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Madeleine Lacsko

Madeleine Lacsko

Reflexões sobre princípios e cidadania

Direito de Imagem

Bebê pelado da capa de Nevermind processa Nirvana por pornografia infantil

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Ele ficou conhecido por ser uma das imagens mais icônicas do rock dos anos 1990. É capaz que tenha sido a capa de disco de rock mais representativa daquela época. Spencer Elden hoje tem 30 anos de idade e teve seu destino traçado aos 4 meses. Até hoje, não importa o que faça, é conhecido por ser o bebê pelado dentro da piscina na capa de Nevermind, o segundo disco do Nirvana, de 1991.

Sabemos de inúmeros casos de estrelas-mirins que tiveram problemas sérios depois, sem saber como lidar com a fama. Acontece até nos filmes que amamos. Jake Lloyd, que interpretou Anakin Skywalker quando criança na saga Star Wars, disse que toda sua vida escolar foi um inferno por causa disso. Há 6 anos foi estrela de uma perseguição policial, bateu o carro em uma árvore e depois acabou diagnosticado com esquizofrenia.

Há quem faça qualquer coisa para que os filhos fiquem famosos. Estão aí os reality shows de concursos infantis no mundo inteiro fazendo o maior sucesso. É uma escolha da família expor ou não os filhos. Mas trago aqui este caso do bebê da capa de Nevermind para refletir se, hoje em dia, nós sabemos realmente que escolha fazemos sobre a imagem pessoal dos nossos filhos.

Vou ao caso específico de Spencer Elden para começar este raciocínio. Ele processou 15 pessoas que integravam o grupo Nirvana e a produção do álbum Nevermind. A denúncia num tribunal da Califórnia alega que "os acusados promoveram pornografia infantil de Spencer de maneira intencional e comercial e fizeram uso da natureza impactante de sua imagem para promoverem sua música e a si mesmos às custas de Spencer".

O processo aciona o baterista Dave Grohl, o baixista Krist Novoselic, Courtney Love como herdeira de Kurt Cobain, o primeiro baterista do Nirvana Chad Channing (que nem estava mais no grupo quando a foto foi tirada), o fotógrafo Kirk Weddle e diversos integrantes da produção, 15 pessoas ao todo. Pede indenização de US$ 150 mil a cada um deles pelos danos sofridos no período e por utilização indevida da imagem.

Obviamente a foto não teria sido tirada sem o conhecimento dos pais do bebê de 4 meses. Ocorre que eles jamais assinaram uma autorização formal para o uso da foto na capa do álbum. A ideia de fotografar bebês embaixo d'água teria sido de Kurt Cobain, amigo do pai de Spencer Elden. O pagamento pelo trabalho foram US$ 200, a capa e um ursinho de pelúcia.

No processo, Spencer Elden alega que a utilização comercial da imagem de sua nudez infantil teve consequencias. "O dano permanente que sofreu inclui, entre outros, angústia emocional extrema e permanente, com manifestações físicas e interferência em desenvolvimento normal e progresso educativo, perda por toda a vida da.capavidade de gerar renda, perda de salários passados e futuros, gastos passados e futuros para tratamento médico e psicológico e perda do direito de desfrutar a vida", diz a peça judicial.

É realmente possível que a exposição de nudez de uma criança cause todos esses danos? Haveria processo caso houvesse pagamento justo pela foto? Não sei, ainda acompanharemos os desdobramentos. Mas sei que temos muito a pensar sobre a nossa vida. Quem tem o direito sobre a imagem das crianças? Quais as consequências do uso dessa imagem na era da hipercomunicação?

Meu filho nasceu no boom das redes sociais. Toda mãe de primeira viagem sabe a sensação, parece que nunca ninguém teve filho no mundo, o nosso é uma preciosidade que precisa ser vista pela humanidade. Postava todas as fotos mais lindas dele. Tinha o direito, claro. Pensando em direitos, os pais têm o direito de decidir sobre a imagem dos filhos até que eles.possam fazer isso.

Provavelmente você concorda com essa afirmação porque é o mesmo caso. O adulto que posta foto das crianças que ama para compartilhar com quem ama, dividir alegria, espalhar aquele bálsamo de ternura que só existe no olhar das criancinhas. É a maioria das pessoas. Mas não são todas.

Há pessoas que postam fotos e vídeos ridicularizando ou humilhando os próprios filhos e viram perfis badaladíssimos nas redes sociais. Alguns chegam a ser denunciados ao Conselho Tutelar e à polícia porque o sofrimento da criança e a humilhação são visíveis. Os pais tratam como piada e amam ganhar mais seguidores. Neste caso, os pais têm o direito sobre a imagem da criança até que ela decida por si? Não parece mais um valor tão universal. É complexo.

Eu parei de compartilhar imagens do meu filho na internet quando eu recebi a primeira ameaça de morte de milícias digitais. Dois anos depois, foi muito bom que essas imagens não fossem públicas quando o ameaçado foi ele. A hostilidade de alguns anônimos, a proliferação de Pôncio Pilatos no jornalismo e a conivência das redes sociais com ataques em enxame me levaram a repensar as decisões que tomava sobre a imagem do meu filho. Compartilhava imaginando as melhores coisas e os sentimentos mais sublimes, só que não era capaz de prever o resultado. Isso era uma loucura.

Decidi aprender a prever resultados possíveis antes de tomar decisões sobre o uso da imagem dele. Não me perdoaria se o prejudicasse por ignorância, achando que estava tentando acertar. Todos erraremos com nossos filhos mas, podendo evitar, por que não?

Fui atrás de exemplos reais de adultos expostos em redes sociais a vida toda pelos pais. Não tem ainda, preferi que ele não fosse cobaia. Tempos depois, descobri que fotos inocentes e familiares de crianças são sugeridas pelas redes sociais a pedófilos ou dedicados ao tema. As redes botam a culpa no algoritmo e alegam liberdade de expressão. Enquanto houver otário, malandro não morre de fome.

Não estamos diante apenas da decisão de quem tem direito sobre a imagem da criança. Precisamos compreender as consequências do uso dessa imagem neste novo mundo em que vivemos. Ainda parece tudo uma bagunça assustadora, até porque é mesmo. O primeiro passo da faxina é aprender a enxergar onde estão os reais problemas. Cada geração tem seu desafio, o da nossa parece ser navegar no caos de uma revolução na forma que compreendemos o mundo, nos relacionamos e exercemos poder.

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