Congresso Nacional.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
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Já virou clichê dizer que a Constituição de 1988 visava ao parlamentarismo, e é verdade. Naquele momento, havia a vontade de reforçar o parlamento e o texto de 1988 refletia isso. Mas a esquerda sempre quis um Poder Executivo forte, centralizador e por isso não assinou a Constituição. A esquerda trabalhou por 30 anos para modificá-la, e conseguiu.

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Ocorreram diversas alterações constitucionais nos últimos 30 anos, e fato é que o parlamento enfraqueceu. Vou citar três grandes mudanças que concorreram para que hoje tenhamos um sistema disfuncional, que não é presidencialista, mas que está cada vez mais longe de ser parlamentarista.

1) Agências reguladoras

Sua criação foi o primeiro passo para subverter e enfraquecer o Poder Legislativo, pois as agências reguladoras concentram os tecnocratas dos diversos setores em agências específicas, a exemplo da Aneel, de energia elétrica, ou Anatel, de comunicações, ou Iphan, que trata de todo o patrimônio histórico ou o CADE, que trata de fusões e aquisições para manter o sistema não oligopolizado. 

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Diga-se de passagem, que o fracasso dessas agências é gigantesco, pois não atendem os objetivos para os quais foram criadas; proteger o cidadão das péssimas políticas públicas. 

Basta observar a imensa lista de agências reguladoras de caráter duvidoso que regulamentam demasiadamente, a ponto de estrangular os setores que deveriam fomentar: Ancine, Anvisa, Anac, ANTT, e algumas ilustres desconhecidas do contribuinte, como a Agência Nacional de Mineração (ANM); e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).

Essas agências têm o poder, entre outros, de legislar via normas, taxar e multar sem aprovação do Congresso, o que cria um enorme problema para a democracia, pois ali ninguém foi eleito e não tem competência ou legitimidade para tomar tais decisões. Pior de tudo: são nomeados pelo poder Executivo, não pelo Congresso.

Veja que desastre: criou-se um rival do Congresso com poder de legislar sobre os diversos temas e o colocaram a reboque, acanhado e acuado, porque as tais agências reguladoras estão sempre proclamando sua “expertise”, como se o Congresso não fosse mais que um bando de incapacitados eleitos, que não faz jus ao “alto conhecimento” dessas agências. Uma falácia. 

É fundamental a extinção imediata dessas agências reguladoras. Algumas devem ser consolidadas em comissões permanentes do Congresso Nacional. O caráter permanente dessas comissões incluiria um quadro técnico de funcionários, mas sua presidência deve ser prerrogativa exclusiva dos deputados, legitimamente eleitos. 

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Essa simples medida transformaria as agências em órgãos muito mais transparentes e representativos, ao mesmo tempo que resgataria o poder do Congresso e, principalmente, tiraria o poder de legislar do Executivo. 

Mas há outro problema que se resolveria: as agências reguladoras são usadas hoje como moeda de troca (leia-se corrupção) do Executivo na compra do Congresso e mesmo do Judiciário, pois vários juízes têm interesses em nomear seus amigos para cargos com poder direto na economia ou na sociedade. 

Eles se digladiam com unhas e dentes para defender suas nomeações, e não é pelo salário percebido de seus apadrinhados, mas pelo poder de comando dentro e fora dessas agências. E o poder vale centenas de milhões ou bilhões de reais em desvios, favorecimentos, subsídios, proteções e uma série de distorções geradas em função de serem braços do Executivo. 

2) Emendas individuais

Poder receber e conceder emendas é um argumento comum para justificar o fortalecimento dos deputados em seus estados. Pode até ser, mas enfraquece o Congresso como um todo, e por quê?

Quem comanda parcela do orçamento que paga as emendas é o Executivo, não é o próprio Congresso, e as emendas individuais acabam por ser um chamariz para vários deputados estaduais, vereadores, prefeitos e até governadores serem deputados federais, somente porque a função lhes dará acesso às emendas individuais.

