Por mais que consideremos que o Estado brasileiro apresente tiranos pontuais, tanto do Executivo como do Judiciário, em nível municipal e estadual; e estejamos bradando internamente que existe uma ditadura em curso no Brasil, com prisões políticas, perseguições à oposição e constantes violações ao devido processo legal e ao estado de direito, isso tudo não importa, de fato, até que haja reconhecimento internacional dessa situação.
O mesmo processo ocorreu com a proclamação da Independência. Por mais que nos considerássemos independentes em 1822, só o fomos depois de avalizados por outros países, e em 1825, com a adesão do último país, Portugal. Portanto, o reconhecimento da opinião pública internacional é essencial, e o mesmo vale no nível nacional e individual; de nada adianta se proclamar presidente sem que haja aclamação popular. A opinião pública é o grande fórum mediador onde se define “o que que é o que” quando os temas são subjetivos.
E, pasmem, quase tudo na política é subjetivo. Daí o interesse contínuo de tiranos sem legitimidade controlarem as opções e opiniões dos que se deixam tiranizar.
Ditaduras em graus de cinza - À exceção da China, que já declara no primeiro parágrafo de sua constituição que é uma ditadura democrática, nenhum país se proclama como ditadura. Aliás, a maioria das ditaduras comunistas mais brutais do século 20 se definiam orgulhosamente com os termos “república”, “democracia” e “popular” divergindo totalmente do que o mundo pensava deles. Em 1989 a piada acaba e a opinião pública mundial descobre que estavam corretos; eram ditaduras de fato.
Hoje sabemos que, entre os aproximadamente 200 países que existem no mundo, uma parcela expressiva é dominada por sistemas autocráticos em que a opinião pública não é soberana e os governantes têm muito poder coercitivo concentrado.
Nesses casos, a população tem pouca ou nenhuma possibilidade de remover os tiranos do poder. Essa é a realidade da maioria dos países, e apenas uma minoria possui sistemas mais abertos, com liberdade econômica, de expressão, de consciência, de religião, de associação ou de não-associação, de ir e vir, enfim, direitos individuais fundamentais preservados em lei e de fato. Esses países em que o sistema político não teme a opinião pública são mais legítimos e são exclusivos dos países que hoje consideramos desenvolvidos.
Na ciência política procura-se detalhar esses aspectos subjetivos genéricos em subjetividades menores, a exemplo de como definir se um país tem estado de direito e democracia moderna. Para esse exercício são necessárias análises de uma miríade de itens subjetivos: há separação de poderes, mídia e judiciário independentes, liberdades individuais, direito à propriedade, eleições honestas e frequentes, alternância no poder, transparência, possibilidade de contestar etc?
Quando analisamos todos os países sob esses aspectos, notamos que praticamente todos eles têm alguma interferência de seus governos, uns mais, outros menos. Todos sofrem com a ação de cartéis e oligarquias e desconfiam de seus representantes. Na verdade, os países podem ser separados em graus de liberdade ou graus de ditadura. O consenso mundial hoje é de que somos uma ditadura das mais repressivas. Mas foi a falta de apenas um item que fez o caldo entornar: a liberdade de expressão.
A ditadura e a liberdade de expressão - Cabe acrescentar um ponto crucial para essa discussão. De todas as liberdades, a liberdade de expressão é a pedra fundamental. Por quê?
- A partir dela podemos defender as outras liberdades, como a de ir e vir, de associação, de religião, de reunião, todas são variantes da expressão individual;
- Mesmo que existam outras liberdades, ter liberdade de expressão garante que o governo vai agir com lisura, transparência e idoneidade em suas ações e sem possíveis interferências nos diversos setores da vida cotidiana;
- Com a cobrança, que pode vir da liberdade de expressão, há transparência e se colocam limites à corrupção, cobra-se eficiência dos agentes e do próprio estado na condução das políticas públicas.
Sem liberdade de expressão os desqualificados, os malignos e os aproveitadores se perpetuam na ditadura.
Saída para a liberdade - Não será por meio de instituições, ou dos representantes das instituições, com certeza, que encontraremos uma opção para combater a ditadura que já se instalou. Se esperarmos que estes proponham mudanças é muito provável que eles expurguem os que expuseram as verdades e, ao mesmo tempo, limitem ou removam seu maior protagonista para seguirem adiante; como o lobo preso em armadilha rói a própria perna para sobreviver.
Para se caminhar junto com os países que têm mais liberdades, é necessária uma ampla mobilização social, com plano efetivo de como reformar o regime, para evitar a tirania do estado que sempre se recicla. O Estado deve ser servidor, e não governador.
Penso que o momento é positivo, agora que temos o reconhecimento de que somos uma ditadura. Como assim? Antes havia ruído em torno do que fazer e para qual objetivo, agora todas ações de mobilização social ficarão mais claras, pois todas serão em prol da liberdade.
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