O uso do termo “democracia” está gerando confusão. É preciso definir a terminologia de uso corrente, porque a ideia de que a democracia está relacionada com as instituições é uma percepção totalmente equivocada se seguirmos a origem da palavra democracia.
Desde sua origem a democracia sempre foi antagônica às instituições.
A questão chave para qualquer analista é responder quem é que governa? O povo ou as instituições? A resposta no caso do Brasil é rápida: as instituições. As instituições públicas são a tentativa de representar o estado de direito, as leis. Aquilo que valida, testa, critica, limita mas está sempre fora das instituições é a vontade popular, o “governo do povo”, ou seja, a democracia.
No Brasil, assim como no resto do mundo, a mídia e as próprias instituições estão se denominando “democracia”. Quantas vezes nós escutamos frases como “um ataque às instituições é um ataque à democracia”. Mas não é e nunca será. Explico.
Algumas instituições são mais abertas do que outras em atender a vontade popular do momento. Mas nenhuma é, de fato, a vontade popular. Instituições públicas, mesmo as mais transparentes e sensíveis sempre serão uma instituição, regida por leis e normas e não pela vontade popular.
Daí o zelo que se deve ter toda vez que se cria uma instituição pública. Quando a instituição é limitada em seus poderes, está aberta ao debate de suas práticas, é fiel à conduta dentro de seu regimento e age com total transparência, essa instituição é considerada aberta. Para essas até pode-se estender o adjetivo de ser mais “democrática”, mas mesmo cheia de virtudes, uma instituição aberta não é a democracia.
No Brasil, assim como no resto do mundo, a mídia e as próprias instituições estão se denominando “democracia”
No entanto, por erro de desenho, corrupção e ideologia dos legisladores ao longo dos últimos 35 anos da nossa sétima constituição, criaram-se várias instituições fechadas no Brasil. Desde agências reguladoras do Executivo ao auto-empoderamento do Judiciário, essas instituições agem diretamente na população, muitas vezes sem freios, sem transparência e visam representar os interesses de seus agentes. Geralmente são as que recebem mais críticas e são as menos suscetíveis a fazer mudanças.
Em um estado de direito moderno, criado nos moldes da civilização ocidental, a vontade popular pode se manifestar a favor ou contra instituições, seus representantes, suas decisões, assim como se manifesta a favor ou contra parcelas da própria sociedade, desde que siga limites validados por todos e estejam estabelecidos na Constituição ou em leis. Os limites criados pelo estado de direito moderno são o que viabilizam a democracia.
Esses estados de direito modernos têm canais legalizados para fazer mudança de forma direta, pela vontade popular. Implementaram mecanismos de democracia direta como referendo, plebiscito, iniciativa popular e recall de mandatos. Mas mesmo esses modelos avançados de estado de direito sendo extremamente abertos, eles não são a democracia.
Mas, e se não temos um estado de direito moderno? Pois então, esse é o caso do Brasil. Lembro ao leitor que nossa Constituição contém a passagem na qual é dito que “todo o poder emana do povo que o exerce através de seus representantes eleitos ou diretamente”. O poder do povo através de seus representantes está bem definido de forma constitucional e nas leis (e necessita de sérios ajustes, diga-se de passagem).
E se o poder está sendo exercido por agentes não eleitos? Qual é a forma de exercer a vontade popular diretamente?
Os artigos, leis e normas que responderiam essas perguntas nunca foram criados nos últimos 35 anos e são sistematicamente omitidos do processo de criação. É por isso que temos um estado de direito imperfeito, termo usado por analistas internacionais, repleto de instituições fechadas, falta de transparência, corrupção, ineficiência e tirania de eleitos e não eleitos.
Como qualificar os atos do dia 8 de janeiro, os quais a mídia e a esquerda mundial proclamaram como sendo atos contra a democracia? Como você deve ter deduzido do texto acima, os atos não foram contra a democracia, foram contra as instituições. Mas não importa a forma que os defina, foram ruins para a construção da melhor saída.
A violência e o vandalismo não dão legitimidade à real indignação popular que antecedeu os atos e não fazem com que as instituições se tornem mais abertas. Quando não há reinvindicações claras para as mudanças necessárias, demonstrações se tornam meros atos de revolta. E mesmo quando há reinvindicações e exigências claras, o uso da violência ofusca e tira suas legitimidades. Implícita nessas afirmações está a melhor saída. Falaremos mais sobre isso em artigos futuros.
A vontade popular, a mobilização nacional, a democracia brasileira estão muito bem. São as instituições que não estão.
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