o 15º, mas ainda persiste um salário extra cheio, como ajuda de custo, no início e no final do mandato”, explica. Ele liderou a mobilização pelo fim do 14º e 15º salários quando era deputado distrital.
A Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar cobre despesas com passagens aéreas, combustível, consultorias, trabalhos técnicos, hospedagem, alimentação, segurança, escritórios nos estados. Custou R$ 25,5 milhões aos cofres públicos no ano passado – uma média de R$ 315 mil por senador. Os dez maiores gastos tiveram uma média de R$ 459 mil, chegando até R$ 506 mil. Reguffe não gastou um único centavo dessa cota.
Cada senador tem direito a 55 assessores comissionados no gabinete. Mas esses cargos podem ser fracionados, chegando até 80 assessores. A folha de pagamento de alguns gabinetes supera os R$ 500 mil, incluindo os servidores efetivos. Reguffe conta com apenas nove comissionados e um efetivo. “Mas eu não reduzi só o número, reduzi a verba para menos da metade que era direito, em torno de R$ 170 mil. Mas eu nem chego a atingir o teto que me impus”, comenta. Seus dez assessores custam hoje R$ 123 mil por mês. Considerando só os comissionados, são apenas R$ 82 mil.
Reguffe não fez ofícios relativos aos gastos com correios e gráfica, mas não utilizou também esses recursos. Abriu mão do auxílio-moradia e das viagens internacionais e diárias. “Nunca viajei com dinheiro público nem recebi diárias”, afirma. A Gazeta do Povo registrou as viagens luxuosas dos senadores Gladson Cameli (PP-AC) e Ciro Nogueira (PP-PI) pelo mundo, com passagens de até R$ 48 mil. Os únicos gastos do seu gabinete são com material de consumo, como água e papel. Foram R$ 831 no ano passado.
Gabinete funciona normalmente
Apesar da escassez de recursos, o seu gabinete “funciona perfeitamente”, segundo o seu relato. “Os parlamentares ainda têm direito uma consultoria legislativa, com consultores concursados. Se o parlamentar tiver uma dúvida sobre meio ambiente, economia, ele tem ali um consultor qualificado que pode ser consultado. O gabinete funciona perfeitamente”.
Reguffe é um parlamentar discreto, até um pouco tímido. Não gosta de dar entrevistas nem de ser fotografado. Ele prefere não comentar os gastos dos demais senadores. “Eu penso que cada um tem um jeito de tocar o seu mandato. Todos foram eleitos e todos precisam ser respeitados. Agora, o meu jeito de tocar o mandato é esse, tentando custar menos para o contribuinte, cumprindo a minha responsabilidade, fazendo o meu trabalho para honrar quem votou em mim”, afirma o senador.
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Ele está sem partido há dois anos. Deixou o PDT no período pré-impechment da presidente Dilma Rousseff, por discordar da decisão do partido de permanecer no governo petista.
Economista e jornalista formado, Reguffe está no terceiro mandato parlamentar. Mas não foi fácil chegar ao parlamento. Foram três tentativas até ser eleito deputado distrital pelo PDT, em 2006, com 25 mil votos – a terceira maior votação. Sempre prometeu que não disputaria a reeleição.
Em 2010, foi eleito deputado federal com 266 mil votos – 19% do eleitorado. Foi o deputado federal mais votado no país proporcionalmente. Em 2014, chegou ao Senado, com 826 mil votos – 57% do eleitorado. Em todos os seus mandatos, sempre renunciou a todas as verbas indenizatórias e demais mordomias parlamentares.