| Foto: EFE/ Sebastião Moreira
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O que é necessário fazer para “cair a ficha” da opinião pública? Infelizmente, uma catástrofe como a que ocorreu no Rio Grande do Sul. A tragédia das inundações trouxe à tona tudo o que já falamos sobre o modelo de estado brasileiro: centralizado, caro, distante, burocrático, regulador, e ineficaz em quase tudo que faz. 

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Caiu a ficha também que a esquerda defende esse estado e que a democracia não é o estado, mas todos os que são explorados por ele, os que estão de fora dele, e que são defendidos somente pelo populismo.

Apesar dos muitos esforços dos agentes públicos para dar conta do movimento “O Povo pelo Povo”, o sistema em si é falho.  É organizado por um burocrata anônimo e distante, e não pela sociedade presente nos acontecimentos. Não há vínculo direto entre quem entrega serviço e quem o recebe ou paga as contas; uma distorção exacerbada pelo centralismo. 

Burocracia contra o povo

O que percebemos nas últimas semanas diante da catástrofe no Rio Grande do Sul é que a mobilização popular tem sido massiva e que a burocracia tem funcionado como sempre: contra a população. É missão da burocracia atrapalhar a população? A priori, não, pois toda burocracia é organizada para prestar um serviço. O problema surge quando há burocracia que não tolera concorrência, que monopoliza o serviço social e atrapalha. É essa a característica da nossa burocracia. 

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Observamos a grande injustiça cometida pelos burocratas, que na sanha de fazer seu serviço com “eficiência” acabam limitando o acesso alternativo a bens e serviços. Isso significa que o burocrata, tal como age, é incapaz de ser solidário com a sociedade, mesmo em momentos de extrema necessidade. 

Essa característica já foi assinalada por Max Weber, o pai da burocracia, no início do século 20. Burocratas são autômatos, robôs que obedecem rigorosamente as regras e justificam seus atos só por meio delas. Na prática, no entanto, a busca da tal “eficiência” gera várias ineficiências, como temos observado. 

Paul Johnson, outro teórico posterior a Weber, aborda especificamente o tema da burocracia e acrescenta que os incentivos criados dentro do sistema, embora garantam a execução dos serviços, podem ser contraproducentes, se não houver válvulas de escape para situações como as que estamos vivendo, de emergência ou calamidade pública. 

Independentemente da circunstância, a consequência é sempre consistente: o burocrata acaba agindo sempre mais por incentivos internos que pelas evidências externas.    

Centralização é um agravante

Para acentuar essa característica burocrática, há o agravante da burocracia centralizada no poder federal agindo no contexto local. Tal distanciamento significa que os incentivos burocráticos são criados e dirigidos pelo governo federal, longe da realidade local. O planejamento central nunca deu certo em lugar nenhum e certamente não dará certo em um país continental e diversificado como o Brasil.  Países desenvolvidos, alguns muito menores que o Brasil, têm uma burocracia descentralizada e aberta, com ampla autonomia local.  Nesses locais, a burocracia tem mais chances de dar certo, ou de atrapalhar menos, dependendo da orientação do governo no momento.  

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Nesse contexto, não há como justificar mais burocracia e controle federal. Notícias recentes apontam que o governo federal quer exatamente isso. Será certamente mais caro e mais ineficaz que a alternativa de devolver os recursos tributários para o Rio Grande do Sul e seus municípios. Mas essa alternativa sequer é debatida, não é mesmo?  

Ideologia contra a realidade 

O movimento “Povo pelo Povo” é o caminho certo.  Mobilizou todo o Brasil, não apenas em razão do estado do Rio Grande do Sul, mas inspirado por ele.  A população percebeu a inépcia do Estado diante do desafio e muito prontamente organizou sistemas de resgates e doações. A percepção ficou nítida: as diversas agências de estado não funcionam, e isso se choca diretamente com a ideologia do governo que prega mais estado. 

A verdade é que esse conceito de estado é muito genérico, pois há diferenças entre o bom e o mau estado. Abaixo, explicitamos essas duas concepções para esclarecê-las:

O bom EstadoO mau Estado 
Revogável, adaptável a cada situaçãoCentralizado, permanente, compartimentalizado
Reage às demandas locaisImpõe ideologias centrais
Faz o que só o estado pode fazer. Questões específicas de coletivizaçãoQuer fazer tudo por todo o mundo, interfere em tudo e não faz nada bem
Está próximo do eleitor que paga as contas, responde às demandas locais de forma  eficazDistante do eleitor, que pouco ou nada reage, e se o faz, sempre demora, pois não está próximo do problema
Reage à cobrança local e promove transparência e participação Aproveita qualquer crise para criar mais centralização de comando
Identifica problemas de longo prazo e investe para mitigar riscos futurosSó reage em tempos de crise
Investe em infraestrutura e cria alicerce para outras infraestruturasNão investe em infraestrutura, mas aloca recursos em serviços sociais efêmeros, que visam somente o voto do eleitor 
Rigoroso nas suas contas públicasCorrupto, desvia recursos das contas públicas a todo o momento
Local, regionalNacional, desvia verbas de algumas regiões para outras, onde possa ter mais presença eleitoral. 

Na sua opinião, qual dessas colunas melhor descreve o Estado Brasileiro?  Em que pese o reconhecimento do empenho pessoal de milhares de servidores públicos, a organização centralizada do estado brasileiro nunca vai criar os incentivos necessários para que eles conquistem a estima de uma burocracia eficaz comparável à de um país desenvolvido. 

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A solução está na percepção do problema

Como se percebe, o problema reflete em como você vai elaborar uma solução. Na minha percepção, é necessário mais federalismo, mais descentralização e priorizar recursos em infraestrutura e defesa (como apontei no artigo anterior). Se a burocracia do poder federal é incapaz, então procede que não deve cobrar mais tributos e criar mais burocracia. Que deixe os recursos para os estados e municípios definirem o que fazer. 

Mas para isso é necessário uma revisão do sistema tributário, criar limitações nas competências do poder federal sobre os estados e municípios.  

A população brasileira já está consciente de muitos dos pontos expostos acima. O atual governo federal, no entanto, quer se aproveitar de toda a tragédia para fazer o que mais sabem: centralizar, desviar verbas, aproveitar a crise para reforçar o poder federal, os esquemas de corrupção e de controle social, inversamente ao desejo da população.

Alguns acham que a solução é ter mais poder federal agindo no estado. Talvez eles não tenham visto os vídeos sobre as agências federais multando doações, barrando circulação de veículos de salvamento, impedindo caminhões de chegarem medicamentos e alimentação à população em calamidade, criando empecilhos para ajuda internacional. Igualmente não devem ter visto nenhum dos vídeos, centenas deles,  mostrando as trapalhadas das forças armadas durante o período das enchentes. 

Para quem, assim como eu, percebeu que o estado máximo do poder federal é um dos nossos maiores problemas, a tragédia é um sinal de alerta, pois o governo federal não está abrindo mão de nenhum recurso que surrupiou do Rio Grande do Sul, mas está agindo para criar mais burocracia federal naquele estado. O movimento Povo pelo Povo tem uma missão nacional.

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