Por Daniel Carvalho, membro do comitê médico da Comissão Atlética Brasileira de MMA (CABMMA)
Em esportes de combate, como no MMA, a divisão em categorias de peso serve para proporcionar uma luta justa entre os competidores, além de proteger a saúde dos atletas.
No entanto, nos últimos anos, temos acompanhado evento após evento uma verdadeira batalha dos atletas para enquadrarem-se na sua categoria de peso. Isso cria uma questão de segurança, equidade da luta e efetivamente contorna a finalidade das classes de peso, pois muitos atletas, que devem estar em uma categoria mais pesada procuram “ganhar” uma vantagem competitiva em detrimento daqueles atletas que naturalmente pertencem a esta classe de peso.
O objetivo de atingir o limiar de uma certa classe de peso é, muitas vezes, desidratando o corpo, mas, nem todos os atletas fazem este corte de peso com segurança e gradualmente.
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Confira a lista de mortes em decorrência do MMA
Nos últimos dois anos, dois atletas morrem comprovadamente por consequência da desidratação e perda de peso aguda. Em 2013, o lutador brasileiro Leandro “Feijão” Souza morreu no dia da pesagem, após sofrer um infarto quando estava na sauna. Ele havia tomado diuréticos e tentava perder 15 quilos em uma semana.
Há dois anos, o chinês Yang Jian Bing, de 21 anos, também sofreu um ataque cardíaco e morreu como consequência do corte de peso.
Além disso, vários casos de hospitalizações ao redor do mundo vem sendo reportado, sem contar os inúmeros combates cancelados em virtude do não cumprimento das regras de peso.
Um estudo recente mostrou que aproximadamente 40% dos atletas de eventos de MMA lutam desidratados e que esta perda de peso excessiva, rápida e em ciclos repetidos de perda/ganho de peso, causam diminuição do desempenho, desequilíbrio hormonal, alterações nutricionais e aumento do risco de lesões.
Outros problemas associados à perda de peso e à desidratação inadequadas incluem:
Diminuição da força muscular e resistência: a diminuição do fluxo sanguíneo para os músculos faz com que eles não funcionem adequadamente.
Diminuição da função cardiovascular: a desidratação deixa o sangue mais espesso, exigindo do coração uma maior pressão arterial em médio e longo prazo. Em curto prazo, causa pressão baixa e aumento da frequência cardíaca como forma compensatória.
Uso reduzido de energia, troca de nutrientes e acidose: com a diminuição do fluxo sanguíneo para os tecidos, os nutrientes não são entregues adequadamente e os produtos residuais do corpo não são removidos, aumentando principalmente o acúmulo de ácidos que alteram as funções das células.
Doença por calor: é um conjunto de sintomas causados pela desidratação, sendo eles: cãibras, síncope (perda de consciência) e exaustão pelo calor. A desidratação resulta em diminuição do fluxo sanguíneo para a pele e músculos, seguido por diminuição da capacidade de regular a temperatura corporal. A capacidade de suar torna-se prejudicada, causando aumentos significativos da temperatura corporal.
Diminuição da função renal: A desidratação leva a uma diminuição fluxo sanguíneo e diminuição da função renal.
Problemas de eletrólitos: A diminuição da função renal causa desequilíbrios de eletrólitos, elementos químicos responsáveis pelo funcionamento adequado das células do nosso corpo, como aumentos importantes de potássio e sódio.
Mudanças de Humor e Alterações Mentais: Alguns estudos descobriram que uma perda de 1% a 2% de fluido corporal causa sintomas, tais como ansiedade, mau humor, dificuldade de concentração e um declínio na memória de curto prazo. Além disso, a função cerebral pode deteriorar-se significativamente à medida que a desidratação se torna mais grave. A desidratação grave pode causar confusão e incoerência.
Problemas oculares: A desidratação pode causar visão turva e olhos secos.
Aumento do Risco de Lesão Cerebral: aumento dos riscos de sangramento cerebral e concussão.
A revolução nas regras do corte de peso
Visando criar novas regras de controle da perda de peso, a comissão atlética da Califórnia, juntamente, com entidades de médicos de ring (Association of Ringside Physicians) e a ABC (The Association of Boxing Commissions and Combative Sports) definiram dez novos itens para a regulação da perda de peso.
Estas medidas são um primeiro passo para uma política mais abrangente de saúde e segurança, que visam proteger a integridade física dos atletas, dentro de uma política de “jogo limpo” e competitivo.
As novidades efetivas
1) Solicitar que os lutadores de MMA selecionem a categoria de peso mais baixa para competir. Fazer perguntas sobre o corte de peso e desidratação para que seja aprovado para competir. A divisão escolhida deve ser declarada segura por um médico;
2) O lutador que falhar na pesagem oficial é multado em 20% da sua bolsa, com 10% indo para a Comissão e 10% para seu adversário. Além de um desconto de 20% no bônus de premiação, em caso de vitória, com o dinheiro indo integralmente para o oponente;
3) Quatro classes de peso adicionais — 165 libras (74,8kg), 175 libras (79,4kg), 195 libras (88,5kg) e 225 libras (102,1kg) – para dar aos atletas mais opções. Os eventos podem ou não implementá-las;
4) Alterações de política para a forma como as lutas são aprovadas, com ênfase na categoria de peso apropriada;
5) Restrições de categoria de peso para lutadores que falharem na pesagem mais de uma vez. Esses atletas podem ser obrigados a competir em uma divisão mais pesada até que um médico certifique que é apropriado e a Comissão aprove;
6) Continua o procedimento de pesagem mais cedo, na véspera da luta, para permitir aos lutadores o tempo máximo para reidratação;
7) Uma segunda verificação do peso no dia do evento, para garantir que os lutadores não ganharam de volta mais que 10% do seu peso corporal. Atletas que ganharem peso excessivo podem ser convidados a passar para uma categoria de peso mais pesada;
8) Verificar a desidratação por gravidade específica da urina e/ou física por médicos da Comissão;
9) Recomendação de uma verificação de peso de 30 dias e 10 dias antes para “lutas de título”, semelhante àquelas feitas por algumas organizações de boxe;
10) Exame e educação para matchmakers, promotores de evento, treinadores e atletas na oferta, aceitação e contratação de lutas;
Fontes: California State Athletic Commission, Association of Boxing Comissions e Association of Ringside Physicians.
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