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Luiz Felipe Pondé

Luiz Felipe Pondé

Escritor e ensaísta, autor de 'Dez Mandamentos' e 'Marketing Existencial'. É doutor em filosofia pela USP

Filosofia

Por que existe o mal?

(Foto: Aarón Blanco/Unsplash)

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Por que o mal existe? Essa pergunta abre espaço para muitas respostas, muitas delas contraditórias. Podemos, de cara, dizer que é uma daquelas perguntas que revelam o mal-estar da metafísica, como dizia Fernando Pessoa, porque, a rigor, não existe o "mal", mas apenas fenômenos que agradam a uns e desagradam a outros, ou mesmo que desagradam a todos. Esses, como vulcões, epidemias, maremotos e terremotos, são males naturais, logo não são mal nenhum.

A natureza nem o universo são morais. Ambos não visam causar mal a ninguém. Daí dizermos que a natureza e o universo são cegos moralmente. Em filosofia dizemos: a natureza nem o universo têm qualquer intenção de causar mal a ninguém.

Pouco importa como respondamos negativamente à existência do mal, continuamos a sofrê-lo de maneira irrevogável.

Outra forma de responder a esta questão é dizer que não existe mal nenhum a não ser shit happens, ou coisas ruins acontecem, porque as coisas do mundo estão submetidas à contingência – sorte ou azar. Muitas vezes ações humanas não intencionais causam mal aos outros, como erros técnicos, de gestão, ignorância, irresponsabilidade, enfim, a cadeia de causas possíveis para eventos indesejáveis – eventos maus – é infinita, e não temos tempo para o infinito aqui.

Entretanto, pouco importa como respondamos negativamente à existência do mal, continuamos a sofrê-lo de maneira irrevogável.

Alguns separam o mal natural – que não é mal em si – do mal moral – causado pelos homens. Este seria, para muitos, o espaço possível de nossa ação contra o mal. O outro, o natural, enfrentamos com a boa técnica, a boa ciência, a boa gestão e a boa política – a mais rara das quatro. Passamos a vida a enfrentar males diversos, dos morais aos naturais, e acabamos por perder a batalha para o mal natural mais temível de todos, que é a morte.

O problema seria, portanto, postular a existência de um "mal em si", entidade metafísica ou intencional, que visaria causar sofrimento, destruição, injustiças e similares ao homem e a todas as criaturas que povoam o universo.

Muitos teólogos cristãos e pessoas comuns dizem que a causa do mal é o livre arbítrio. Deus nos criou livres e escolhemos mal.

A pura e simples indiferença do universo e da natureza para com o nosso sofrimento já é vivida como um mal para nós, como dizia o escritor Albert Camus. As religiões em geral fazem do mal um princípio metafísico. Demônios, espíritos sem luz, "más energias".

O espiritismo, a mais tosca das religiões, entende o mal como algo a ser resolvido a prestação, como boletos pagos em cada encarnação. O cristianismo tem um problema mais grave do que as demais religiões para responder à questão "por que o mal existe?". Você sabe por quê? Porque o cristianismo inventou que Deus é amor, que Deus é bom e todo poderoso, e aí ferrou tudo. Foi obrigado a criar um princípio outro (Satanás), meio incontrolável, que fica detonado tudo por aí.

O problema persiste porque daí a questão muda para "por que Deus, que é amor, bom e todo poderoso, deixa o demo pintar e bordar?". Ninguém sabe responder a esta pergunta de forma satisfatória.

Muitos teólogos cristãos e pessoas comuns dizem que a causa do mal é o livre arbítrio. Deus nos criou livres e escolhemos mal. Infelizmente – mesmo com toda a simpatia que nutro por grande parte da teologia, que é uma forma de filosofia religiosa bastante sofisticada em muitos casos –, devo dizer que essa resposta não fica de pé.

Como diz o jovem filósofo niilista Ivan Karamazov, personagem dos Irmãos Karamazov de Dostoievski, não há resposta que perdoe a Deus pelo sofrimento de uma criança inocente. Se ele existe, ele é cruel ou um fraco. Espíritas, com sua lógica positivista de bolso, dirão que a criança escolheu sofrer antes de encarnar para pagar algum boleto moral de encarnações passadas.

Enfim, o argumento a partir do mal, como se diz em filosofia, é um xeque-mate no cristianismo. Deixa-o de joelhos. Ateus praticantes gozam com este argumento. Inteligentinhos respondem que o mal é relativo. Não fosse eles a nos dizer, nunca imaginaríamos tal sofisticado diagnóstico. Muito obrigado!

Quando abrimos a porta do relativismo para uma reflexão como esta sobre o mal, convidamos o niilismo para jantar. E deste, todos têm medo. Até mesmo os ateus Toddynhos e os relativistas.

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