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Lúcio Vaz

Lúcio Vaz

O blog que fiscaliza o gasto público e vigia o poder em Brasília

Passagens de servidores chegam a R$ 80 mil: decreto de Bolsonaro ampliou mordomias

Na viagem presidencial a Moscou, foram compradas mais 21 passagens para servidores (Foto: Valdenio Vieira/PR)

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Passagens de ministros e servidores de alto escalão com valores elevados, chegando a R$ 82 mil, ocorreram em maior número após o decreto do presidente Jair Bolsonaro que liberou os voos na classe executiva para a elite do funcionalismo, no início do ano. Entre os voos mais caros estão os da ex-ministra Tereza Cristina, R$ 79 mil, para Teerã (Irã); e do ex-ministro Bento Albuquerque, R$ 64 mi, para Washington e Nova York. O voo do secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Lucas Ferraz, para Cingapura, custou R$ R$ 82 mil.

Bento Albuquerque também gastou R$ 49 mil com passagens para visitar Nova Delhi (Índia), em janeiro, acompanhado por comitiva empresarial brasileira que tratou da cooperação entre o Brasil e a Índia na área de mobilidade sustentável. Dois assessores que acompanharam o ministro gastaram R$ 26,6 mil e R$ 18,4 mil com passagens. Na viagem a Nova York e Washington, em maio, as passagens de dois assessores custaram R$ 20 mil.

A passagem da assessora da ministra Cristina para Teerã, Fabyanne Luz, chegou a R$ 35 mil. A ministra foi tratar de relações comerciais e importação de ureia. Na viagem para Otawa, em março, a passagem da ministra ficou em R$ 39 mil – o mesmo valor da passagem do assessor Orlando Ribeiro.

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Reuniões de Primavera

O almirante de esquadra Flávio Viana Rocha viajou a Washington em maio para participar de reuniões bilaterais a convite da Embaixada dos Estados Unidos. A passagem custou R$ 74 mil. Ele ocupa um cargo de natureza especial (CNE) na Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Erivaldo Alfredo Gomes, que ocupa um cargo de assessoramento superior (DAS) no Ministério da Economia, esteve em Washington em abril para participar das Reuniões de Primavera do Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional. Sua passagem chegou a R$ 63 mil.

Na viagem para Cingapura, em maio, Lucas Ferraz chefiou as negociações para o Acordo Mercosul-Singapura. A passagem do servidor Frederico Fontes, que ocupa uma função comissionada na Economia, custou R$ 42 mil. Nove dos 14 integrantes da comitiva pagaram apenas R$ 11 mil pelas suas passagens. O voo de Ferraz para Genebra, Paris e Madri, em março, para assessora o ministro da Economia em reuniões da Organização Mundial do Comércio, custou R$ 28 mil. O custo médio da passagem dos outros cinco assessores ficou em R$ 13 mil.

O ministro das Comunicações, Fábio Faria, esteve em reuniões com representantes de governos e de empresas de telecomunicações em Tel Aviv e Jerusalém (Israel), Nova York e San Diego (EUA), de fevereiro a maio. As suas passagens custaram de R$ 49 a R$ 56 mil. As de seus assessores ficaram, em média, em R$ 13 mil.

Roberto Fendt Júnior, que ocupa um cargo de natureza especial da Economia, também representou o Ministério da Economia nas Reuniões da Primavera (Spring Meetings) do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, em Washington. Sua passagem bateu nos R$ 54 mil.

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Expo Dubai, Defense Show

Dubai, nos Emirados Árabes, é sempre um destino muito concorrido. Uma passagem para lá pode custar de R$ 5 mil a quase R$ 50 mil. Marcos Guerson de Oliveira foi representar o Inmetro na Feira Expo Dubai em março. A sua passagem custou R$ 49 mil. Kenneth da Nóbrega representou o ministro das Relações Exteriores nas exéquias (funerais) do presidente Sheikh Khalifa bin Zayed Al-Nahyan, em Dubai, com passagem a R$ 41 mil.

O almirante Flávio Viana Rocha também esteve na 8ª edição do World Government Summit, em Dubai, no final de março; e em reunião com o almirante Jean-Philippe Rolland, Chefe do Estado-Maior da Presidência da França, em Paris, no início de abril, gastando R$ 34 mil com passagens. Dois sargentos reformados que ocupam DAS na Presidência da República estiveram em Dubai, na função de segurança do ex-presidente Michel Temer, que participou da 4ª Edição do Global Business Fórum da América Latina. A passagem de cada um deles custou R$ 6,3 mil.

O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, esteve em Washington em fevereiro para participar do debate “de alto nível” intitulado: “Momento de Galvanização para Vacinação Universal', convocado pelas Nações Unidas. A passagem ficou por R$ 48 mil. As passagens dos dois assessores que acompanharam o ministro, ocupantes de DAS e função comissionada, custaram R$ 47 mil cada uma.

