Falar em valores e respeito é algo totalmente fora de moda em alguns contextos, mas decidi que vale a pena na data de hoje. Desde 2015, 19 de junho é o Dia Internacional para a Eliminação da Violência Sexual em Conflito. O estupro é utilizado no mundo todo como arma de guerra, principalmente contra civis. Enxergar essa realidade, além de honrar os sobreviventes, nos convida a refletir sobre o nível de humanidade e desumanidade com que aceitamos conviver.
"De como tratamos o corpo de mulher, compreendemos nosso nível de humanidade", diz o Papa Francisco.
Há, no mundo, cerca de 50 conflitos praticamente invisíveis porque esquecemos que eles existem. Nesses, a violência sexual de diversas formas é arma de guerra e, segundo o último relatório da ONU, a situação piora na pandemia porque os civis encontram muitas vezes centros de atendimento de denúncias fechados. Falo aqui de guerras como a Síria, que ainda persiste e às vezes esquecemos, e também de conflitos armados como Iraque, Myanmar, Somália, Afeganistão, Congo, Nigéria e diversos outros países.
A utilização da violência sexual como tática de guerra é tão antiga quanto a humanidade porque ela esfacela a alma humana e tem o potencial de desmontar algo muito poderoso: a célula familiar.
“Nas regiões de conflito, o corpo da mulher torna-se um campo de batalha, porque deste modo não é apenas uma violência contra a mulher ou o menor, mas é destruída também a força de união da comunidade, é colocada em evidência a incapacidade do homem de defender a própria família, é um modo de ofender no íntimo mais profundo”, explica Maurizio Simonelli, um dos especialistas que participou da compilação de dados para o relatório sobre essas violações.
As principais vítimas são mulheres e meninas, mas homens e meninos também sofrem violência sexual como forma de guerra e essa é muito subnotificada, já que o medo da desonra supera muito a vontade de denunciar. Estupros são utilizados por milícias armadas para expulsar inimigos políticos e tomar territórios com muita frequência. Nesses casos, tanto mulheres quanto homens são vítimas, como aconteceu já no Sudão do Sul, República Democrática do Congo, Burundi e Síria.
Há, além do estupro, outras formas de violência sexual em conflito: abortos e esterilizações contra a vontade da mulher, prostituição forçada e escravidão sexual, além da utilização da mulher como "reprodutora" por milícias ou terroristas.
É comum que algumas pessoas relacionem os crimes sexuais à sexualidade, já que a experiência que elas próprias possuem, como cidadãos corretos, pode levar a essa confusão. Mas, na experiência do criminoso, o sexo não tem a ver com sexualidade, é um jogo de humilhação. Como diferenciar um do outro? O desejo de reciprocidade. Quem sente desejo quer ser desejado, o criminoso quer o prazer de humilhar, subjugar, destruir a humanidade do outro.
Quando pensamos em guerra, obviamente a primeira ideia é a da destruição material, explosões, mortes, penúria. O desespero se instala da alma humana por algo além disso, pela mistura das dificuldades objetivas com a humilhação. Diariamente nas guerras, milhares de pessoas, homens e mulheres, adultos e crianças, são humilhados, zombados, estuprados e temos pouca consciência desse fato e das consequências.
Que a data de hoje também sirva para abrir nossos olhos para o poder que a violência sexual tem na estrutura da nossa sociedade. Se é algo utilizado como arma de guerra, combater como dramas individuais com polícia e juiz não é suficiente. Quando estamos diante de uma arma com potencial de esgarçar famílias e a comunidade, também temos de nos colocar contra ela como sociedade civil.
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF