A Câmara dos Deputados paga R$ 3,3 milhões por mês para 179 filhas solteiras de ex-servidores. Mais R$ 276 mil são gastos com as pensionistas do Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC). O gasto total por ano com essas pensionistas fica em R$ 47 milhões. A filha solteira mais antiga, com 96 anos, recebe pensão desde 1947 – há 71 anos e oito meses.
Entre as pensionistas de ex-servidores, a renda média mensal fica em R$ 19,3 mil. As 52 melhores remuneradas têm renda acima de R$ 30 mil. Trinta e duas têm renda bruta acima do teto constitucional (R$ 33.763), mas sofrem abate-teto que chega a R$ 16 mil. Sem esse redutor constitucional, quatro delas teriam renda mensal de R$ 50 mil. A maior renda bruta é de Maria Eloá Martins Pereira – R$ 50,4 mil.
Iris Ozeas Motta, de 96 anos, teria renda de R$ 42,4 mil, mas sofre um corte de R$ 8,6 mil no seu salário. Ela recebe a pensão desde 19 de março de 1947. A mais idosa entre as pensionistas do IPC é Theresinha Lins de Albuquerque, com 92 anos, filha do ex-deputado Ulysses Lins de Albuquerque. A idade média das filhas de ex-servidores é de 54 anos. Quarenta e sete delas são idosas, com mais de 60 anos. Seis ultrapassam os 80 anos. No caso das pensionistas do IPC, a média de idade chega a 67 anos.
Pensionistas do fundo fantasma
O IPC era um fundo de previdência privado que tinha deputados, senadores e servidores como filiados. A lei que extinguiu o instituto, em 1999, transferiu para a União a obrigação de pagar as pensões, por intermédio da Câmara e do Senado. Desde a extinção, as pensões pagas a parlamentares já custaram R$ 2,7 bilhões aos cofres públicos.
Entre os pensionistas do IPC na Câmara, os maiores benefícios ficam em R$ 16,8 mil. Esse é o valor pago a Neuza Rodrigues Carneiro, de 89 anos, filha do ex-deputado Pedro Carneiro (Arena-PA). Ele exerceu o mandato por apenas 14 meses, de fevereiro de 1971 a abril de 1972, quando faleceu. Antes, havia sido vereador, deputado estadual e prefeito de Marabá (PA). Neuza recebe a pensão desde 1972.
O ex-deputado Gonzaga da Gama (MDB) foi deputado federal pelo extinto estado da Guanabara de 1967 a 1971. Antes disso, foi vereador e deputado estadual. A filha dele Sylvia Ferreira da Gama ganha pensão no valor de R$ 16,8 mil.
Filha maior do deputado Aroldo Carvalho (Arena-SC), que exerceu cinco mandatos na Câmara, Regina Zaniolo Carvalho recebe pensão desde 1981, atualmente no valor de R$ 11,6 mil. Mas ela recebe mais R$ 44,4 mil como servidora aposentada da Câmara. Com o abate-teto de R$ 10,6 mil, sobram R$ 33,7 mil bruto. Somando com a pensão de filha solteira, são R$ 45,4 mil bruto.
Pensões recuperadas na Justiça
Um quarto das atuais filhas solteiras de ex-servidores da Câmara teve a pensão suspensa por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU) no ano passado. Elas haviam perdido a dependência econômica do instituidor da pensão – o pai, no caso – segundo entendimento do tribunal.
Mas uma decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu os efeitos da decisão do TCU, por entender que só perdem o direito à pensão as filhas solteiras que ocupem cargo público permanente ou recebam pensões por morte de cônjuges. O artigo 5º, parágrafo único, da Lei 3.373/1958 diz expressamente que “filha solteira, maior de 21 anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente”.
No caso de Gilda Madlener Iguatemy, com renda batendo no teto constitucional, o TCU apurou que a pensionista “recebeu renda própria, proveniente da empresa Gilda Madlener Iguatemy – ME”. A pensão foi suspensa, mas por pouco tempo.
Cacilda Castelo Paes Lima, também com pensão no valor do teto, tinha “renda própria advinda da empresa Cacilda Castelo Paes Lima”, apurou o tribunal.
As irmãs Geociara e Geselia Corrêa tiveram a pensão suspensa porque não afastaram “os indícios de percepção de renda” proveniente das empresas Enseseg Corretora de Seguros e Geselia Correa – ME, respectivamente.
No caso de Sonia da Silva de Deus, que teve suspensa pensão de R$ 11,8 mil, o TCU apurou que a pensionista “foi sócia da empresa Sônia da Silva de Deus e não afastou os indícios de percepção de renda proveniente da referida empresa”.
Segundo o TCU, Jacy da Silva Pereira “não afastou os indícios de percepção de renda proveniente da empresa “Bazar e Artigos Religiosos da Vila Já”. Todas as pensões citadas acima foram recuperadas pelas pensionistas na Justiça.
Câmara informa
Os dados desta reportagem foram obtidos da Câmara dos Deputados por meio da Lei de Acesso à Informação. A Câmara informou que a planilha elaborada pela Coordenação de Inativos e Pensionistas contém a relação de pensionistas de ex-servidores da Câmara dos Deputados na qualidade de filha maior solteira, cujo benefício está previsto no inciso II e parágrafo único do artigo 5º da Lei 3.373/1958. “A relação retrata apenas as pensionistas que estão atualmente em folha de pagamento”, afirmou.
A planilha com a relação de pensionistas de deputados e servidores da Câmara, na qualidade de filha maior solteira, no âmbito do regime do extinto IPC (Lei 7.087/82 com Leis 4.284/63 e 4.937/66), foi elaborada pela Coordenação de Registro e Seguridade Parlamentar.
A Câmara detalhou ainda que a data inicial informada nas planilhas é aquela da concessão inicial do benefício pensional. “O benefício pode ter sido concedido inicialmente à filha menor de 21 anos que, ao completar essa idade, passou à condição de “filha maior solteira”, nos termos da legislação então vigente”.