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Nove suplentes de senadores assumiram o mandato de titulares que entraram de licença no período da campanha eleitoral. Oito deles já receberam o “auxílio mudança”, no valor de R$ 33,7 mil – embora fiquem apenas quatro meses no cargo. São 56 Auxílios-Brasil. E receberão ainda o “auxílio” de fim de mandato, no mesmo valor. Guaracy Silveira (Avante-TO) assumiu a vaga de Kátia Abreu (PP) e recebeu gabinete com 94 assessores e folha mensal de R$ 446 mil. Ela se licenciou para fazer a campanha pela reeleição.
Metade dos assessores do gabinete montado por Kátia exercem o cargo de menor salário (R$ 2,2 mil) – ajudante parlamentar júnior. Bispo da Igreja do Evangelho Quadrangular, Guaracy afirmou ao blog na terça-feira (9) que havia tomado posse no dia anterior e não tinha informações sobre os assessores. Mas assegurou: “Não contratei ninguém”. Hoje (11), apareceu mais um assessor no quadro de pessoal: o subchefe de gabinete, com salário de R$ 44 mil (com o abono permanência). A folha de pagamento foi para R$ 490 mil. Kátia tinha 47 servidores em agosto de 2019, 57 em agosto de 2020 e 80 em agosto do ano passado. Quanto mais próximo da eleição, mais assessores.
Guaracy já havia recebido o “auxílio mudança” de “início de mandato” em novembro de 2018, quando assumiu pela primeira vez o cargo de senador, por apenas três meses. Deixou o Senado em janeiro. No mês seguinte, recebeu o auxílio de “fim de mandato” – mais R$ 33,7 mil. Esses auxílios são pagos apenas uma vez no mandato.
Outro suplente de Tocantins, Ogari Pacheco (União), assumiu o mandato de Eduardo Gomes (PL), líder do governo Bolsonaro no Congresso. Ogari recebeu o seu “auxílio mudança” em julho. Naquele mês, a Pela Polícia Federal revelou mensagens que tratam de supostos pagamentos feitos a Gomes por empresários do seu estado.
Mudança não há
Oficialmente chamado de “ajuda de custo”, o auxílio é pago supostamente para custear a mudança e o transporte do parlamentar no início e no final do mandato. Mas a verdade é que não há mudança. Mesmo os deputados e senadores que cumprem quatro anos de mandato moram em apartamentos funcionais, entregues mobiliados; ou em hotéis, com hospedagem paga com o auxílio-moradia.
A suplente Margareth Buzetti (PP-MT) assumiu a vaga de Carlos Fávaro (PSD-MT). Em junho, recebeu R$ 27 mil de salário, R$ 2,8 mil de antecipação do 13º salário e R$ 33,7 mil de “auxílio mudança”. Em julho, recebeu salário integral mais R$ 4,9 mil de auxílio-moradia.
Rafael Tenório (MDB-AL) assumiu o mandato de Renan Calheiros (MDB). Em junho, levou R$ 32 mil de salário, a ajuda de custo e R$ 2,8 mil de 13º. Em julho, contou ainda com R$ 5,5 mil de auxílio-moradia. Dra. Eudócia (PSB-AL) entrou na vaga de Rodrigo Cunha (União), que se licenciou para disputar o governo de Alagoas. Eudócia recebeu o “auxílio mudança” em maio. No mês seguinte, já levou a antecipação do 13º.
Suplente de Márcio Bittar (MDB-AC), Eduardo Velloso (União) tomou posse em junho e recebeu salário integral, ajuda de início de mandato, R$ 2,8 mil de 13º salário e R$ 3,7 mil de auxílio-moradia. Em julho, recebeu mais um auxílio-moradia. Maria das Vitórias (PSD-AC) assumiu a vaga de Sérgio Petecão (PSD) em julho e já recebeu o “auxílio mudança”.
No Maranhão, Roberth Bringel (União) entrou na vaga de Weverton Rocha (PDT), que foi oficializado no final de julho como candidato a governador. O suplente levou salário proporcional de R$ 28 mil em julho mais a ajuda de início de mandato.