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São dezenas de milhões de reais alocados todos os anos e prontos para servirem na criação de currais eleitorais ou mesmo transformar aquele deputado federal em um herói local e se perpetuar no poder

Ele gasta todos esses recursos por quatro anos para divulgar sua imagem em campanhas e comprar cabos eleitorais, o que inibe qualquer renovação, pois os novos candidatos não têm tais recursos disponíveis para se elegerem. Uma distorção absoluta do processo de renovação na Câmara e no Senado, com parlamentares detentores de oito, dez mandatos consecutivos, blindados de qualquer competição.

Além disso, o deputado passa a não legislar e não monitorar o Poder Executivo - suas principais funções - voltando-se unicamente a receber emendas e destinar aos apadrinhados em seu estado. Todos esses fatores fazem sua capacidade de discussão, negociação e avaliação de projetos do governo ou da própria casa ser muito baixa, pois não é de seu interesse. 

Ademais, caso o Poder Executivo se pronuncie contra qualquer projeto, pode macular o processo de entrega das emendas, mesmo as obrigatórias, fazendo do deputado um vassalo do governo. Fora que as emendas têm sido distorcidas pelos deputados próximos ao governo, que são mais articuladores e recebem um valor de emendas muito mais alto que os demais, e de outras maneiras…

Agora, o mais comum é o deputado “emendeiro”. A maioria não está ali para discussão, proposta legislativa ou monitoramento do executivo, não. Estão lá para receber emenda. E isso mata as outras funções do deputado/senador. É o plano do Executivo, exercer seu poder diretamente, comprando parlamentares com emendas que os fragilizam tanto quanto o próprio Congresso Nacional.

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Diametralmente oposto, em outros países, como nos Estados Unidos, o Congresso é quem comanda o Orçamento, e as alocações de emendas estaduais são poucas e todas tratadas em comissões.

A solução para esse problema é simples, mas a execução é complicada: 

  1. O orçamento todo deveria ser de comando do legislativo, enquanto o executivo mantém a função de arrecadação – separando quem gasta de quem arrecada;
  2. As emendas individuais acabariam, e só se manteriam as emendas de bancada ou de comissão – ambas com processo de discussão e alocação mais transparente.

Para tal efeito seria necessária uma mudança constitucional mais ampla. Enquanto isso não for implementado, nosso Congresso será sistematicamente corroído pelos interesses dos próprios parlamentares de se venderem.

3) Reforma tributária

Esse é o fator mais recente. A reforma tributária criou uma nova agência reguladora, pasmem! Essa agência vai regulamentar todos os tributos, alíquotas, cessões e subsídios. Ela vai determinar quem vai receber o quê, quando e quanto em todo o país.

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Os deputados, que têm muito mais sintonia com suas regiões, não vão ter voz, pois para mexer em um tributo que atende uma questão local será obrigatório passar pela burocracia da agência reguladora que nasce com o viés de acabar com as alíquotas locais.

Essa centralização tributária é nociva não apenas em seu impacto econômico, mas também político, uma vez que vai fragilizar ainda mais o parlamento

Será uma pauta a menos a ser comandada pelos parlamentares. Sem poder atender às demandas de seus estados, vão perder a interlocução com a livre iniciativa local.  

O pior será ver essa agência cobrar políticas públicas dos entes federativos como condição de repasse de seus devidos impostos. Isso está por vir com esse modelo. Políticos que hoje representam seus estados darão espaço para a autarquia tecnocrata, distante da realidade econômica e social das várias regiões do Brasil, determinar quais alíquotas e políticas públicas são aceitáveis - como se eles fossem o melhor foro para essas decisões, e obviamente não o são. 

O comitê gestor de tributos é uma agência desnecessária que serve apenas como instrumento de controle e tirania do poder central, e o Congresso Nacional vai perder a maior parte de suas funções; um agente secundário e inibido em sua ação. 

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Esses são os três fatores principais que visam à destruição da Câmara dos Deputados, e foi o que o PT sempre quis. Eles sempre ambicionaram um Executivo forte e a neutralização do parlamento, tornando-o mero carimbador das ações do Executivo.

O PT e a esquerda internacional querem planejamento e controle central, e estão obtendo sucesso em seu intento no Brasil, com a perpetuação de uma Câmara frágil, inibida, comprada, vendida, corrupta e totalmente inútil para tratar dos diversos temas que afetam toda a sociedade.

Há solução para tudo isso, e quem segue essa coluna sabe qual é, basta querer.