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As viagens secretas dos ministros do Supremo Tribunal Federal – um legado da administração do ministro Dias Toffoli no STF – custaram R$ 850 mil no ano passado. Só os voos dos seguranças e assessores que acompanham os ministros – sem informação do trecho, data e motivo – somaram R$ 553 mil. Houve um aumento de gastos de 36% em relação ao ano anterior, quando eram informados pelo menos a data e o trecho percorrido.
Nos voos de representação institucional dos próprios ministros, que custaram mais R$ 313 mil, não há detalhamento algum. O tribunal informa apenas o valor total gasto por ministro a cada mês. Quem mais gastou foram os ministros Alexandre de Moraes (R$ 57 mil), Luiz Fux (R$ 55 mil), Luís Roberto Barroso (R$ 54 mil) e Ricardo Lewandowski (R$ 53,7 mil).
A ministra Rosa Weber fez as menores despesas, apenas R$ 18 mil. Não há registros de voos institucionais dos ministros Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Carmen Lúcia e Dias Toffoli. Cada ministro conta com a “Cota Anual” de R$ 60 mil para essas despesas. O saldo individual ao final de cada exercício é extinto, não podendo ser aproveitado no ano seguinte.
A regulamentação do Supremo sobre concessão de passagens e diárias não diz exatamente o que significa voo de “representação institucional”. E faz uma única restrição nesses deslocamentos: não podem ser utilizados para a “realização exclusiva de atividade remunerada”. Nos voos institucionais, os ministros também não podem receber diárias. Em anos anteriores, quando havia maior transparência, alguns ministros viajavam para seus estados de origem.
Voos de seguranças e assessores custam mais
Em consequência de constrangimentos e até ameaças a ministros e seus familiares, conforme comprovou inquérito aberto pelo próprio tribunal, o Supremo deixou de divulgar os detalhes das viagens dos ministros, como data, horário, trecho e o preço de cada passagem. Divulga apenas o total de despesas por ministro ao mês, no caso das viagens “institucionais”. A pressão sobre os ministros continua. No momento de maior tensão no STF, grupos de bolsonaristas de extrema-direita lançaram fogos de artifício sobre o prédio tribunal, em 14 de junho deste ano.
Mas as maiores despesas com passagens são feitas por seguranças e assessores que acompanham os ministros. Também não há transparência nesses voos. Na coluna que informa “motivo da viagem” consta apenas a prestação de serviço de “assessoria” ou “segurança” ao ministro. Mas não é informado o motivo da viagem do ministro. Também não são informados a data e o trecho do deslocamento dos seguranças e assessores, o que permitiria a identificação da atividade do magistrado. Até 2018, eram informados pelo menos a data e o trecho desses deslocamentos.
Nas viagens feitas por assessores e seguranças de 2019, as maiores despesas do ano passado foram feitas pelo gabinete da Presidência do STF ou de órgãos de direção ligados à Presidência, como diretoria-geral, secretaria-geral ou cerimonial, mas sempre na “prestação de serviço ao ministro” – no caso, o presidente Dias Toffoli. Foram gastos R$ 90 mil com passagens de seguranças, assessores e dirigentes da casa.
Foram registradas 18 viagens para serviços de segurança e assessoria, no valor total de R$ 94 mil, em atendimento ao gabinete do ministro Luiz Fux – presidente recém empossado do Supremo. Mais 11 viagens, no valor de R$ 71,4 mil, para atender ao gabinete do ministro Lewandowski; 18 viagens, no valor de R$ 48 mil, para atender Gilmar Mendes; e 7 viagens, no valor de R$ 8,4 mil, para Edson Fachin.
O custo das viagens de assessores e seguranças é ainda maior por conta das diárias pagas pelo tribunal. Mas o cálculo dessa despesa é impreciso porque o tribunal divulga os dados em duas planilhas distintas, uma com o valor das passagens e outra com o valor das diárias de cada servidor por mês. E alguns servidores executam outras tarefas além de assessorar ou fazer a segurança dos ministros.
Viagens internacionais do STF
O blog comparou os gastos de 2019 com os de 2018 porque 2020 está sendo um ano atípico, em consequência da pandemia da Covid-19. Neste ano, até julho, foram gastos R$ 289 mil com passagens de seguranças e assessores, sendo R$ 103 mil em “viagens secretas”. No ano passado, foram R$ 2 milhões, com R$ 553 mil em voos secretos. Em 2018, as despesas somaram R$ 1,07 milhão, sendo R$ 407, em viagens com informações restritas.
Apesar de todas as restrições, pelo menos foram divulgadas em detalhes as viagens internacionais, justamente as mais caras. Como exemplo, a passagem do ministro Dias Toffoli para São Petesburgo (Rússia), em maio de 2018, custou R$ 48 mil. O voo para a Comissão de Veneza, em outubro do mesmo ano, ficou por R$ 41,5 mil. Os ministros têm direito a bilhete de primeira classe.
Mas houve ainda as despesas do assessor de Assuntos Internacionais Fábio Marzano e do juiz Márcio Boscaro, que acompanharam Toffoli nos dois eventos. Mais R$ 100 mil com passagens e R$ 125 mil em diárias, incluindo as do ministro. A conta das duas missões fechou em R$ 315 mil. O ministro esteve ainda na cerimônia de canonização da Irmã Dulce, no Vaticano, em outubro de 2019, com outros dois assessores. Mais R$ 82 mil em passagens e diárias.
“Pagamentos ilegais” de passagens
No julgamento das contas do STF relativas ao exercício de 2017, como revelou o blog, o TCU relatou que auditoria interna do próprio tribunal apurou a concessão de passagens para uso não vinculado ao objeto de serviço dentro da “Cota Anual”. Os ministros não podem usar a cota em viagens para proferir palestras pagas, dar aulas ou comprar passagens para esposas e parentes, por exemplo.
O Controle Interno do STF alertou os riscos decorrentes de pagamentos indevidos das cotas anual e mensal, em decorrência da infringência de leis e da não observância de princípios constitucionais como interesse público, legalidade, impessoalidade e moralidade. Citou ainda: “Risco à imagem do STF e do Judiciário, em virtude da manutenção de pagamentos ilegais e que violam o interesse público”.
Em decisão anterior, em julho de 2019, o TCU já havia determinou ao STF a publicação, na sua página na internet, de informações sobre concessão de passagens aéreas aos respectivos ministros, incluindo aquelas custeadas por meio de cotas de representação institucional, em atendimento à Lei de Acesso à Informação. Mas a decisão do TCU recomendou a publicação de “extrato de despesas mensais por autoridade” – uma medida que não resulta na transparência desses gastos públicos.