| Foto: Divulgação/Pixabay
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O que vem a ser um apetite metafísico? Trata-se de uma ideia central para compreensão da origem das religiões, de sua manutenção ao longo dos milhares de milênios da humanidade e, também, da sua pluralidade de manifestações históricas. Você já pensou que pode ter um apetite metafísico?

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Vejamos um exemplo bem contemporâneo e banal. Uma pessoa vegana é alguém cujo apetite metafísico é associar a alimentação – sei que a crença em questão vai além da alimentação, daí sua riqueza fenomenológica – a um processo de purificação da violência presente na relação com os animais.

O metafísico em questão aqui é a ideia de uma pureza corporal e física que é em si, na realidade, espiritual – vai além da matéria, logo, metafísica – porque a natureza material em si continua violenta, suja e destrutiva com ou sem restaurantes veganos, que aliás, como tudo mais, sumirão do universo quando a Terra acabar.

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O apetite metafísico é essa vontade, esse desejo, esse anseio humano de que alguma forma de realidade, ato ou poder ordenador seja maior do que a banalidade da realidade imediata. As religiões e muitas escolas filosóficas deram nome e organização a esse apetite metafísico de distintas formas. Hoje esse apetite tende a ter a consistência de um vídeo no TikTok. Mas, essa é outra história.

Podemos entendê-lo também como o anseio por um alimento imaterial ou espiritual. E aí as religiões deitam e rolam.

O apetite por uma vida após a morte ligado diretamente ao medo da morte é um caso. A farta literatura especializada em origem das religiões entende que a morte é, com certeza, um pilar das crenças religiosas. O medo, o temor, o desespero são afetos fundacionais das religiões.

Claro que não só. Algumas formas religiosas se alimentam de afetos como redenção, amor, justiça. Mas o medo da morte e seu mistério seguramente sustentaram e sustentam o apetite metafísico pela vida após a morte. No entanto, o modo de crer nessa vida após a morte varia histórica e geograficamente.

Populações da Antiguidade, há cerca de 5.000 anos, no Mediterrâneo e não só lá, acreditavam que os mortos continuavam vivos nos túmulos. Mortos não enterrados na própria casa e não alimentados pela própria família com comida e bebida – assim como hoje, entre nós, os praticantes de religiões afro-brasileiras o fazem para seus orixás – virariam demônios a atormentar a família dos vivos. Os mortos bem cuidados com rituais de comida e bebida se transformariam numa espécie de deuses que cuidariam das famílias dos vivos.

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A simples crença pré-histórica e ainda atual de que sonhos são portais para nos comunicarmos com deuses ou espíritos de mortos que nos passam mensagem é um exemplo claro do apetite metafísico por entes com poder que fazem por nós o que não podemos fazer nós mesmos.

Uma das formas mais constantes de apetite metafísico é a crença no poder de alguma forma de conhecimento profético. Ver o futuro. Seja este pensado no ambiente do alto paleolítico ou numa cartomante em São Paulo.

O conhecimento também pode aparecer como poder de cura sem ciência, apenas pela fé ou pela mágica. A crença de que a fé move montanhas – para além da ideia banal de que essa fé, na verdade, não passe de uma obsessão bem-sucedida da própria pessoa – também é um apetite metafísico por ter um poder que está presente na sua força de vontade e de que forças no universo conspirem a seu favor.

A ideia de que Deus seja amor é uma forma de apetite metafísico. Se o Criador me ama, há esperança, afinal. Mas, ao mesmo tempo, se carrego pedras ou metais na bolsa, participo do poder metafísico – alguém mal informado vai achar que nesse caso trata-se de energia, essa palavra usada para qualquer bobagem fora da física – que suponho existir nesses elementos que são resistentes e permanentes.

Enfim, um ser físico, frágil como nós, mortal, sempre tende a ter apetites metafísicos. Por isso, as religiões serão sempre indestrutíveis, mesmo as mais idiotas. E falando em idiotas, alguns chegam mesmo a depositar seu apetite metafísico na política.

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