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O Palácio do Itamaraty estava em festa. Uma gente que se acha cívica, digna, merecedora de toda a honra, de todo o mérito se abraçava, sorria, festejava, festejava-se. Sorrisos, risos, poses para fotos, gargalhadas, abraços animados. Faixas no peito, o colar da Ordem de Rio Branco no pescoço, a cruz de quatro braços e oito pontas...
A menos de nove quilômetros do Palácio, a cruz representava a morte. No Instituto Médico-Legal do Distrito Federal, parentes e amigos de Cleriston Pereira da Cunha, que morreu na Penitenciária da Papuda, aguardavam a liberação de seu corpo. Tristeza, lágrimas, pranto, choro convulsivo, abraços verdadeiros.
Na medalha entregue aos ministros do STF Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin, ao ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, ao senador Randolfe Rodrigues e até para Janja, está escrito em latim: “Em qualquer lugar, terei sempre a Pátria em minha lembrança”...
Nos palácios de Brasília, é assim: há um supremo desprezo por algumas vidas. E há um país morto, clamando por ressuscitação
No Palácio, a comemoração malévola, aplausos enfadonhos... E o corpo de Cleriston chegava ao velório, caixão coberto pela bandeira do Brasil. Aplausos verdadeiros, a pátria verdadeira, o luto por ela, por Cleriston. Os olhares parecendo perdidos, mas voltados, todos, ao inescapável: a busca por justiça.
Há muita gente a ser salva, mesmo que o Palácio abrigue carrascos, mesmo que o salão enfeitado seja tomado por aplausos para o abuso, o arbítrio, a ilegalidade, a injustiça, a tortura, até o último suspiro dos encurralados. Nos palácios de Brasília, é assim: há um supremo desprezo por algumas vidas. E há um país morto, clamando por ressuscitação.
A culpa é dos condecorados de agora e de amanhã, numa lista que ainda inclui o general Gustavo Dutra, que cercou os manifestantes em frente ao QG de Brasília, fingindo que os protegia, e, no dia seguinte, prendeu todo mundo; André Mendonça, que negou habeas corpus a Cleriston em maio; a OAB, que fez questão de não ver o cerceamento da defesa; Flávio Dino e Rodrigo Pacheco (como esquecê-los?); as ONGs de “direitos humanos” e a imprensa, essa que estimulou as perseguições e agora ignora a morte de Cleriston.
Há palácios repletos de gente sem medo, ou que finge que não tem medo de nada, que tenta engendrar bravura. É uma gente covarde, farsante, infiel, em adulação permanente entre si. Sua comemoração, na festa dos culpados, é o prenúncio de sua derrota. Os bravos de verdade, se choram, sabem, mais do que nunca, a força que têm, e não se entregam. A coragem será sempre deles, e de sua dor virá a vitória.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos