A economia do Brasil está numa enrascada tão grande que mesmo a assessoria de imprensa do governo federal teve de admitir que a situação é muito, mas muito delicada. Se o jornalismo que deixou de ser jornalismo continua acreditando em tudo o que a maioria dos ministros do STF diz, em relação ao governo já não é bem assim. Ficou impraticável confiar em qualquer informação que vem do Executivo federal. E a imprensa volta ao seu papel, ainda que discretamente, resolve que não é tão feio assim perguntar, desconfiar, ser curioso. Aparentemente, nem todas as narrativas lançadas pelo Brasil do PT serão propagadas mais com submissão e felicidade. Se Lula e sua turma afirmam, já não é mais fato, conteúdo inquestionável. O mundo real tenta se restabelecer em veículos que deveriam ser os primeiros a zelar por ele, e nunca poderiam ter desistido disso.
Então, se o governo do PT não se sentir obrigado a fazer o certo na economia, não será por falta de aviso... A Veja estampou matéria de José Casado cujo título é: “Banco Central adverte: era crise, agora é emergência econômica”. O subtítulo é o seguinte: “Juros de Lula foram equiparados aos da crise de Dilma; é previsível maior corrosão no poder de compra dos mais pobres”. A Folha publicou editorial: “BC faz o que é preciso, mas sozinho não impedirá crise”. E o texto vai assim: “Choque de juros mostra disposição de enfrentar turbulência financeira e buscar a meta de inflação após troca de comando. Sem ajuda da política de Lula, no entanto, custos fiscais e sociais serão crescentes. Fato é que nada afastará o risco de uma crise econômica enquanto o governo não conseguir restabelecer a confiança em suas contas”. E teve outro editorial no Estadão: “A pancada do Banco Central – ao elevar os juros em um ponto, o BC fez sua parte para tentar conter as expectativas do mercado e cumprir sua missão, que é segurar a inflação. Falta o governo fazer a parte dele”.
A economia do Brasil está numa enrascada tão grande que mesmo a assessoria de imprensa do governo federal teve de admitir que a situação é muito, mas muito delicada
Infelizmente, a redenção, mesmo que apenas na área econômica, ainda não veio para toda a imprensa. Há ainda os que não se importam em incorporar um prefixo separado apenas por hífen daquilo que já foi sua profissão. Os ex-jornalistas em atividade se especializaram em voltas, volteios, piruetas, malabarismos... Usei eufemismos talvez por delicadeza a pessoas com as quais trabalhei por alguns anos. O correto seria apontar-lhes o dedo e dizer: “desonestos, mentirosos”, ou coisa pior. A comentarista da Globo News Flávia Oliveira, por exemplo, acusou o Banco Central de querer produzir uma recessão no Brasil. Com que desfaçatez alguém omite que a decisão do BC de aumentar os juros em um ponto percentual foi unânime e que quase metade dos diretores do BC foi indicada por Lula? Dessa forma, não ficou claro para mim quem está querendo verdadeiramente destruir o Brasil...
Miriam Leitão não deve ter se sentido tão à vontade para usar de novo a historinha do “veja como isso é bom”. Agora, ela mudou para “não está tão ruim assim”. Em artigo n’O Globo, ela afirmou que o Banco Central “aplica tratamento de choque em momento que é difícil, mas não apocalíptico”. Miriam destaca que o déficit fiscal em 2024 será metade do projetado pelo mercado: “Para se ter uma ideia, o país no ano passado terminou com 2,4% do PIB de déficit primário, em parte pela herança do governo anterior. Para este ano, o mercado previa um déficit de R$ 90 bilhões a R$ 100 bilhões, e o país deve terminar o ano com um déficit de R$ 48 bilhões, 0,4% do PIB. Um número muito melhor do que o esperado. A receita está crescendo a 10% no acumulado até novembro”.
A memória seletiva da colunista d’O Globo a impediu de citar que no último ano do governo Bolsonaro houve superávit de mais de R$ 54 bilhões. Ela está no grupo que tratava a PEC da Gastança ou PEC Kamikaze de PEC da Transição, e que apoiou a troca do teto de gastos pela farsa do “arcabouço fiscal”. Lula não tem culpa de nada, ele sempre recebe uma “herança maldita”; foi assim também quando o petista sucedeu a Fernando Henrique Cardoso. Miriam ainda fez questão de não lembrar que o governo Lula tinha prometido déficit fiscal zero para este ano. Depois, disse que seria só no ano que vem. E todo mundo tem de acreditar que um déficit em torno de R$ 50 bilhões em 2024 é um ótimo resultado. Sobre a arrecadação de impostos em crescimento, fazemos o quê? Fingimos que esse resultado não se deve ao aumento da carga tributária?
Aliás, a reforma tributária foi aprovada no Senado, e ficou pior. A Câmara tinha fixado uma trava de 26,5% para o Imposto sobre Valor Agregado, base do novo sistema. No Senado, o texto mudou, e a alíquota pode alcançar 28,6%. Isso indica que os dados apresentados pela Confederação Nacional do Comércio na semana passada podem se agravar... O número de famílias brasileiras sem condições de pagar dívidas atrasadas chegou ao maior patamar já registrado no mês de novembro. Oito em cada dez famílias que ganham até três salários mínimos estão endividadas. E essa é apenas mais uma pesquisa. Minha coluna anterior já apresentou outros números bem preocupantes. Portanto, não dá para continuar acreditando em quem desistiu de fazer jornalismo e rebola para proteger as burradas do PT. Sim, o partido está se movimentando, mas para mudar a comunicação do governo, melhorar a propaganda enganosa, trabalhar com mais afinco suas narrativas e, com a ajuda de ex-jornalistas, jurar que está tudo bem.
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS