Cena de “Druk – Mais uma rodada”, de Thomas Vinterberg.| Foto: Divulgação
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O cinema dinamarquês é o melhor do mundo. Ao contrário de Hollywood, que optou por investir grandes somas em filmes de super-heróis para retardados, os escandinavos têm buscado a população adulta do mundo. Druk – Mais uma Rodada, de Thomas Vinterberg, com Mads Mikkelsen como protagonista, é mais um exemplo.

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Quatro professores de uma escola de segundo grau por volta dos 40 anos, sendo Martin (Mikkelsen) aparentemente o mais deprimido entre eles, decidem fazer um experimento de comportamento – beber para aumentar a porcentagem de álcool no sangue a fim de sair da depressão de meia-idade. In vino veritas, o experimento tem desdobramentos irreversíveis na vida dos quatro, para além de bem e mal.

Deveríamos educar os jovens para o fracasso e não para o fetiche do sucesso

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Não vou dar spoiler. Interessa-me uma questão central do filme: afinal, o que quer o homem? Estamos acostumados a pensar muito em o que a mulher quer. Mesmo Freud formulou essa questão como um enigma. Assumimos que o homem é simples e que se basta com uma gostosa e uma cerveja. Será assim ainda hoje, quando ninguém mais sabe o que quer porque tem de querer muitas coisas ao mesmo tempo? O desejo, pilar do mundo existencial moderno, ruiu diante de tantas demandas feitas a ele. E só vai piorar num mundo narrado pelo marketing.

O professor de história Martin recupera o gosto pela vida bebendo, mas isso vai custar caro, é claro. Enfrentar a vida de cara limpa tornou-se insuportável. Álcool, antidepressivos ou ansiolíticos são a nossa dieta básica, mesmo que seja na forma rescue, versão alternativa do frontal.

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Quando os amigos se reúnem uma noite e decidem pelo experimento, diante da depressão do Martin, um deles faz a pergunta básica: já pensou em trocar de mulher? Diante da negativa do amigo, a situação fica mais complicada. O caso sempre fica mais grave quando um homem, já passada a festa ingênua da juventude, supera a ilusão de que sua vida se resolverá se ele trocar a mulher por uma mais jovem. O mundo não está preparado para homens maduros. Nem as mulheres estão preparadas para homens assim. Elas só suportam homens maduros até a página três.

Esse continente desconhecido só se apresenta para um homem que passou dos 50 anos quando ele supera o mito de que sua vida existencial será sempre divertida se comer uma gostosa por dia. O mundo não está preparado para essa raça de homens.

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A mulher tem dominado o vocabulário subjetivo. Homens heterossexuais sempre pensaram que só homens gays pensam na vida para além de sexo, carros e futebol. Ser um analfabeto existencial sempre pareceu, para a maioria dos homens heterossexuais, uma garantia de não ser gay. Quando um homem se faz uma pergunta existencial depois do 50 e a resposta não é “trocar de mulher”, a coisa fica mais séria. É difícil envelhecer, principalmente num mundo em que o ethos é o marketing da inovação como estilo de vida. O fato de o filme ser sobre professores não é um detalhe menor.

Num dado momento, Martin faz a famosa pegadinha com os alunos. Em quem vocês votariam? 1. Era viciado em mulheres e tinha dezenas de amantes; 2. Bebia uísque no café da manhã; 3. Era vegetariano, artista e consta que tratava bem as mulheres. Todos os alunos votam no 3. O primeiro era Roosevelt; o segundo, Churchill; o terceiro, Hitler. Conclusão do professor para os alunos foi que o mundo nunca é o que esperamos que ele seja. Máxima que devia pautar todo o ensino. Infelizmente, os professores hoje também gostam dos filmes de super-heróis para retardados e enchem a bola dos delírios dos mais jovens.

É difícil envelhecer, principalmente num mundo em que o ethos é o marketing da inovação como estilo de vida

Por fim, não podia faltar uma menção ao filósofo dinamarquês do século 19, Sören Kierkegaard. Um dos formandos tem uma prova final sobre ele, fundador da filosofia da existência, que inaugurou a concepção de ser humano centrada no conceito de angústia, título de um dos seus livros. Para ele, só começamos a vida adulta quando fracassamos diante da angústia. Deveríamos educar os mais jovens para esse fracasso – e não para o fetiche do sucesso. Fracasso e desencanto, nossas duas maiores tarefas existenciais neste século.