O pagamento de pensão a filhas solteiras de militares ainda é um tabu nas Forças Armadas. Enquanto o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) divulgam detalhes como nome e remuneração dessas pensionistas, entre os três Comandos Militares, apenas a Marinha informa, parcialmente, dados sobre despesas e faixas de vencimentos. A Marinha afirma ter 11.443 filhas solteiras como pensionistas. Na Aeronáutica, há filhas solteiras com mais de 70 anos de idade.
O gasto mensal com as pensões de filhas solteiras chega a R$ 46 milhões na Marinha – o que representa uma despesa anual de R$ 608 milhões. Apenas 0,96% delas – ou 110 beneficiárias – recebem entre R$ 20 mil e R$ 28,1 mil. Outras 1.064 recebem de R$ 10 mil a R$ 20 mil. Mais 2.132 têm renda entre R$ 5 mil e R$ 10 mil. A maior parte – 6.427 beneficiárias – recebe de R$ 1 mil a R$ 5 mil.
A média fica em R$ 4 mil por pensionista, enquanto chega a R$ 14,3 mil no Senado e em R$ 17,8 mil na Câmara. A concentração de altos rendimentos também é maior no Congresso: 15 filhas solteiras maiores recebem pensão acima de R$ 30 mil, sendo que uma delas tem renda bruta de R$ 50 mil.
A Aeronáutica informa apenas que os valores mais altos das pensões atualmente pagas, que incluem cônjuges e filhas, estão em torno de R$ 20 mil. “Não há nenhuma pensão acima de R$ 30 mil. Acima de R$ 20 mil, há menos de 100 e acima de R$ 10 mil, em torno de 5,2 mil pensionistas. Estes números englobam os cônjuges, interditos, inválidos e filhas”, diz nota do Comando. Sobre a faixa de idade, a reportagem apurou que há filhas pensionistas com idades entre 70 e 75 anos.
O Exército diz que não paga pensão acima de R$ 30 mil e que “a maioria das pensões, por volta de 70%, concentra-se abaixo de R$ 5 mil”.
Base de dados não identifica
A pensão militar das Forças Armadas foi regulamentada inicialmente pela Lei 3.765/60. O artigo 7º estabelecia, entre os beneficiários da pensão, os “filhos de qualquer condição, exclusive os maiores do sexo masculino”. As filhas solteiras maiores estavam, portanto, contempladas. A Lei 8.216/91 foi mais explícita ao prever o direito para “filhas solteiras e filhos menores de 21 anos”.
O Comando da Aeronáutica informou que, até 29 de dezembro de 2000, quando foi editada a Medida Provisória 2.215, que alterou as normas da pensão militar, todo dependente era classificado como pensionista, inclusive as filhas solteiras, que não eram “discriminadas por idade”. “Desta forma, a base de dados não diferencia as filhas solteiras maiores”, diz nota enviada à reportagem.
A MP 2.215 extinguiu o direito de contribuição específica para a pensão das filhas e estabeleceu quem tem direito a pensão militar: “os filhos ou enteados até 21 anos ou até 24 anos, se estudantes universitários ou inválidos”. Mas há uma ressalva: os militares admitidos nas Forças Armadas antes de 29 de dezembro de 2000 podem manter os direitos anteriores à MP, desde que contribuam com 1,5% a mais para a pensão militar.
A Aeronáutica afirma que uma das consequências da reforma na pensão dos militares é a constante redução da contribuição e, consequentemente, a diminuição do direito de deixar pensão para filha. “Entre os anos de 2009 e 2016, o número de contribuintes ativos foi reduzido à metade, tendência também observada com relação aos contribuintes inativos. É importante ressaltar que, de 2001 até 2016, a MP 2.215-10/2001 já havia gerado uma economia de quase R$ 110 bilhões em despesas com inativos e pensionistas”.
Impedido pela Lei de Acesso
O Comando do Exército afirma que a sua base de dados “não diferencia as filhas solteiras maiores”. E acrescenta que está impedido, por força de lei, de informar dados pessoais dos pensionistas, assim como de quaisquer militares, conforme prescreve a Lei de Acesso a Informação.
Questionado sobre a recente decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que determinou o corte das pensões de filhas solteiras que contem com outra fonte de renda, o Exército afirmou que, “por hora, não há qualquer pensão cancelada por recomendação daquela Corte de Contas”. Acrescentou que realiza fiscalização constante dos processos de pensão, de acordo com a Lei nº 3.765/60 e a MP 2.215-10/2001.
A Aeronáutica diz que também fiscaliza os processos de pensão. “A fiscalização se inicia no ato da habilitação, tanto que as beneficiárias devem declarar se recebem ou não remuneração de cofres públicos.” A mesma resposta foi dada pelo Comando da Marinha.