A Câmara dos Deputados conta com um orçamentário paralelo chamado Fundo Rotativo. Esse fundo paga as despesas médicas milionárias dos deputados, feitas em hospitais de luxo. De 2019 a julho de 2022, as receitas do Fundo Rotativo somaram R$ 399 milhões. As despesas do fundo com recursos orçamentários ficaram em R$ 28 milhões, sendo R$ 23 milhões destinados ao pagamento das despesas médicas.
Com financiamento farto, as despesas médicas não têm limites. No atual mandato, um grupo de apenas nove deputados gastou R$ 7 milhões em despesas médicas e hospitalares. A deputado Teresa Nelma (PSDB-AL) gastou R$ 2 milhões num tratamento de câncer. O deputado Damião Feliciano (PDT-PB), vítima da Covid, mais R$ 1,2 milhão.
As despesas de Célio Moura (PT-TO), no valor de R$ 875 mil, resultaram de um acidente de automóvel. O ex-deputado Jair Bolsonaro recebeu, em 2019, ressarcimento de R$ 435 mil de cirurgias em consequência da facada sofrida em 2018, durante a campanha presidencial.
O Fundo Rotativo é uma unidade orçamentária dentro do orçamento da Câmara. A página de Transparência da Câmara mostra que que o fundo recebeu R$ 399 milhões em quatro anos, sendo R$ 255 milhões relativos a remuneração de depósitos bancários e R$ 120 milhões pela cessão do direito de operacionalização da folha de pagamento.
As despesas do Fundo Rotativo somaram R$ 28,7 milhões no mesmo período. Exatos R$ 23 milhões pagaram indenizações e restituições. São despesas médicas e hospitalares dos deputados. Mas a transparência é opaca. Não aparecem os nomes dos deputados. Estão registrados apenas o número do CPF dos parlamentares com os valores reembolsados. Não há informação sobre os hospitais e os tratamentos pagos.
Questionada pelo blog, por meio da Lei de Acesso à Informação, sobre o destino dos R$ 399 milhões, a Câmara respondeu: “Considerando o período de janeiro de 2019 a julho de 2022, as receitas do Fundo Rotativo foram R$ 399 milhões, e a execução das despesas orçamentárias, R$ 27,8 milhões. No referido período, foram transferidos para a Secretaria do Tesouro Nacional R$ 113 milhões. As receitas do Fundo Rotativo que não foram utilizadas para o pagamento de despesas orçamentárias ou transferidas para a Secretaria do Tesouro Nacional, foram aplicadas na Conta Única do Tesouro Nacional”.
Preferência à assistência social
O Fundo Rotativo foi criado em 1971, por Resolução da Câmara, para financiar o aparelhamento da casa, a solução do problema habitacional, programas de assistência social, melhoria das condições de trabalho de deputados e funcionários e outras realizações “necessárias ao cumprimento da função legislativa”.
Entre as receitas do fundo previstas pela resolução estão créditos orçamentários, taxas de utilização de móveis, multas aplicadas a fornecedores e prestadores de serviços, valores gerados pela venda de livros e publicações, o produto das operações de financiamentos de imóveis residenciais e valores decorrentes de aluguéis de imóveis pertencentes à União sob a jurisdição da Câmara.
Nova resolução de 2000 determinou que as receitas do fundo seriam destinadas preferencialmente a programas de assistência social.
Eles preferem o Sírio
Dois reembolsos feitos à deputada Tereza Nelma, em outubro de 2020, tiveram os valores de R$ 350 mil e R$ 780 mil. Célio Moura (PT-TO) sofreu um acidente de carro grave em junho de 2020, próximo a Araguaína. O veículo saiu da sua pista e chocou-se de frente com um caminhão. O irmão Marcilo, que dirigia o carro, morreu no local. O deputado sofreu várias fraturas e uma perfuração no pulmão. As cirurgias e o longo tratamento de recuperação custaram R$ 875 mil.
O deputado Damião Feliciano (PDT-PB) foi internado no hospital Sírio Libanês, em fevereiro de 2021. Contaminado pelo coronavírus, chegou a ser entubado. Houve complicações decorrentes da doença. Após um longo tratamento, teve alta em 3 de maio. Em setembro daquele ano, recebeu reembolsos de R$ 690 mil. As suas despesas médico-hospitalares fecharam em R$ 1,2 milhão
Nilson Pinto (PSDB-PA) teve uma infecção bacteriana que levou ao agravamento de problemas cardíacos, com risco de morte. Foi removido em UTI aérea de Belém para o hospital Sírio Libanês, ficando 35 dias internado. Em outubro, foi levado novamente para o Sírio, onde ficou internado por mais 16 dias. Em outubro de 2020, teve dois ressarcimentos no valor total de 584 mil. O tratamento completo chegou a R$ 735 mil. Haroldo Cathedral (PSD-RR), recebeu dois ressarcimentos no valor total de R$ 457 em outubro de 2020. Os oito pagamentos feitos pela Câmara somaram R$ 564 mil.
Limite de ressarcimento ampliado
O deputado Jesus Sérgio (PDT-AC) foi contaminado pela Covid-19 em Tarauacá, distante 400 km de Rio Branco, no final de 2020. Foi resgatado por um avião do governo estadual e internado no hospital da Unimed em Rio Branco. Como o caso era grave, foi contratada uma UTI aérea para transportá-lo para Brasília, ao custo de R$ 118 mil. Passou duas semanas no hospital da Rede D'or em Brasília. Mais uma despesa de R$ 176 mil. A conta fechou em R$ 346 mil.
Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) foi infectado pela Covid em Teresópolis, tentou ir para o hospital Albert Einsten, em São Paulo. Temia sofrer um atentado no Rio: “O meu mandato é muito ideológico, de confronto à esquerda, e eu sei que a área de enfermagem é muito sindicalizada, ligada à esquerda”, relatou ao blog. Mas conseguiu vaga no hospital Copa D’or no Rio. As suas despesas somaram R$ 206 mil.
Em abril do ano passado, Moses Rodrigues (MDB-CE) foi internado no hospital Albert Einstein, em São Paulo, com quadro clínico de obstrução intestinal. Foi submetido a cirurgia – uma pequena ressecção intestinal por aderência. Os reembolsos feitos pela Câmara em junho e julho somaram R$ 188 mil.
Em abril do ano passado, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-A), determinou um reajuste de 170% no limite máximo para ressarcimento de despesas médicas, que subiu de R$ 50 mil para R$ 135 mil. Mas os casos excepcionais são analisados pela Mesa Diretora, que pode aprovar o pagamento acima do limite.
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