Pré-candidatos a presidente da República que se apresentam como o “novo” no cenário político nacional em 2018 terão de arregaçar as mangas e gastar muita sola de sapato pelo interior do país. Políticos como Jair Bolsonaro (atual PSC e futuro Patriota), João Doria (PSDB) e Alvaro Dias (Podemos) são desconhecidos nos rincões do Brasil. Alguns eleitores até reconhecem o nome, porque assistem TV, mas nada sabem sobre suas propostas para o país e muito menos a trajetória política deles.
A constatação foi feita pela própria Gazeta do Povo, que percorreu 3,5 mil quilômetros em Minas Gerais para produzir a segunda reportagem da série “O que os brasileiros esperam do futuro presidente a um ano das eleições”. A escolha do estado não foi aleatória. A terra de Tiradentes, Juscelino Kubistchek e Tancredo Neves é a região que melhor representa o país e o brasileiro, por sua localização geográfica, tamanho territorial, diversidade populacional e mazelas sociais.
Mesmo políticos que já disputaram a Presidência em eleições anteriores, como Geraldo Alckmin (PSDB), Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede), são pouco conhecidos.
Leia a 1ª reportagem da série: Corrupção, saúde e desemprego: os desafios do futuro presidente a um ano das eleições
No Norte de Minas Gerais, em São João das Missões (foto acima), município com o menor índice de desenvolvimento humano (IDH) do estado, João Gomes de Oliveira, 56 anos, morador da periferia, diz que ainda não tem candidato a presidente. Quando pergunto se já ouviu falar de João Doria, responde assim: “Ele é do PT?”. Digo que é do PSDB. “Não, esse povo do PSDB eu nunca achei graça deles não”. Quando cito o nome de Alckmin, João Gomes pergunta de novo: “É do PT também?”.
No Distrito de São Joaquim, interior do município de Januária, o agricultor Willian Pereira, 22 anos, não tem a mínima ideia sobre em quem vai votar. Cito o nome de Marina Silva. “Não conheço muito”. Bolsonaro? “Nunca ouvi falar dele não”. Doria? “Conheço. Já ouvi umas propostas dele, mas não foi muito agradável. A gente tem que olhar mais para o desemprego”.
Na mesma região, o produtor rural Raimundo Nogueira da Silva, 56 anos, cria gado e planta numa área própria de 90 hectares. Pergunto se conhece Bolsonaro. “Não, eu entendo muito pouco disso”. E João Doria? “Também Não”. Marina? “Já conheço, nunca foi eleita, mas mostra ser uma boa candidata”.
A situação é diferente quando o nome do candidato é Lula. O nome do ex-presidente petista é facilmente reconhecido, o que só amplia o desafio dos adversários dele em se tornarem mais conhecidos.
“Sumiu pros infernos”
Na reserva indígena Xakriabá, em São João das Missões, vivem cerca de 7,5 mil índios. Grande parte deles assiste os telejornais em casa. O sinal chega pela antena parabólica. Paulo Batista Bezerra, 35 anos (imagem abaixo), ainda não escolheu candidato.
Pergunto se ele conhece Lula. “Conheço. De primeiro, diz que ele fez algumas coisas erradas, né? Depois, ele sumiu pros infernos”. Em seguida, Paulo diz desconhecer todos os outros pré-candidatos: Bolsonaro, Doria, Marina, Alckmin, Ciro Gomes…
O relato do índio Daniel Lopes Bezerra, 23 anos, casado, com um filho, demonstra pouco interesse na política. Questionado sobre Lula, responde: “Moço, a gente conhece, né?”. Pergunto o que ela acha do candidato. Ele olha para o lado, como se pedisse ajuda à esposa. “Moço, nem sei dizer isso aí porque a gente não…”. Ele ainda não tem candidato.
Cito o nome de Bolsonaro. Ele conhece, mas também não sabe o que falar. Olha para a esposa e responde confuso: “Moço… eu nem sei, né amor?”. Depois, diz desconhecer os outros nomes citados.
No Vale do Jequitinhonha, no povoado Taquaral de Minas, município de Itinga, às margens do rio, Maria de Fátima Silva Costa, 20 anos, casada, com dois filhos, afirma que votará em Lula se ele for candidato. Mas nada sabe sobre os demais concorrentes. Sobre Marina, responde: “Já ouvi falar dela, mas não acho nada, não”.
“João Dó… como é que é?”
No interior de Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, o posseiro Geraldo Maia de Araújo, 73 anos (foto abaixo), afirma ocupar quatro hectares de terra cedidos informalmente pelo governo. Com a ajuda de dois filhos, planta abacaxi, milho e feijão, mas agora está esperando pela chuva que não chega. Ele aceita conversar sobre política no seu barraco feito de restos de tábuas. A mulher prepara um café novinho no fogão caipira.
Leia a 3ª reportagem da série: Deus no sertões e o diabo nas grandes cidades. Quem é esse candidato?
Ele fala que ainda não tem candidato. Pergunto se conhece João Doria. Ele olha para os filhos, sentados ao lado, e comenta: “Não entendi direito”. Repito o nome pausadamente. “Ah! João… João Dó… como é que é?”. Um dos filhos tenta ajudar. “João Doria, é prefeito do Rio”, diz, equivocado sobre a cidade, que na verdade é São Paulo. Seu Geraldo responde: “Não, não conheço não”. E Bolsonaro? “Também não”.
Sobre Marina Silva, comenta: “Mais ou menos. Não acho ela muita coisa não”. Pergunto sobre Ciro. “Como senador, parece que é uma pessoa muito boa, mas, por enquanto, prefiro não falar”. Detalhe, Ciro não é senador.
Ele também comenta sobre Alckmin: “É boa pessoa, um político que parece ser muito bom. Mas, na minha opinião, seria o Lula mesmo”.
“Sou péssima com política”
Em Uberlândia, município com o terceiro maior IDH do estado, a representante comercial Karine Guimarães, 37 anos, começa a conversa com desenvoltura. Diz que ainda não escolheu o seu candidato. Questionada sobre Bolsonaro, responde: “Não votaria nele”. Pergunto o que lhe desagrada no candidato: “Moço, sou ruim pra falar disso. Deixa, deixa quieto”.
Pergunto sobre Doria. Ela passa a mão nos cabelos e responde: “Dori (sic)… parece que ele foi um bom candidato do Paraná, né?”. Digo que ele é de São Paulo. “Ai, moço, eu sou péssima com política. Não quero falar não”. Ela tenta se afastar, mas sigo ao seu lado e pergunto sobre Lula. “Não, não votaria no Lula. Pelo que está a situação política hoje em dia”.
Leia a 4ª reportagem da série: Radical linha dura e marqueteiro sem sal: o que os eleitores pensam de Bolsonaro e Doria
Pergunto sobre o ex-governador Aécio Neves. “Pior ainda. Não voto nele”. Ela acrescenta que também não votaria em Alckmin nem em Ciro Gomes. Questionada se conhece algum outro candidato, ele vira para o filho adolescente e pergunta: “Qual é aquele lá do Paraná?”. Alvaro Dias, pergunto. Ela confirma: “Acho que é o mais aconselhável, pelo governo que fez no Paraná”.
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