Ouça este conteúdo
Fazer discurso é uma coisa. Transformá-lo em projeto de lei (PL), decreto legislativo (PDL) ou emenda constitucional (PEC) é outra. Mais: protocolar PL, PDL ou PEC é uma coisa. Aprová-los na Câmara e no Senado é outra totalmente diferente. Respondendo a pergunta do título, o que muda o país é a aprovação de projetos nas casas legislativas. Mas como aprovar um projeto? Utilizando a pirâmide: ativistas, partidos, deputados.
Na base dessa pirâmide estão os ativistas, que engajam a população e mobilizam a opinião pública, quase sempre inerte. Essa base mobilizada é que gera crítica, reflexão, apoio ou rejeição em torno de algum tema, convence os deputados de que um projeto tem importância e ajuda a formar maioria. Na parte central da pirâmide está - ou ao menos deveria estar - o partido, que adere aos projetos, cria as narrativas, conversa com lideranças de seu partido e dos demais, ativa a mídia, os especialistas e a base em torno da ideia. Na ponta de lança, ou no topo da pirâmide, estão os deputados e senadores que protocolam e fazem o debate dos projetos nas comissões, definem prioridades na Câmara, convencem seus pares, discursam e finalmente votam. Qualquer partido que agir usando essa pirâmide terá alta efetividade de aprovação de projetos.
Partidos de esquerda têm como rotina manter essa máquina e suas engrenagens bem engraxadas. Com frequência são vistos vários grupos de interesse mobilizados fora do Congresso, quando um projeto da esquerda está para ser votado. Também é notável como seus representantes lutam para colocar seus projetos em evidência e vociferam a mesma narrativa para defendê-los. É a pirâmide em ação. Quando isso ocorre, os deputados de oposição à esquerda fraquejam e qualquer discurso racional à propositura se esfacela. A votação, quando a pirâmide é bem utilizada, torna-se mera formalidade.
Essa base mobilizada é que gera crítica, reflexão, apoio ou rejeição em torno de algum tema, convence os deputados de que um projeto tem importância e ajuda a formar maioria
Partidos de centro e de direita ainda não evoluíram satisfatoriamente no uso desse mecanismo. Em passado recente, não tinham agenda política definida e por consequência não tinham base de ativistas que se mobilizassem por ideias, nem deputados que as representassem. Disputavam personalidades da mídia para virem compor chapa e “puxar” deputados invisíveis. Recentemente, graças às mídias sociais, surgiu nova leva de deputados e senadores, com alta visibilidade, vínculo direto com seu eleitor e, o que é mais importante, com conteúdo ideológico novo, alternativo à ideologia onipresente da esquerda, um dado positivo quando se considera que até recentemente fazer acordos e comandar votos de seus eleitos era prerrogativa exclusiva de líderes partidários.
A maioria desses novos eleitos e seus partidos ainda não sabem usar a pirâmide. Eles exercem um protagonismo individual, não dão muita importância ao processo interno de criação e aprovação de projetos nas comissões e acham que publicar em suas mídias sociais é equivalente a fazer trabalho parlamentar com eficácia. Boa parte da opinião pública, por desconhecimento desse processo de mudança do país, se satisfaz com um belo discurso na hora certa. O importante, contudo, é ter projeto aprovado, sem nos desfazermos do discurso ou da live, que têm seu lugar e podem até servir para criar uma narrativa que vá negar a ação de outros partidos ou mudar votos dos deputados que têm dúvidas sobre um projeto.
Eles exercem um protagonismo individual, não dão muita importância ao processo interno de criação e aprovação de projetos nas comissões e acham que publicar em suas mídias sociais é equivalente a fazer trabalho parlamentar com eficácia
Assim como a mera divulgação, a criação de um projeto em si também não tem efetividade. Mostra somente que a ideia tem materialidade, mas as chances de aprovação somente em virtude do mérito do projeto é, na prática, zero. Ter um grande partido de apoio por si só também não é garantia de aprovação de matérias, se não houver projetos e nem pessoas com habilidade para defendê-los. Muitos partidos somente reagem à agenda política de partidos menores, mas bem organizados, que agem em pirâmide. Os deputados desses partidos grandes não fazem discurso, não protocolam projetos e só votam as matérias apresentadas pelos demais.
Em suma, a transparência e o vínculo direto que as mídias sociais proporcionam é um avanço, mas mudar o Brasil requer que ativistas, partidos e deputados trabalhem em simbiose na construção do mecanismo de mudança; a pirâmide.
Conteúdo editado por: Jônatas Dias Lima