Ajuda de custo e beijo na boca
Luiz Pastore (MDB-ES) ocupa a vaga de Rose de Freitas (MDB ) desde 7 de julho. Ele já havia assumido o mandato em 2019. Em novembro daquele ano, recebeu a ajuda de custo de início de mandato. Em março de 2020, a ajuda de fim de mandato. Não que ele precisasse de uma ajuda. Nas eleições de 2014, a empresa Ibrame Indústria de Metais, da qual é sócio, doou R$ 1,14 milhão para a campanha de Rose de Freitas.
Pastore é um filantropo. Em leilão beneficente ocorrido em abril de 2013, comprou uma garrafa de champanhe Moët Chandon Impérial foleada por U$ 50 mil. O arremate deu direito a um beijo na boca da modelo inglesa Kate Moss, usufruído no próprio local.
Há ainda os suplentes que se tornaram titulares em consequência da morte ou afastamento definitivo dos titulares. Nilda Gondin (MDB-PB) assumiu a vaga do senador José Maranhão (MDB), morto pela Covid-19 em fevereiro do ano passado. Carlos Portinho (PL-RJ) ocupou a vaga de Arolde Oliveira (PSD), que também foi vítima da pandemia, em novembro de 2020. Alexandre Silveira (PSD-MG) entrou na vaga de Anastasia, indicado pelo Senado para o cargo de ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) em fevereiro deste ano.
Hilux, Amarok, restaurantes sofisticados
Os suplentes no exercício do mandato têm feito as suas despesas. Dra. Eudócia tomou posse em maio e contratou a empresa de Consultoria e Planejamento de Marketing por R$ 12,5 mil. Gastou mais R$ 4 mil com a produção de peças de comunicação digital. Em junho, torrou mais R$ 8 mil com consultoria em comunicação digital.
Rafael Tenório investiu em outras áreas. Nos dias 8 e 21 de junho, gastou R$ 654 e R$ 553 em dois almoços no restaurante Coco Bambu – um dos preferidos nos parlamentares. O equivalente a dois “Auxílios-Brasil”. No dia 21, foram consumidos meio Camarão Internacional, Carne de Sol Maranhão, Cocada ao Forno e O Melhor Pudim. Naquele mês, ele também alugou uma caminhonete Hilux por R$ 10 mil.
Margateth Buzetti pagou R$ 8,5 mil pelo aluguel de uma Amarok mais 3,7 mil de óleo diesel. Gastou ainda R$ 8,8 mil com aluguel de imóveis e R$ 6,8 mil com material de consumo. No total, já gastou R$ 58 mil da “cota para o exercício do mandado”.
“Atendimento não pode ser interrompido”
O senador Guaracy afirmou ao blog, por meio de nota oficial, que “o atendimento aos tocantinenses é contínuo e não pode, em hipótese alguma, ser interrompido. As ações do mandato parlamentar que me foi confiado seguem em curso e estão sendo cumpridas. As necessidades das pessoas só cessam quando elas são auxiliadas e orientadas para trilhar o caminho das soluções”.
Ele justificou a contratação doa assessores: “Os políticos ampliam a ação dos seus mandatos com a necessária atuação dos assessores no Estado, aumentando a capacidade de ação social. A política não existe para atender apenas os satisfeitos, mas, sobretudo, para acudir os aflitos”.
E assegurou que tudo foi feito dentro da lei. “Todos os assessores são contratados de forma rigorosamente legal, dentro das regras estabelecidas pelo Senado Federal. O valor total das contratações é o mesmo para os 81 senadores, cabendo a cada parlamentar a decisão sobre o montante salarial e o número de auxiliares”.
O blog fez contatos com assessores da senadora licenciada Kátia Abreu, a partir de informações do gabinete do senador Guaracy, e solicitou esclarecimentos sobre a necessidade da contratação de 96 assessores. Não houve resposta.
Questionado pelo blog, o Senado informou todos os benefícios disponibilizados aos suplentes: ajuda de custo de R$ 33.763 no início e no final do mandato para as despesas com mudança e transporte, apenas na primeira convocação durante o mandato do titular; subsídio parlamentar proporcional aos dias em que exerceu o mandato; estrutura administrativa (gabinete, servidores efetivos e comissionados), que pode ser alterada pelo novo titular; carro oficial; Plano de Saúde enquanto estiver no exercício do mandato; auxílio-moradia ou residência oficial; Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar dos Senadores; e passaporte diplomático.