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Lúcio Vaz

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Sem carro, passagens e auxílio-moradia: os senadores que dão valor ao dinheiro público

Plenário do Senado Federal, em Brasília: Foto: Jonas Pereira/Agência Senado
Cinco senadores abriram mão de receber toda ou quase a totalidade da verba para o exercício do mandato – o cotão – e também de carro oficiai e apartamento funcional. (Foto: Jonas Pereira/Agência Senado)

Enquanto muitos senadores gastam fortunas com a contratação de empresas, aluguel de jatinhos, propaganda do próprio mandato, um pequeno e discreto grupo caminha na contramão da “velha política” e abre mão das regalias e mordomias oferecidas pelo Senado com dinheiro público. São cinco senadores que abriram mão de receber toda ou quase a totalidade da verba para o exercício do mandato – o cotão – e também de carro oficial e de apartamento funcional.

Esse grupo dispensa ainda privilégios como plano de saúde vitalício e aposentadoria especial. A prática já é adotada pelo senador Reguffe (sem partido-DF) desde a legislatura passada, mas agora surgiram novos adeptos da política “sem mordomias”.

São eles Leila Barros (PSB-DF), Eduardo Girão (PODE-CE), Jorge Kajuru (PSB-GO) e Vanderlan Cardoso (PP-GO). Leila e Reguffe tiveram gasto zero até agora. Os demais usaram entre R$ 7 mil e R$ 10 mil do cotão – quase nada perto do recordista em despesas, Eduardo Braga (MDB-AM), com R$ 220 mil.

Senador Reguffe (sem partido-DF). Foto: Roque de Sá/Agência SenadoSenador Reguffe era o único que abriu mão das mordomias na legislatura anterior: agora mais quatro se juntaram a ele. (Foto: Roque de Sá/Agência Senado)

O cotão disponibiliza recursos para aluguel de escritório nos estados, divulgação da atividade parlamentar, segurança privada, passagens aéreas, contratação de empresas e consultorias, e despesas com locomoção, como aluguel de carros e aviões, hospedagem e até alimentação. Fora do cotão, há outras regalias como diárias e passagens aéreas internacionais, despesas com correios e contratação de assessores.

Levantamento feito pelo blog mostrou que só os assessores dos gabinetes dos senadores, de lideranças partidárias e dos cargos da Mesa Diretora custam cerca de R$ 500 milhões por ano. O plano de saúde teve despesas de R$ 11,5 milhões no ano passado. A aposentadoria especial custa R$ 23 milhões por ano aos cofres públicos. O senador Reguffe afirma que a dispensa de todos os privilégios e regalias implica numa economia de R$ 16 milhões em oito anos de mandato para cada senador – ou R$ 1,3 bilhão para toda a casa.

A senadora Leila Barros (PSB-DF), tira selfie com participantes.Foto: Geraldo Magela/Agência SenadoSenadora Leila Barros (PSB-DF) não usou nada da verba do cotão a que tem direito. (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

Regalias, mordomias e alguns excessos

Todos os senadores econômicos afirmam que é possível fazer um bom mandato com pouco dinheiro, ao contrário do que pensam muitos de seus colegas. “Não tenha dúvida de que é possível. Todo senador tem direito a uma vasta estrutura. Se for feita uma estrutura eficiente, com pé no chão, dá para conseguir uma grande economia para o contribuinte. Os custos do Senado são de R$ 4,5 bilhões [por ano]. É uma máquina muito pesada. E cada senador tem direito a regalias, mordomias e alguns excessos”, afirmou o estreante Girão, empresário e ex-presidente do Fortaleza, o clube de futebol (assista à entrevista abaixo).

Kajuru dispensa a modéstia e sustenta que é possível: “Claro que é. Eu não tenho nenhum centavo e, modéstia à parte, faço um belo mandato. Sou o senador com o maior número de projetos, 268. Participo de todas as comissões. Sou o primeiro a chegar e o último a sair todo dia. Sou o único a usar a tribuna todo dia. Eu trabalho pra caramba. Não me faz falta nenhum desses benefícios que o Senado oferece”.

