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Ruínas da antiga civilização grega, em Atenas.
Ruínas da antiga civilização grega, em Atenas.| Foto: Martin Cigler/Wikimedia Commons

Há diversas maneiras de contar a história. Uns seguem o caminho da sequência de fatos, outros, das narrativas anacrônicas de conflito de classes, e um terceiro grupo prefere as teorias de ciclos. Este último grupo, menos conhecido, é dos mais antigos. Desde Platão, vários autores descrevem a história das civilizações analisando ciclos. O desafio é explicar como eles se repetem para que sejam considerados como tal, e não mera suposição.

A despeito do tempo de vida de cada observador, curto demais para o acompanhar o longo período de um ciclo, Oswald Spengler, em seu livro "O Declínio do Ocidente", de 1918, conseguiu prever, ao analisar ciclos históricos de longuíssimo prazo, situações políticas que acontecem nos tempos atuais. Igualmente, meu livro, “Por que o Brasil é um país atrasado?", no capítulo “Sucessão de Oligarquias”, menciona o Kyklos de Platão, que foi aprimorado por Políbio, e um ciclo menor, brasileiro, que se formou durante as tentativas de se estabelecer repúblicas ao longo do século 20, e que só resultaram na alternância de poder entre governos populistas e oligárquicos.

Há um padrão que se repete no início e no final das cinco grandes etapas históricas nos últimos 2.500 anos e pode servir de prelúdio para nosso futuro. Entendê-lo é relevante para compreender o momento atual e o caminho a tomar.  Em síntese, o início de cada ciclo é virtuoso e o fim, repleto de vícios:

Primeiro Ciclo: O início do primeiro ciclo é caracterizado pela formação da cultura grega no Peloponeso e da cultura etrusca na península itálica por volta do século 10 a.C. Foram criadas as primeiras cidades-estado e também surgiram os primeiros reis e tiranos. O final dessa etapa ocorre 400 anos depois, no século 6 a.C, tanto em Atenas quanto na península itálica.  Os atenienses se revoltaram contra a tirania de Iságoras, um magistrado corrupto e imoral, que servia mais aos Espartanos que aos Atenienses, e instauraram a democracia. Em Roma, os fazendeiros se levantam contra os monarcas etruscos que, hedonistas e entorpecidos por sua superioridade cultural, abusavam de seu poder.  Os fazendeiros romanos revoltosos de então criam uma república.

Segundo Ciclo: A República Romana, formada inicialmente por fazendeiros que, contrários a qualquer concentração de poder, formaram um senado de patrícios com dois cônsules eleitos anualmente. O sistema era firmemente calcado em valores marciais, sendo que quase todos os senadores haviam lutado nas batalhas contra os reis etruscos. A República Romana cresceu e incorporou Atenas e demais cidades do Peloponeso, além de vastos territórios na península itálica e Europa. Entretanto, 400 anos depois, o senado já não era mais o mesmo. Os patrícios se tornaram a minoria e a maioria era de senadores corruptos e distantes dos valores que formaram a república. Os senadores negavam pagamento aos exércitos e não se importavam com o bem comum; usando seu status e poder em benefício próprio.  Levantes populares e tentativas de golpe se tornaram constantes e a república se tornou oclocracia (governo de facções).

Em síntese, o início de cada ciclo é virtuoso e o fim, repleto de vícios

Terceiro Ciclo: Eis que em 27 a.C surge um líder para restabelecer os valores da República Romana: Otaviano. Ele se transforma no Primeiro Imperador Romano por aclamação das diversas facções. Por ironia, ele era um “imperador republicano”, que não se considerava imperador, mas sim o primeiro cidadão ou “princeps” – incutindo este título como valor primordial do Império Romano.  Ele inicia um ciclo virtuoso restabelecendo a estabilidade, a separação de poderes entre senado e imperador e a integridade das instituições. Adicionalmente, acabou com o patrimonialismo, moralizou o senado, extirpou os agentes corruptores, iniciou grandes obras e campanhas militares unificando o império e estabelecendo diretrizes de conduta dentro do sistema imperial que perduraram por vários séculos.

Ao final desse ciclo, houve a ascensão do Cristianismo e seu efeito subversivo do modelo imperial romano. O status quo era calcado firmemente nos deuses romanos e rituais que unificavam e amarravam o sistema de confiança, historicamente reforçado em torno do senado, dos cônsules e dos imperadores romanos, da Pax Romana e da lei e civilização romana como um todo.  Uma vez que o cristianismo substituiu os valores de base dos romanos no século 4 d.C., toda a organização romana entrou em colapso; enfraqueceu-se, corrompeu-se e dividiu-se. Os poderes institucionais passaram a apelar por líderes tirânicos; antíteses dos valores institucionalizados por Otaviano. Foi no período do “Dominato”, conceito oposto ao de “Princeps”,  que se caracterizou a tirania do imperador Diocleciano, o último imperador que precedeu a divisão do império, a perseguição aos cristãos e a invasão dos bárbaros germânicos, causando o fim do Império Romano Ocidental.