Marcos Degaut Pontes, ocupante de um cargo superior no Ministério da Defesa, viajou para Riad, na Arábia Saudita, para participar da World Defense Show, com passagem de R$ 39 mil. Ele também esteve em Moscou e Abu Dabi, acompanhando o ministro da Defesa na viagem oficial do presidente Jair Bolsonaro, em fevereiro. Mais uma passagem de R$ 39 mil. Pelo menos 21 passagens foram compradas para servidores que participaram da viagem presidencial a Moscou. Três delas tiveram valor acima de R$ 27 mil. As 18 restantes tiveram valor médio de R$ 9 mil.

A gerente executiva da Agência Nacional das Águas (ANA), Cíntia de Araújo, viajou para Nova York em maio para participar como palestrante no painel sobre Concessões de Saneamento. A sua passagem custou R$ 42 mil.

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Bolsonaro liberou voos executivos

O blog perguntou aos ministérios citados na reportagem por que alguns servidores têm o privilégio de viajar na classe executiva e qual a norma legal que assegura esse direito. Responderam que o Decreto nº 10.934/22, baixado pelo presidente Bolsonaro em 11 de janeiro deste ano, estabelece que a passagem poderá ser na classe executiva quando a duração do voo internacional for superior a sete horas, para ministros de Estado; servidores ocupantes de cargo em comissão ou de função de confiança de nível FCE-17, CCE-17 ou CCE-18; ou servidores que estejam representando essas autoridades.

No primeiro semestre deste ano, ocorreram mais voos com valores elevados do que em anos anteriores. Durante todo ano passado, foram 27 passagens com valores acima de R$ 30 mil. Em cinco meses de 2022, foram 41 passagens nesse padrão, o que projeta uma compra anual de 98 passagens. Em 2019, ano em que não havia a Covid-19 – que restringiu os voos internacionais – foram apenas 16 voos acima de R$ 30 mil.

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A regra é facultativa

O Ministério da Economia afirmou ao blog que a emissão de passagens na classe executiva, quando a duração do voo internacional for superior a 7 horas, “é regra facultativa e dependerá da demonstração de que não compromete o limite orçamentário nem o planejamento de viagens a serviço do respectivo órgão ou entidade. Os gestores dos órgãos e entidades federais terão de analisar cada viagem e decidir pela viabilidade ou não da emissão na classe executiva, pois não houve aumento do limite para gastos com essa despesa”.

O Ministério das Minas e Energia disse que as aquisições foram realizadas de acordo com as normas legais, que permitem a passagem na classe executiva quando a duração do voo internacional for superior a sete horas, no caso de ministros de Estado e servidores ocupantes de cargo em comissão ou de função de confiança de nível FCE-17, CCE-17 ou CCE-18, ou para servidores que estejam substituindo ou representando essas autoridades. “Desta forma, somente as passagens das autoridades com cargos ou funções equivalentes às autorizadas pelo decreto foram adquiridas na classe executiva”.

O Ministério da Agricultura disse que “é possível a emissão de passagens em classe executiva”, conforme o Decreto 10.934. Sobre os deslocamentos de Marcos Degaut Pontes, o Ministério da Defesa afirmou que, conforme o Decreto n° 10.934/ 2022, “as passagens aéreas podem ser emitidas na classe executiva quando a duração do voo internacional for superior a sete horas para ocupantes de cargo CCE 17, o que é o caso do Secretário”.

A ANA afirmou que as viagens de servidores da agência são para “representações institucional em eventos, seminários para capacitação, troca de experiências e assessoria aos diretores”.

Após a publicação da reportagem, o Ministério da Economia respondeu que os bilhetes relativos à viagem do Secretário de Comércio Exterior, Lucas Ferraz, a Cingapura, de 6 a 13 de maio de 2022, foram emitidos em classe executiva. Ferraz é ocupante de DAS 101.6 (equivalente a CCE/FCE-17) e realizou voo internacional com duração superior a 7 horas. Já a passagem da assessora Paula Costim para o mesmo trecho e período foi emitida em classe econômica.

A Receita Federal afirmou que o servidor Frederico Froes Fontes deslocou-se para Cingapura/Singapura no período entre 06 e 14 de maio para participar da V Rodada de Negociações do acordo de livre comércio MERCOSUL - Singapura, que ocorreu de forma presencial, entre os dias 09 e 13 de maio de 2022. O servidor viajou de classe econômica e, ao final da viagem ocorreu a respectiva prestação de contas, incluindo a juntada dos canhotos de embarque e o relatório de participação do servidor no evento.

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