Vanderlan explica como faz para tocar o gabinete com pouco dinheiro. “Procuro usar o estritamente necessário. Muitos deles são gastos desnecessários”. Ele conta como faz os seus deslocamentos. “Venho de Goiânia em veículo próprio, de avião, é muito próximo. Carro especial com motorista, dispensamos desde o primeiro dia. Propaganda? Hoje em dia, as redes sociais divulgam melhor do que qualquer outra coisa. Nós usamos as redes”. Ele participa do regime geral da Previdência. “É como vai ser para todos depois da reforma, não quero privilégio de forma nenhuma”.

Sem mordomias

Girão relata as suas economias: “por exemplo, carro oficial, nós consideramos que não tem necessidade. Hoje em dia, temos aplicativos, táxi. E o salário do senador é bom, pode alugar um carro. Nós também abrimos mão do plano de saúde, que é vitalício para senadores e dependentes, abrimos mão de imóvel funcional e do auxílio-moradia. Aposentadoria especial também”.

Kajuru fala da economia com deslocamento e viagens: “Venho de carro, uma hora e quarenta. Por que eu iria gastar passagem aérea? Tem senador de Goiás aqui que foi para Barcelona, Espanha. ‘Ah, mas senador tem que ir para representar o Senado’. Eu não vou representar o Senado b... nenhuma. Eu tenho que representar é o povo de Goiás, o povo do Brasil, trabalhando aqui todo dia”.

Senador Jorge Kajuru (PSB-GO). Foto: Marcos Oliveira/Agência SenadoJorge Kajuru (PSB-GO) dá um chute na modéstia: "não gasto nenhum centavo e faço um belo mandato". (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

Ele também abriu mão do plano de saúde e de 50% do salário de R$ 33,7 mil. “Sou o único que abre mão, registrado em cartório. Destino a instituições sérias em Goiás. Aqui, gente morre de rir todo dia. Tem um senador que gastou R$ 5,8 mil com correios em maio, num mundo de hoje que é digital. Isso é um desrespeito ao dinheiro público. Eu vou gastar dinheiro com consultoria? Estão brincando comigo. Plano de saúde, eu pago do meu bolso”.

As exceções de cada um

Girão gastou apenas com passagens aéreas até Fortaleza, R$ 7,2 mil até agora. “A cada 15 dias, vou para o estado. Passo de sexta a segunda visitando a capital e interior. Vou de carro próprio. Aqui em Brasília é um pouco ilha da fantasia. Você tem que estar em contato com o povo para não perder essa sensibilidade. Optei por morar em Brasília porque tenho consciência das minhas limitações. Estou me dedicando de segunda a sexta aqui”.

Kajuru gastou R$ 8,5 mil com escritório nos dois primeiros meses: “Isso eu combinei, nos dois primeiros meses, como sou obrigado a ter um escritório político, eu faria uma despesa pequena, para pagar o aluguel, IPTU, água, energia, e no terceiro mês eu já não gastaria nenhum centavo. Eu consegui uma coisa que nunca aconteceu no Brasil, compartilhei o meu escritório com um deputado federal e uma vereadora, combinando que eles pagassem as despesas. Eu agora não gasto nenhum centavo”.

Vanderlan gastou R$ 2 mil com divulgação, R$ 2 mil com material da consumo e R$ 5,7 mil com escritório de apoio. No segundo semestre, vai distribuir livros para bibliotecas e estudantes com recursos do Senado. Ele também mora em apartamento funcional. “Gosto de almoçar em casa, coisa simples. Trouxe até a minha cozinheira”, afirma o empresário goiano (assista à entrevista abaixo).

“Isso vai resolver?”

Os senadores “sem mordomias” também são econômicos nas contratações. Reguffe tem apenas oito assessores no seu gabinete. Girão contratou 15 e Kajuru conta com 25. Os mais fartos são os de Leila (35) e Vanderlan (36). O gabinete mais lotado do Senado, de Izalci Lucas (PSDB-DF), já tem 84 assessores.

Procurada pela reportagem, a senadora Leila não quis se manifestar. Girão afirma que todas essas economias são importantes, mas sabe que não resolvem tudo. “Nós podemos fazer uma economia forte. Eu fico feliz de estar colaborando. Isso vai resolver o problema do Brasil? Não vai, tenho consciência que não vai. Mas o papel do líder é, também, dar o exemplo do que pode fazer para economizar”.

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