Quarto Ciclo: Do declínio do terceiro ciclo emerge uma onda criadora, uma nova primavera civilizacional: a dos reinos cristãos. Era o século 5 d.C, início da Idade Média. Nessa era que durou mais de mil anos surgem os mitos e valores cristãos, os reis, seus títulos e territórios abençoados pela Igreja, a expansão da cristandade e das grandes conquistas de territórios além-mar e o nascimento dos Impérios. Em contrapartida, ao final desse ciclo, novos valores foram introduzidos por meio da burguesia e de levantes populares. A revolução Gloriosa, na Inglaterra, no século 17 e as revoluções norte-americana e francesa no século 18 vieram para materializar ideias nascidas nos séculos anteriores, antagônicas àquelas formadoras das monarquias tradicionais: a representação por voto popular, e não por unção divina ou por herança. Um governo estabelecido por leis escritas e aceitas, e não por costumes e tradições. A substituição da fé e das crenças por lógica e raciocínio.

É evidente que essas revoluções minaram os valores cristãos do antigo regime, entretanto, a decadência total do Reinos Cristãos foi protagonizada por Napoleão, um usurpador jacobino que tiranizou toda a Europa, invadiu reinados, aprisionou reis e coroou-se imperador usando os mesmos rituais cristãos reservados a famílias reais fundadoras. Napoleão falsificou sua legitimidade fazendo com que todas as instituições e sociedades europeias aceitassem seus títulos, e de seus familiares, como se sempre tivessem pertencidos a nobreza. Os reinados cristãos ocidentais que sobreviveram nunca mais foram os mesmos.

Quinto Ciclo: Nessa etapa, o modelo republicano surge legitimado por constituições, pela separação e limitação de poderes, pela proteção dos direitos dos cidadãos e pela representação democrática pelo voto. No cerne dos fundamentos da república surge a figura do cidadão; indivíduo livre, nato com direitos universais, que elege os melhores dentre seus pares para representá-lo. Nesse início virtuoso, observou-se a expansão da propriedade privada, das instituições públicas, do direito, do livre mercado e do comércio global.  Há a valorização da nação, do bem comum e da civilização com o despertar da cidadania.

Hoje estamos no final desse ciclo.  Vemos a petrificação das sociedades pela burocracia, o surgimento de grandes metrópoles e sistemas tecnológicos de controle; baixa fertilidade, antagonismo entre a vida rural e a urbana, crises políticas e desconfiança da tecnologia e dos sistemas políticos. Cidadãos foram convertidos em massa consumidora. Representantes da sociedade se transformaram em tiranos. Mais uma vez, assim como Napoleão marcou o fim do antigo regime, o deboche está cada vez mais evidente marcando o final do 5º ciclo: a eleição de criminosos corruptos no comando absoluto de cidadãos.

O Brasil recentemente elegeu seu equivalente a Isagoras de Atenas, Diocleciano de Roma ou Napoleão da Europa. Isso marca o fim da nossa 7ª república.  Mas esse fato não é isolado, pois ocorre o mesmo em todo sistema político que compartilha da mesma história descrita acima: na América Latina, assim como na América do Norte e Europa, esse padrão se repete: um títere tirânico e corrupto é eleito para controlar os cidadãos e servir a interesses externos. Biden, Macron, Trudeau e vários líderes da atualidade validam esse padrão.

Estamos no final desse 5º ciclo e início de um outro, mas qual será a nova etapa? Já vemos brotando algumas opções: de um lado, uma tirania tecnocrática, anônima, liderada por fantoches visíveis que controlam todas as sociedades através da tecnologia. Essa possibilidade já está em curso com diferentes graus de avanço em vários países.

Entretanto, há outro movimento que também cresce: a revolta da cidadania contra a tecnologia, contra os sistemas políticos, contra a supressão da família, da fé, da nação e das liberdades.  Essa antítese cresce à medida que a tirania tecnológica avança.  Como um teórico da conspiração certa vez afirmou, “à medida que nos aproximarmos da singularidade, do comando central absoluto, atingiremos também o ponto de maior resistência e antagonismo ao regime totalitário, o que pode engatilhar uma grande diáspora, um novo ‘big bang’ anti-totalitário, pela liberdade”.

De volta ao nosso Brasil, acreditarei mais nessa última possibilidade quando voltar a ver a mobilização do povo nas ruas e nas redes sociais, agindo contra a criação dos pilares da nova ditadura.  Só uma sociedade organizada consegue derrubar a tirania e encurtar o período de decadência total, como pode ser verificado ao longo da história. Mas para que isso aconteça precisamos de mais cidadãos com consciência do momento em que vivemos.  Henry Kissinger, em entrevista sobre como evitar ou encurtar as etapas negativas dos ciclos, disse:  “para reverter uma tendência é necessário mais que uma proclamação; é importante compreender qual é a tendência para que se consiga revertê-la.”  Eu sei o que está por vir se a sociedade não se organizar e voltar se mobilizar, e você?

Conteúdo editado por:Jônatas Dias Lima
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