Documentos internos da Advocacia Geral da União (AGU) revelam as entranhas das indicações políticas feitas por parlamentares para preencher cargos de confiança no governo federal. Pedido da deputada Gorete Pereira (PR-CE) para que um procurador federal fosse removido de Sobral para Fortaleza foi registrado em ofício. Para ser nomeado, o servidor teria que furar a fila de remoção. O apadrinhamento recebeu parecer de uma procuradora antes da decisão final da AGU.
Em 16 de maio, os representantes da carreira dos procuradores federais no Conselho Superior da AGU, Carlos Marden e Vilson Vedana, solicitaram a Grace Mendonça o levantamento do sigilo dos pedidos políticos de parlamentares, com a remessa dos ofícios à Corregedoria e à Comissão de Ética, para fins de apuração de eventuais irregularidades.
O sigilo das indicações feitas por parlamentares não caiu, mas o blog teve acesso a parecer da AGU sobre o pedido feito por Gorete Pereira. Assinado pela procuradora Beatriz Monzillo, no dia 15 deste mês, o documento diz que Marden de Carvalho “participou do último concurso de remoção promovido pela Procuradoria-Geral Federal e obteve a 139ª posição na lista de antiguidade. Naquela ocasião, 11 colegas mais antigos manifestaram interesse na remoção para a cidade de Fortaleza/CE”. A procuradora concluiu que o indicado não possui antiguidade na carreira para ocupar o cargo em comissão na Procuradoria Federal no Dnocs.
Veja a íntegra do parecer da procuradora Beatriz Monzillo
Indicações repercutem nas votações da Câmara
A repercussão do caso revela os bastidores das indicações políticas feitas por deputados. Procuradores trocaram acusações e discutiram a legalidade dos atos de apadrinhamento político, com repercussões em importantes votações na Câmara, como o pedido de abertura de processo contra o presidente Michel Temer e a aprovação dos honorários para os advogados públicos federais.
Marden Carvalho atribuiu ao atual titular do cargo comissionado, George Macedo, o vazamento do ofício da deputada Gorete. “Houve um desejo de retaliação pelo procurador George Macedo, que ocupa o DAS do Dnocs e acredita ter direto de possui-lo por prazo infinito”. Ele relata como teria ocorrido a nomeação: “Seu primo, o deputado federal Vitor Valim (Pros-CE) intercedeu para que ele ocupasse o DAS no Dnocs”. Disse que Macedo está no cargo há muitos anos.
Carvalho defendeu a legalidade do seu pedido. “Não defendo esse critério de antiguidade, pois a lei não exige. Para ocupar DAS escolhe-se alguém em detrimento de outros. É assim que são escolhidos os ocupantes de DAS. Você acha que as indicações para ocupar DAS ocorrem como? O mais alto, mais bonito, mais novo, mais velho? É um critério de livre nomeação. A rigor, tudo está dentro da Lei. Só discordo da falta de igualdade no tratamento dos casos. Para uns pode, para outros não”.
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O gabinete de Valim afirmou que houve o pedido de “apoiamento”, mas que o deputado não fez a indicação. O chefe de gabinete, Maxwell Gonçalves, afirmou: “Os cargos que ele tinha, quando votou para a denúncia do Temer prosseguir, cortaram tudo. Acabou. Hoje, ele não tem indicação nenhuma, morreu”. Gonçalves também negou que o deputado seja primo do procurador: “Isso é relativo”.
Informado de que Valim teria negado ser primo de Macedo, Carvalho relatou um fato que explicita o lobby dos procuradores no Congresso por interesses corporativos: “Pois o George disse isso para todos os colegas na época em que estávamos buscando apoio parlamentar para votar projetos de interesse da AGU. Isso foi em 2017. Quando conseguimos aprovar os honorários para os advogados públicos federais”.
Indicação para advogado-geral da União
Carvalho citou também um jantar de articulação em Fortaleza, com a presença da deputada, feito a pedido do Carlos Marden: “Ela ligou para o então ministro Adams, na frente de todos os presentes, pedindo que intercedesse para que o colega ocupasse o cargo que seria vago. Na ocasião chegou a prometer que falaria com a própria presidente Dilma. A deputado chegou a ligar, no viva-voz, para o ministro Adams”.
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Carlos Marden afirma que são situações diferentes: “O cargo de advogado-geral é de livre nomeação do presidente da República, que pode nomear qualquer pessoa, inclusive de fora da carreira. A associação organizou uma lista tríplice com três nomes para substituir o Adams. A estratégia era tentar apoio político para convencer o presidente a aceitar alguém de carreira. Ele [Carvalho] está fazendo uma ação política para prejudicar os colegas, para furar a fila de remoção. Tem gente esperando há quase 15 anos. Na lista, nós estávamos atuando juntos, num ato político. Não teve ninguém passando perna em ninguém”.
AGU não abre sigilos
A reportagem solicitou à AGU a informação do número de indicações feitas por parlamentares nos dois últimos anos, com o nome dos padrinhos e dos apadrinhados. As informações não foram prestadas. A AGU afirmou apenas que “existem critérios legais para a remoção, requisição e cessão de membros e servidores da instituição. Portanto, eventual indicação não vincula o resultado do processo. Os pedidos formulados para movimentação de servidores e membros da AGU têm caráter meramente de apoio do requerente ao indicado, o que não influencia a tomada de decisão da administração. Por essa razão, não ocorre o registro sistemático dessas demandas”.
No caso do procurador federal Marden de Carvalho, informou que o pedido não foi deferido pela Procuradoria-Geral Federal qualquer pedido de remoção ou de nomeação para cargo em comissão na cidade de Fortaleza/CE, “já que o referido procurador não possui antiguidade na carreira para ser lotado naquela localidade”.
A reportagem procurou a assessoria da deputada Gorete Pereira e informou o conteúdo da apuração. A deputada não se manifestou.
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