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Indenizações pagas a procuradores da República em dezembro do ano passado custaram R$ 75 milhões aos cofres públicos. Eram conversão de licença-prêmio em dinheiro, abonos e indenização de férias não usufruídas. O maior pagamento foi feito ao procurador Mário Lúcio Avelar, da Procuradoria da República em Goiás, no valor de R$ 362 mil. O procurador-chefe da Procuradoria da República da 1ª Região, José Robalinho, recebeu R$ 352 mil. A renda total de 18 procuradores superou os R$ 400 mil.
A maior parte dos pagamentos resultou de conversão de licença prêmio em “pecúnia” – num total de R$ 63 milhões. Os abonos pecuniários renderam mais R$ 12,5 milhões. As indenizações de férias ficaram em R$ 800 mil. A soma das “verbas indenizatórias” resultou em valores acima de 200 mil para 94 procuradores – ou acima de R$ 100 mil para 318 deles. Nos primeiros 11 meses do ano, essas verbas tiveram valores médios de R$ 4 milhões para todos os procuradores. Em dezembro, totalizaram R$ 79 milhões. Entre os 18 membros do Ministério Público Federal que receberam boladas acima de R$ 300 mil, estão 11 subprocuradores-gerais da República, que atuam da Procuradoria-Geral da República (PGR).
O procurador regional José Robalinho recebeu R$ 104 mil de indenizações de férias, R$ 35 mil de abono pecuniário e R$ 211 mil de conversão de licença prêmio não usufruída em pecúnia, além de adicional de férias de 2022 que, “por razões administrativas, a Procuradoria-Geral da República (PGR) decidiu pagar adiantado a procuradores e servidores”, informou ao blog a Procuradoria da 1ª Região. A renda bruta do procurador chegou a R$ 446 mil.
O procurador Mário Lúcio Avelar recebeu R$ 291 mil de conversão de licença prêmio em pecúnia e R$ 68 mil de abono pecuniário, além de outras indenizações menores. Sua renda bruta naquele mês bateu em R$ 471 mil. O subprocurador-geral Rogério de Paiva Navarro ficou com a terceira posição no ranking dos pagamentos extras: R$ 350 mil. Foram R$ 282 de conversão de licença prêmio e R$ 66 mil de abono pecuniário. A sua renda total bruta chegou a R$ 456 mil.
O ex-procurador Deltan Dallagnol, que coordenou a Operação Lava Jato e deixou a carreira no início de novembro, recebeu R$ 191 mil de indenização de férias em dezembro do ano passado. O procurador-geral da República, Augusto Aras, teve direito a R$ 70 mil de abono pecuniário. Com renda base de R$ 43,2 mil, teve renda total de R$ 174 mil em dezembro, incluindo 13º salário, terço constitucional de férias e abono permanência. A ex-procuradora-geral Raquel Dodge, que antecedeu Aras, recebeu R$ 198 mil de conversão de licença prêmio. A renda bruta foi de R$ 273 mil. (Veja abaixo a lista das 30 maiores indenizações e rendas totais)
“Antecipação de gastos”, diz 1ª Região
A indenização de licença prêmio é devida no momento da aposentadoria ou de desligamento, a qualquer agente público, se não gozada durante a carreira, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em 2017, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) definiu que, “de acordo com a disponibilidade orçamentária e conveniência da administração, estes valores poderiam ser antecipados e pagos na ativa”, segundo nota da Procuradoria da 1ª Região.
“O procedimento do Ministério Público da União (MPU), portanto, foi uma antecipação de pagamentos e diminuição de passivos. Considerando que o procurador José Robalinho tem 30 anos de serviços públicos, esteve, como outros procuradores, na lista dos indenizados pelo MPU, em antecipação de gastos obrigatórios, que a PGR decidiu executar na ocasião do fechamento do ano orçamentário. As regras de pagamento de verbas indenizatórias se aplicam não só a membros, mas também para servidores do MPF”, diz a nota.
As indenizações de férias ocorrem quando os servidores não podem usufruir as férias por “necessidade de serviço”. No caso dos procuradores e juízes, as férias são de 60 dias, o que resulta no acúmulo de indenizações. Como são indenizações, não há desconto do imposto de renda nem contribuição para a Previdência Social. O pagamento cai inteiro na conta do procurador ou juiz. A Proposta de Emenda Constitucional da Reforma Administrativa (PEC 32/2020) veda a concessão de férias acima de 30 dias por ano e também a licença-prêmio.
Robalinho, que foi presidente por dois mandatos da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), conta com renda base de R$ 35,4 mil e teve renda total de R$ 446 mil em dezembro. Pagou R$ 13 mi de previdência e R$ 22,6 mil de imposto de renda, mais R$ 9 mil de abate-teto. Com renda bruta de R$ 471 mil, Avelar pagou R$ 12,7 mil de previdência, R$ 29 mil de imposto de renda a nada de abate-teto.
A Procuradoria da 1ª Região afirmou ainda que as regras relativas às férias “são rígidas; e não é comum a indenização de férias, o que só ocorre se não tiver havido possibilidade de gozo por dois anos, por absoluta necessidade de serviço e rigidamente comprovadas. Esta foi a única situação do tipo percebida pelo procurador [Robalinho] em 22 anos de MPF. Houve uma parcela menor paga por volta de 2017. O restante, imagina-se, em razão de restrições orçamentárias, foi paga agora. Era devida há anos”.
“Direitos previstos em lei”, diz Aras
A Procuradoria Geral da República afirmou que os pagamentos feitos em dezembro de 2021 “são excepcionais e tratam de obrigações previstas em lei e reconhecidas pela Justiça e regulamentadas pelo CNMP”. Augusto Aras, disse que cumpriu decisões judiciais e do CNMP anteriores à sua gestão, iniciada em 26 de setembro de 2019.
Segundo o procurador-geral, trata-se da quitação de dívidas da União para com membros do MPF, tais como licença-prêmio, abonos e indenizações de férias não usufruídas. Parte dessas dívidas é antiga (algumas da década de 1990) e foi reconhecida por decisões judiciais: “Referem-se a direitos previstos em lei, reconhecidos e disciplinados pelos órgãos superiores e de controle, caso do CNMP. Todos os valores pagos pelo MPF a seus membros atendem os princípios da legalidade e da transparência, tanto que estão disponíveis para escrutínio de qualquer cidadão no portal da instituição”.
O procurador-geral afirmou que a aplicação do teto constitucional às despesas de caráter remuneratório e indenizatório segue o disposto na Resolução CNMP nº 9/2006. A resolução diz que não estão sujeitas ao teto as verbas de caráter indenizatório, ajuda de custo para mudança e transporte, auxílio-alimentação, auxílio-moradia, diárias, auxílio-funeral, indenização de férias não gozadas, indenização de transporte; licença-prêmio convertida em pecúnia e outras parcelas indenizatórias previstas em lei. São os chamados "penduricalhos".
Aras acrescentou que a folha de dezembro de 2021 apresenta valores maiores do que a média de outros meses inclusive em razão de pagamentos obrigatórios efetivados sempre nessa época do ano, como parcela de 13º salário devida a membros e servidores. “Os adiantamentos feitos – antecipação de férias de 2022 e de auxílio alimentação de janeiro – observam critérios técnicos de gestão administrativa e têm o objetivo de garantir a integral execução orçamentária, inclusive no sentido de se evitar a rolagem de dívidas para exercícios futuros”.