Brasília tem suas ilhas de fartura, como o Congresso Nacional e os Tribunais de Justiça. Mas há outras menos conhecidas. Entidade de direito privado, mas controlada pelo governo federal, a Agência de Promoção de Exportações (Apex), tem salário até 73% acima da remuneração do presidente da República. É o caso do presidente da agência, que recebe R$ 53,5 mil. E há vários outros supersalários na Apex.
Os diretores de Gestão Corporativa e de Negócios têm salário de R$ 46 mil. Os 21 gerentes têm renda média de 32,5 mil, com o teto de R$ 35,7 mil – ainda acima dos salários do presidente da República e dos ministros de Estado. Logo abaixo estão as 38 coordenações, com renda média R$ 23,5 mil e o limite máximo de R$ 25,6 mil. É um cargo para cada seis funcionários.
Mas há ainda mais cargos muito bem remunerados. O salário dos assessores da presidência da Apex pode chegar a R$ 27,8 mil. Um assessor de gerente ganha até R$ 18 mil. A secretária-executiva, até R$ 9,5 mil. Os analistas do nível mais elevado recebem salários de R$ 17,5 mil a R$ 25,7 mil. Ao todo, são 375 funcionários, com um custo anual de R$ 46,8 milhões. As receitas da agência chegam a R$ 534 milhões – 96% originadas de contribuições sociais.
Há ainda plano de saúde e diárias. Nas viagens a trabalho, os empregados recebem uma verba diária, com natureza indenizatória, para compensar horas extras cumpridas. Além dessa verba, também serão considerados como forma de compensar essas horas extras os dias de descanso que antecedem e sucedem o início desses eventos.
Salário dolarizado no exterior
No exterior, a fartura é ainda maior. Na classe mais elevada – principal officer – dos empregados dos escritórios da Apex no exterior, o salário base varia de US$ 8,4 mil a UR$ 9,6 mil – ou seja, de R$ 43 mil a R$ 49 mil. O pagamento é feito na moeda oficial do país onde a unidade está localizada, mas, para efeito referencial na tabela salarial, os valores são transformados em dólar americano. A Apex mantém hoje escritórios em Bruxelas, Moscou, Pequim, Xangai, Dubai, Miami e Bogotá.
O objetivo da agência é promover as exportações, a internacionalização das empresas brasileiras e atrair investimentos estrangeiros para setores estratégicos da economia brasileira. Apoia a participação de empresas brasileiras em grandes feiras internacionais e visitas de compradores estrangeiros.
Privada ou Pública?
Os salários da Apex acima do teto constitucionais são legais porque se trata de uma empresa de direito privado. Mas é sem fins lucrativos e de utilidade pública, mantida por contribuições sociais feitas por empresas. A ligação da agência com o governo federal é umbilical. Medida provisória do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva autorizou o Poder Executivo a criar a Apex, em 2003. A agência foi instituída no mesmo ano pelo Decreto 4.584/2003.
O presidente da empresa é nomeado pelo presidente da República. O Conselho Deliberativo, composto por cinco representantes do Poder Executivo e quatro de entidades privadas, é presidido pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. O Executivo define o contrato de gestão que estipula as metas, os objetivos e os prazos para sua execução. Também aprova anualmente o orçamento da Apex. A agência é fiscalizada ainda pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que faz auditorias nas contas da União.
Mas de onde vem os recursos financeiros da Apex? Para atender à execução das políticas de apoio às micro e pequenas empresas, promoção de exportações e de turismo e desenvolvimento industrial, a Lei 8.029/90 instituiu um adicional às alíquotas das contribuições sociais relativas às seguintes entidades: Senai, Senac, Sesi e Sesc.
Esse adicional é arrecadado e repassado mensalmente pela administração pública federal à Apex, ao Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), à Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e à Agência Brasileira de Promoção do Turismo (Embratur).
Herança política e militares no comando
Com tantas ligações com o Executivo, a Apex assimilou práticas próprias da política, como nomeações sem critérios técnicos. No início do governo Jair Bolsonaro, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, teve forte influência no preenchimento dos cargos da cúpula da agência. Em junho deste ano, a agência entrou na mira de partidos do Centrão, bloco conservador que tem recebido cargos do governo federal em troca de apoio no Congresso Nacional.
Após sucessivas crises no comando da Apex no início do governo, chamaram um militar para a presidência da agência. Sérgio Ricardo Segovia, contra-almirante na Marinha, tem escassa experiência em comércio exterior. Segundo a Apex, nessa área, “foi responsável pelos processos de logística e de aquisição internacional, quando encarregado do grupo de recebimento de navio no estrangeiro”.
O currículo destaca a sua experiência profissional na área militar. Atuou em operações militares e logística, em segurança marítima, navegação a operações marítimas. O Ministério das Relações Exteriores acrescentou que Segovia graduou-se em Ciências Navais com habilitação em Eletrônica, fez aperfeiçoamento em Eletrônica e mestrado em Ciências Navais, pela Escola de Guerra Naval. Enfim, um ótimo currículo para um militar.
O diretor de Gestão Corporativa, Ederaldo Teixeira de Abreu Filho, também é militar – um vice-almirante da reserva da Marinha. Comandou Rádio Marinha em Brasília e o Navio de Desembarque Doca Ceará. No exterior, serviu na Comissão Naval na Europa, onde trabalhou com contratos e licitações. Tem mestrado e doutorado em Ciências Navais.
O diretor de Negócios, Augusto Pestana é graduado em Direito. Diplomata, concluiu no Instituto Rio Branco cursos com tese sobre cooperação internacional em energia, ciência e tecnologia. Serviu nas Embaixadas do Brasil na Nova Zelândia, no Japão e na Alemanha. É autor da obra “ITER: o Brasil e os rumos da energia de fusão”.
O blog questionou a Apex se a formação e experiência de Sérgio Segovia o capacitam ao cargo de presidente da Apex. Perguntou ainda qual a experiência dele e de seus diretores em comércio exterior. Não houve resposta.
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