O Supremo Tribunal Federal (STF) completou três anos sem prestar contas ao Tribunal de Contas da União (TCU). E não faltaram indícios de irregularidades na última prestação de contas ao tribunal, relativas a 2019. Foram apontadas falhas nas contratações por dispensa de licitação e vícios na concessão de diárias e passagens. Nas áreas de ouvidoria e de acesso à informação, auditoria interna do tribunal identificou “riscos à imagem do STF perante à sociedade”, decorrentes de “divulgação de informações imprecisas, na forma e no conteúdo”. Mas o TCU aprovou as contas.
O blog vem apontando há anos a falta de transparência na compra de passagens para os ministros, sem a indicação do destino nem o motivo da viagem. Neste ano, surgiram os voos secretos dos ministros do STF em jatinhos da FAB, em viagens para casa nos finais de semana. Até outubro, foram realizadas 54 viagens, ao custo de R$ 800 mil. Em 40 voos, o ministro era o único passageiro. Os ministros alegam questão de segurança para solicitar a mordomia.
De 2003 a 2014, o STF teve julgamentos de contas pelo TCU, com quitação plena. Em 2015, não houve julgamento de contas do Supremo. Em 2016 e 2017, retornaram os julgamentos, com quitação plena. Em 2018, o STF não teve suas contas julgadas pelo TCU. O último ano em que houve julgamento foi 2019. Os órgãos públicos que terão contas julgadas em cada ano são definidos conforme critérios estabelecidos nas normas aprovadas pelo TCU.
Sem intervenção do TCU
Em relação à prestação de contas de 2019, na gestão do presidente Dias Toffoli, auditoria interna avaliou os serviços de ouvidoria e de atendimento à Lei de Acesso à Informação (LAI). Foi observado o risco à imagem do STF “decorrentes de divulgação de informações imprecisas”, e “risco à efetiva participação do cidadão”, por inadequação do portal do STF e do formulário eletrônico para suas manifestações e solicitações.
Foram apontados ainda ausência de canal para atendimento das manifestações e solicitações de autoridades, servidores e colaboradores e divulgação inadequada dos dados estatísticos produzidos pela Central do Cidadão. Diante dessas constatações foram propostas a criação da função de ouvidor, a implementação de uma ouvidoria interna e o aperfeiçoamento do portal do STF. Mas o Acórdão 9764/2021 concluiu que, uma vez que as medidas propostas seguiriam sendo monitoradas pela auditoria interna, “não se vislumbra necessidade de intervenção do TCU”.
Diárias e passagens
O TCU avaliou também a qualidade dos controles internos relacionados à atividade de compras e contratações por dispensa de licitação. Na fiscalização das dispensas realizadas de janeiro de 2018 a dezembro de 2019, auditoria interna detectou deficiência quanto à comprovação dos requisitos exigidos pela hipótese legal de dispensa de licitação, deficiência na justificativa do preço a ser contratado mediante dispensa de licitação e descumprimento de cláusula contratual por parte da contratada. Mas a auditoria ainda estava em andamento. Assim, o tribunal TCU entendeu que não havia “nenhuma ação do TCU” que devesse ser implementada.
Na avaliação dos controles internos da concessão de passagens e diárias, a auditoria interna baseou-se em monitoramento de auditoria realizada em 2017, em que foram identificados diversos achados. Do total de recomendações expedidas, 34 foram implementadas, o que representa 79% de efetivação das ações propostas pela auditoria interna.
Mas o TCU registrou que, "apesar da permanência de vícios relatados, que inviabilizam a eficácia dos controles internos de gestão, as melhorias operacionais implementadas pela Administração proporcionaram maior eficiência ao processo de concessão de passagens e diárias". Assim, mais uma vez, o tribunal registrou que “não se mostra necessário intervenção do TCU”.
Viagens com cônjuge
Na prestação de contas referente ao exercício de 2017, ocorrida em outubro de 2019, foram avaliados os controles internos relativos à concessão de passagens e diárias, com base em auditoria realizada no exercício de 2016/2017. Foram apuradas deficiências na concessão de benefício sem base legal apropriada (“Cota Mensal”) e concessão de passagens para uso não vinculado ao objeto de serviço.
As causas das deficiências teriam sido a ausência de critérios e definição de procedimentos no processo de concessão de passagens e diárias e as inadequações contidas na Resolução-STF 545/2015. O art. 20 dessa resolução previa, nas viagens ao exterior, a seguinte categoria de transporte aéreo: “primeira classe: ministro e respectivo cônjuge ou companheiro (a), quando indispensável sua presença, nos afastamentos para representação do tribunal em eventos de caráter protocolar ou cerimonial no exterior”.
Decisão do TCU em 2019 registra a compra de bilhetes para esposas de cinco ministros para o exterior, na 1ª classe, de 2009 a 2012, num valor total de R$ 1 milhão (em valores atualizados).
A Secretaria de Controle Externo de Administração concluiu que a emissão de passagens aéreas internacionais para cônjuges ou companheiros de ministros do STF, apesar de prevista no regimento interno da corte, não encontrava amparo em leis e normas que regem a representação ou cerimonial no exterior. “Não tem fundamento legal a realização de despesas de viagens por pessoas não vinculadas à administração pública, na medida em que não exercem qualquer atividade relacionada ao interesse do serviço e, consequentemente, que tenha como objetivo o interesse público”, registra o Acórdão 1794/2019.
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