O governo Bolsonaro acelerou o pagamento de emendas de parlamentares ao Orçamento da União nos últimos meses. Em maio foram quase R$ 600 milhões, segundo dados do portal Siga Brasil. Mas o partido mais beneficiado não foi o PSL do presidente ou mesmo alguma das siglas do Centrão, bloco que forma a maior força política do Congresso.
A bancada do PT foi a que mais recebeu recursos de emendas entre janeiro e maio deste ano – R$ 69 milhões –, considerando apenas os parlamentares da atual legislatura que foram beneficiados até maio. O PP, maior partido do Centrão, vem em seguida, com R$ 51 milhões. O PSL teve de se contentar com R$ 6,7 milhões. Um deputado do PSOL, o paraense Edmilson Rodrigues, é um dos campeões em emendas liberadas até agora.
As emendas individuais são usadas para financiar obras de pequeno e médio porte nos redutos eleitorais de deputados e senadores. Tradicionalmente, são usadas como moeda de troca no Congresso. Os parlamentares aprovam os projetos do governo e recebem recursos para suas emendas – o chamado “toma lá, dá cá” da política. O presidente Jair Bolsonaro afirma que não entrará nesse jogo.
Nos governos anteriores, do PT e do PSDB, partidos governistas e aliados tinham atendimento privilegiado na execução (pagamento) dessas emendas. Parece não estar havendo o mesmo no atual governo. Resta saber qual será a reação dos aliados, principalmente do Centrão (PP, PL, PRB, PTN e Solidariedade), ao saber que a oposição está tendo tratamento preferencial. E o “toma lá, dá cá” é muito praticado pelo bloco, em qualquer governo. O apoio à reforma da Previdência pode sofrer abalos.
Os partidos mais atendidos
Deputado petista levou mais que Bolsonaro
O PT elegeu a maior bancada na legislatura passada, o que assegurou a apresentação de um número maior de emendas, enquanto o PSL tinha apenas um deputado. Isso explica parte da história. Mas os números deste ano mostram algumas distorções na distribuição dos recursos.
Com apenas oito deputados, o PCdoB recebeu R$ 14,4 milhões para suas emendas. Com 31 deputados, o PRB foi contemplado com R$ 21 milhões. Os 14 deputados do Solidariedade somaram apenas R$ 10 milhões.
Entre os quatro deputados desta legislatura que mais receberam recursos, dois são da oposição. Edmilson Rodrigues (PSOL-PA) ficou com R$ 5 milhões; enquanto Pedro Uczai (PT-SC) chegou a R$ 4,4 milhões. Os dois foram mais bem atendidos do que o ex-deputado Jair Bolsonaro (PSL), por exemplo. O seu governo executou R$ 3,3 milhões das suas emendas. O senador Romário (PODE-RJ) lidera o ranking entre todos os parlamentares, com R$ 6,4 milhões em emendas executadas.
O filho do presidente, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), conseguiu liberar R$ 2,3 milhões. O líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), ficou com R$ 1,4 milhão. Na Câmara, o líder do partido do presidente, Delegado Waldir (GO), que já era deputado no ano passado e pôde apresentar as suas emendas, foi acolhido com R$ 949 mil – quase o mesmo que recebeu Zeca Dirceu (PT-PR), o deputado que chamou o ministro Paulo Guedes de “tchutchuca” em uma sessão na CCJ da Câmara: R$ 925 mil.
O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), que chamou o ministro Sérgio Moro de “juiz ladrão” na terça-feira (2), já levou R$ 1,5 milhão em emendas. Com 10 deputados, o PSOL recebeu R$ 10,8 milhões. O líder do partido na Câmara, Ivan Valente (SP), um oposicionista radical, conseguiu R$ 1,3 milhão. Veja a lista com os parlamentares mais beneficiados.
Liberação de verbas dispara
A liberação de emendas começou lentamente, como acontece todos os anos. Foram R$ 86 milhões em janeiro e R$ 53 milhões em fevereiro. Mas a execução começou a andar após a apresentação do projeto da reforma da Previdência pelo presidente da República e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, no final de fevereiro.
Em março, foram liberados R$ 377 milhões. Em abril, mês em que o projeto foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, mais R$ 455 milhões foram executados. Em maio, com o início da tramitação na Comissão Especial, jorraram R$ 590 milhões. As liberações já somam R$ 1,56 bilhão.
Mesmo com o tratamento generoso à oposição, sobrou muito dinheiro para os aliados. Os seis partidos que formam o Centrão – PP, PL (ex-PR), PSD, PRB, Solidariedade e PTB – somaram R$ 152 milhões em emendas liberadas. O DEM, partido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), foi atendido em R$ 39 milhões. O MDB, aliado de todos os governos, ganhou R$ 47 milhões. Os tucanos levaram R$ 35 milhões. Esses números não contam as liberações feitas para emendas de deputados e senadores que não se reelegeram.
As bancadas estaduais levaram um total de R$ 486 milhões. A bancada de Minas Gerais lidera com R$ 61,8 milhões. Em seguida vem o Rio Grande do Norte, com R$ 61,6 milhões; e o Rio Grande do Sul, com R$ 52,4 milhões. A maior bancada, de São Paulo, conseguiu apenas R$ 21,5 milhões. Essas emendas são destinadas a grandes obras, principalmente nas áreas de infraestrutura e saúde.
Os dados desse levantamento foram extraídos do portal Siga Brasil do Senado Federal, com processamento da ONG Contas Abertas, especializada na fiscalização dos gastos públicos.
Sem estratégia
O blog procurou a Presidência da República e a Casa Civil para solicitar esclarecimentos a respeito da estratégia do governo na execução das emendas parlamentares. Ninguém quis se manifestar, mas apuramos que isso não é exatamente uma estratégia. A liberação dos recursos fica a cargo de cada ministério, com os seus próprios critérios.
A liderança do PSL na Câmara afirmou que o bom desempenho do PT é natural porque o partido teve a maior bancada na legislatura anterior. Assim, apresentou mais emendas. O deputado Coronel Tadeu (PSL-SP) foi encarregado pela liderança do partido a explicar os critérios utilizados na execução das emendas. “Pelos números, só está perdendo um pouquinho o MDB, porque os dois maiores partidos no ano passado eram o MDB e o PT. Está bem criterioso, até porque quem tem que ser atendido é o município ou o estado, não parlamentar”.
Tadeu afirma que, “antigamente se fazia política com isso. Ninguém pensava no povo. Um exemplo: se a maioria dos deputados do PT é do Nordeste, então, o Nordeste não receberia mais dinheiro, ou receberia menos em relação às outras regiões. E é quem mais precisa. Então, está tendo um critério justo”. O deputado reconhece que pode haver reclamações da base de apoio do governo: “Pode até haver”. Mas destaca: “Pelas palavras do presidente até agora é para não fazer distinção nenhuma”.