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Luiz Felipe Pondé

Luiz Felipe Pondé

Pessimismo é mais chique

O problema do otimismo

(Foto: Gino Crescoli / Pixabay)

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Otimismo e pessimismo não são termos levados a sério pela filosofia. Apesar disso, esses termos são usados com frequência pelo senso comum. Fala-se que fulano é otimista ou que 2020 foi um ano pessimista. E as pessoas se entendem quando assim falam umas com as outras.

Em filosofia, o pessimismo costuma ser mais chique, assim como no senso comum. Otimistas riem demais, pensam de menos, se deixam levar por pouco conhecimento acerca do mundo.

É antiga a associação entre a melancolia e a ideia de que a pessoa melancólica seja mais profunda e mais inteligente. Esse fato é tão forte que mesmo a propaganda, quando quer dar densidade a um personagem, o faz contemplativo e com cara de conteúdo. E a propaganda é o braço armado da superficialidade, principalmente agora que ela decidiu salvar o mundo.

Quando os publicitários eram cínicos, eram mais inteligentes. Enquanto apenas fingiam crer no que vendiam, valia a pena conversar com eles. Agora que de fato creem no que vendem, é uma perda de tempo conversar com eles.

O pessimismo é ruim para os negócios. Quem consegue vender Schopenhauer para o mundo corporativo? Ou para uma escola à caça de alunos? Um empresário tem que ser otimista, senão quebra. Professores, intelectuais, psicanalistas, artistas podem se dar ao luxo de serem pessimistas. Poderíamos até dizer que se trata de um nicho de mercado.

O problema do otimista reside no fato de ele esconder, muitas vezes, o jogo. Sua vantagem competitiva está no fato de que ele nos dá esperança, e somos uma espécie triste desde a pré-história. E não faltam motivos para tal. Mas, se o pessimismo pode asfixiar, o otimismo, em largas doses, como hoje é praticado na sociedade em todos os níveis, facilmente nos deixa com ar de idiotas. A linguagem do otimismo é pobre semanticamente porque busca inspirar as pessoas em vez de fazê-las pensar. Não é à toa que iniciativas como TED Talks são verdadeiras raves de oportunistas querendo se vender.

Por outro lado, o pessimismo pode ser intragável. Mesmo Arthur Schopenhauer (1788-1860) sabia disso quando escreveu seu "Aforismos para Sabedoria de Vida" (ed. Martins Fontes). O pessimismo pode ser tóxico quando estamos de fato sofrendo muito.

Sua sabedoria é nos ensinar a buscar formas de viver menos iludidas com o projeto de felicidade opressiva em curso se quisermos viver num mundo como o nosso, em que se é obrigado a projetar uma imagem de sucesso mesmo que você esteja quase vomitando.

Outra chave é nos lembrar que a associação cega entre desejo e felicidade é uma armadilha. A filosofia há muito sabe que devemos tomar cuidado com o desejo. E aí temos mais um conflito entre o pessimismo e o otimismo da produção infinita.

Tenho dó especialmente dos mais jovens, que serão espancados na vida profissional para serem otimistas o tempo todo.

Com a pandemia, o pessimismo virou uma commodity viável. Dizer que as empresas vão todas quebrar dá grana. Gozar com a segunda onda da Covid -19 é tratado como uma obviedade e dá grana. Quem vive de tecnologia remota não poderia imaginar um ano mais paradisíaco do que 2020. Tocar o terror faz você parecer inteligente e consciente, o oposto do Bolsonaro.

Quem tem o ouvido formado na visão trágica de mundo, a mais pessimista na história da filosofia, capta bem a canalhice por trás desses cenários de pessimismo commoditizado na pandemia.
O tratamento dado pela mídia à ciência na pandemia infelizmente tem sido absolutamente risível com relação à dimensão epistemológica da própria ciência. Não epidemiológica, leia de novo.

Epistemologia é uma especialidade da filosofia que estuda a ciência. Podemos chamá-la de teoria da ciência.

A ciência não é o que o senso comum pensa que ela seja. Ela é contraditória, protocolar, institucional, reduz incertezas e não produz certezas, e é, acima de tudo, um mercado riquíssimo e competitivo, cheio de vaidades e ambivalências. Cientistas deveriam ser monges trabalhando em conventos, mas não são. Reduzir o debate público a negacionismo x conscientes é falha de repertório epistemológico.

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