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Que atire a primeira pedra quem nunca compartilhou um PDF de livro com um amigo. A nossa história vai um passo além. Na verdade, quase cruza as fronteiras do surreal. É um esquemão de pirateamento e venda por assinatura de livros cristãos. Isso mesmo, de livros CRISTÃOS. Mas não termina aí a história.

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Os piratas foram descobertos por gente do mesmo meio cristão que eles frequentam. Adivinhe qual a reação? Atacaram os autores que reclamaram da venda ilegal das próprias obras. Augustus Nicodemus, Franklin Ferreira e Renato Vargens viraram alvos de quem, apesar de ter lido obras cristãs, se aventura a dizer que está tudo bem ganhar dinheiro vendendo o trabalho de outra pessoa.

No artigo intitulado "PDFs da Discórdia", escrito para a revista Teologia Brasileira, os advogados Jean Regina e Thiago Vieira, esmiuçaram toda a parte legal da aventura dos piratas. Não precisa ser um gênio para adivinhar que é ilegal tomar o trabalho dos outros e vender sem nem avisar, mas eles tiveram o cuidado de ir no detalhe de cada lei.

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É importante deixar bem claro que não estamos falando de alguém que repassou um PDF de um livro religioso a um amigo e depois foi execrado. Trata-se de algo muito diferente, da cobrança de mensalidade para fornecer o PDF do livro sem a autorização nem o conhecimento do autor. E, faço questão de repetir, livros cristãos.

Cá com meus botões, até agora não entendi por que esse povo paga a mensalidade do grupo para receber livros cristãos. Fica claro que, se recebem os livros, não lêem. Se lêem, não entendem. Se entendem, não colocam em prática. Era melhor economizar esse dinheiro ou doar para a caridade para expiar os pecados. Mas isso é só uma opinião individual.

Resolvi conversar com o fundador do site Tu Porém, Jonathan Silveira, que trabalha na área de produção editorial e marketing da Edições Nova Vida, empresa que publica uma boa parte das obras pirateadas nos grupos de Telegram. Difícil elaborar perguntas que não fossem ridículas. É difícil perguntar a alguém que tem seu trabalho usurpado e vendido sem autorização como encara as reclamações de quem fez isso. Ainda mais quando as reclamações se escoram na caridade cristã e o trabalho é cristão. Mas, enfim, ele teve paciência.

Como vocês ficaram sabendo, pela primeira vez, dos grupos que cobram por PDFs de livros de pastores?

Jonathan Silveira - Na verdade, essa prática de disponibilização e compartilhamento de arquivos digitais ilegais de livros ocorre já há longa data em diversos sites. Muitos até mesmo se valem de plataformas confiáveis como o Mercado Livre, Google Drive, Scribd, Academia.edu etc., para disponibilizar os arquivos ilegalmente (seja de forma gratuita ou vendendo). No entanto, tomamos conhecimento por meio de denúncias que muitas pessoas estão se valendo da conveniência oferecida pelo WhatsApp e Telegram para criar grupos de compartilhamento de PDFs (alguns desses grupos no Telegram possuem mais de 7 mil membros!). Por meio de denúncia, por exemplo, tivemos contato com uma pessoa que compra ebooks no site da Amazon, quebra o sistema de segurança dos arquivos, e os revende em sua qualidade original. Quando o livro ainda não está disponível em formato digital na Amazon, esse indivíduo compra o livro físico, escaneia, transforma em arquivo digital e o revende. Os arquivos são oferecidos em formatos PDF, EPUB, MOBI e AZW3. Ao custo de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), uma pessoa tem acesso a uma biblioteca digital de mais de 5 mil livros de diversas editoras cristãs. Esse indivíduo administra um grupo de Telegram onde os arquivos são compartilhados e só é possível participar do esquema mediante indicação.

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Sempre que temos conhecimento de plataformas que estão violando os direitos autorais de nossos autores, denunciamos imediatamente à Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ABDR), que toma as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis.

Em que momento essas pessoas passaram a atacar os pastores que tiveram suas obras roubadas?

Sempre há uma justificativa para continuarem compartilhando esses arquivos ilegais. Os argumentos normalmente utilizados contra os autores e as editoras são: “O preço do livro é muito alto”, “Copiar livros não é roubar”, “Não é ilícito compartilhar arquivos digitais de livros se não há obtenção de lucro” e por aí vai. Além disso, muitos se valem de argumentos supostamente bíblicos para defender a continuação da violação de direitos autorais como se a Bíblia de fato não condenasse tal prática. Em geral, há muita desinformação, má-fé e também desconhecimento da legislação por parte daqueles que compartilham e utilizam livros digitais ilegais.

Você já entendeu o sentido do conjunto da obra? Os livros vendidos ilegalmente não pregam o oposto da ação de venda ilegal?

A doutrina cristã nos mostra claramente que devemos honrar o trabalho de outras pessoas e compensá-lo adequadamente. O oitavo mandamento, por exemplo, estabelece “não furtarás” (Êxodo 20.15). Não faltam textos bíblicos que demonstram a imoralidade dessa prática e nossos livros falam sobre isso de maneira exaustiva e ad nauseam.

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Como os fiéis estão lidando com isso?

Nós, de Edições Vida Nova, frequentemente realizamos campanhas contra a pirataria, a fim de conscientizar o público de como essa prática prejudica os autores, as editoras e também os próprios leitores. Produzimos, um vídeo, inclusive, com um de nossos editores, Valdemar Kroker, no qual explicamos minuciosamente como essa prática é prejudicial a todos. Sempre que promovemos uma campanha como essa, obtemos reações mistas do público: há aqueles que são conscientes da ilegalidade e imoralidade da prática (tanto legal quanto biblicamente falando) e, portanto, se manifestam endossando a campanha, como também há um grande número de pessoas que se manifesta contrariamente, criticando tanto as editoras como os autores por esse tipo de campanha.

Qual sua opinião sobre a crítica de que os pastores teriam de dar suas obras de graça em vez de cobrar?

O processo editorial é laborioso e bastante oneroso. Envolve edição, tradução (se o livro for estrangeiro), diagramação, revisão, projeto gráfico, preço do papel, design de capa etc., ou seja, há um investimento alto até o livro ser publicado. Escritores e profissionais do livro obtém o seu sustento através disso. De fato, é um trabalho digno como qualquer outro e, por isso, merece ser compensado. Claro, não deixa de ser um direito do autor e da editora disponibilizarem o livro gratuitamente se assim desejarem. Mas é um grande equívoco pensar que isso deva ser um imperativo. A caridade em si é importante e um dever para o cristão, mas as formas de caridade variam. Ninguém é obrigado a doar uma casa ou um carro a uma pessoa, por exemplo, só porque uma outra pessoa o fez. Portanto, pessoas que dizem que os autores devem disponibilizar suas obras gratuitamente estão normatizando sobre o tipo de caridade que os autores cristãos devem fazer, mas não estão dispostos a abrir mão de seu próprio salário em benefício de outras pessoas.