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O número de filiados está caindo, mas 148 deputados seguem ligados ao plano especial de Previdência da Câmara, que já foi extinto duas vezes, mas continua existindo e gerando gastos ao contribuinte. O plano oficializou o poliamor em 1982, prevendo a divisão da pensão entre viúva e companheira, quando ainda era o Instituto de Previdência do Congresso (IPC).
Cinco deputados filiados seguem as generosas regras do IPC, entre eles o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e o ex-presidente da Casa Aécio Neves (PSDB-MG). O presidente Jair Bolsonaro também tem direito a aposentadoria pelo antigo instituto.
O IPC prevê aposentadoria proporcional após oito anos de contribuição e ingresso na inatividade aos 50 anos de idade. Como resultado de tamanha bondade, o Orçamento da União para 2021 reserva R$ 119 milhões para “aposentadorias e pensões do extinto IPC”.
Desde a sua extinção, em 1999, essa despesa já chegou a R$ 3 bilhões. Isso porque, ao liquidar o deficitário instituto, o Congresso transferiu à União o pagamento das pensões já concedidas e a conceder. A Câmara tem hoje 473 ex-deputados aposentados, mais os seus pensionistas.
Logo após a promulgação da Emenda Constitucional 103/2019, em 12 de novembro daquele ano, havia 174 deputados filiados ao Plano de Seguridade Social dos Congressistas (PSSC), que substituiu o IPC, mas foi extinto pela reforma da Previdência. Vinte e seis parlamentares já cancelaram a filiação. Trinta e três deputados que tomaram posse na atual legislatura se filiaram ao plano.
Poliamor adotado há 40 anos
A Lei 7.087/82, que regulamentou o IPC, estabeleceu que, se o segurado deixar viúva e companheira, a pensão será dividida igualmente entre elas, devendo o montante que couber às duas dependentes corresponder a 50% do valor da pensão. A lei que criou o PSSC diz que o IPC é sucedido, em todos os direitos e obrigações, pela União, em relação às pensões concedidas pela lei vigente à época, bem como as pensões a conceder no regime da Lei 7.087/82. Mas o dispositivo mencionado aplica-se apenas a beneficiários do extinto-IPC. Não não vale para as pensões concedidas com fundamento no PSSC.
Decisão a ser tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na próxima quarta-feira (2) poderá facilitar o reconhecimento do chamado “poliamor” – uniões afetivas simultâneas – para fins de partilha da pensão por morte paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Por enquanto, há quatro votos a favor e três votos contra o rateio das pensões.
Aproveitamento de mandatos externos
Entre os novos filiados está a deputada Marília Arraes (PT-PE), que disputa neste domingo o cargo de prefeita de Recife. Ele se filiou ao PSSC no dia da posse, em fevereiro do ano passado. Depois, a Câmara aprovou duas averbações (aproveitamento) de mandatos de Marília como vereadora de Recife, o que acrescentará 10 anos ao seu tempo de contribuição como deputada, elevando o valor da aposentadoria. Mais uma regalia do plano de previdência especial. Mas ela terá que pagar R$ 900 mil para aproveitar esses mandatos.
Pelas regras da reforma da Previdência, o PSSC continuará existindo para os segurados “atuais e anteriores”, como diz a EC 103/2019. Para isso, terão que cumprir pedágio de 30% do tempo de contribuição que faltava para aquisição do direito à aposentadoria. Poderão se aposentar a partir dos 62 anos de idade (para mulheres) e 65 anos (para homens). Os futuros deputados e senadores eleitos serão inscritos no regime geral, gerido pelo INSS.
A palavra “anteriores” não foi incluída por acaso no texto. Ela deixa claro que tanto os atuais deputados e senadores quanto os antigos – que já não têm mais mandato – cumprirão a regra de transição, embora isso já estivesse implícito no texto. A alteração de “redação” foi feita já no Senado.
Bolsonaro tem direitos pelo IPC
Por coincidência, o presidente Jair Bolsonaro está entre os segurados “anteriores”. O blog perguntou à Câmara se o ex-presidente continua filiado ao PSSC e se tem direito à aposentadoria. A Câmara respondeu que Jair Bolsonaro “não se encontra filiado, pois essa condição exige o exercício do mandato parlamentar. Porém, ele continua com direito à requerer o benefício pelo antigo IPC, tendo em vista que já preencheu os requisitos legais”.
Bolsonaro completou 30 anos de contribuições com a averbação de dois anos como vereador do Rio de Janeiro. Assim, terá direito a cerca de R$ 30 mil de aposentadoria. Já poderia ter feito o pedido porque cumpriu os “requisitos legais”, mas poderá se aposentar a qualquer momento, até porque é permitida a acumulação da pensão do IPC com pensão e provento concedidos por outras instituições.
Ilustres segurados
Outro deputado que vai se aposentar pelas regras do IPC é Aécio Neves (PSDB-MG). Ele já tinha cumprido 16 anos como deputado federal e oito anos como senador quando retornou à Câmara, em 2019. Em maio e setembro do ano passado, a Câmara aprovou averbações dos mandatos como governador de Minas Gerais, de 2003 a 2009 – pouco mais de seis anos, ao custo de R$ 567 mil.
Outro ex-presidente da Casa que também será aposentado pelas regras do IPC é Arlindo Chinaglia (PT-SP). Assim como Aécio, filou-se ao PSSC em 1999. O blog não encontrou processos sobre averbação de mandatos para Chinaglia.
Entre os filiados mais ilustres está o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que foi um dos coordenadores das articulações para a reforma da Previdência. O discurso do governo era que todos deveriam fazer sacrifícios para ajudar a equilibrar as contas da Previdência. Ele ingressou no PSSC em fevereiro de 2011. Em junho de 2017, a Câmara aprovou a averbação de oito anos de mandato de Onyx como deputado estadual. O custo da operação foi fixado em R$ 713 mil.
Filiado ao plano de previdência do Congresso em 1999, o deputado Ricardo Barros não solicitou qualquer averbação. A sua assessoria informou que ele tem 26 anos de contribuição previdenciária, primeiro ao IPC e depois ao PSSC.
“Atualmente a contribuição mensal é de R$ 5,5 mil. Pelas regras do IPC, o deputado já poderia ter solicitado a aposentadoria, mas nunca o fez. Em relação ao benefício do PSSC, a data inicial para solicitação é 31 de janeiro de 2023”, diz a nota do gabinete. (Veja abaixo a lista completa dos deputados filiados ao PSSC)
Os campeões de averbações
Chiquinho Brazão (Avante-RJ) é outro novato que busca aproveitar mandatos externos. Ele filiou-se em fevereiro do ano passado. Após seis meses, conseguiu a averbação de 5.144 dias – ou 14 anos – como vereador do Rio de Janeiro. Mas isso vai custar R$ 1,25 milhão. Para qualquer caso, vale o mesmo cálculo: o valor pago é recompensado após 7 anos recebendo aposentadoria, que depois vira pensão para os seus dependentes.
Gervário Maia (PSB-PB) foi mais longe. Tomou posse no ano passado e já conseguiu a averbação de 16 anos como deputado estadual, ao custo de R$ 1,4 milhão. Mas o líder em averbações é Marcelo Nilo (PSB-BA). A Câmara aprovou o aproveitamento de 28 anos de mandato como deputado estadual. Vai custar R$ 2,5 milhão. Ele afirmou ao blog que vai aguardar o encerramento do seu mandato para decidir o período a ser aproveitado.