O Reino Unido é o único país da Europa que tem punição penal como de adulto para crianças a partir dos 10 anos de idade e agora há pressão para aumentar para 12 anos. Por ali, as idades variam. Luxemburgo é como o Brasil, 18 anos. Portugal pune a partir dos 16 anos, Suécia a partir dos 15 e Alemanha a partir dos 14.
Há diferenças no cumprimento de sentença entre adolescentes e adultos, mas são julgados como alguém que tem consciência do que fez, sabia que era errado, entendia que prejudicava outra pessoa e, mesmo assim, tomou a decisão de fazer.
Alguns casos terríveis e famosos fazem com que o governo britânico bata o pé na maioridade penal aos 10 anos, mas parlamentares, promotores, juízes e quem lida diretamente com o dia-a-dia das cortes juvenis pensam diferente. Para eles, a queda no número de crimes cometidos por crianças dessa idade mostra que é necessário reavaliar a questão.
Isso já foi feito efetivamente na Escócia, que tinha a maioridade penal fixada em 8 anos de idade até maio deste ano, quando o parlamento escocês votou uma lei subindo a idade para 12.
Desde 2011 nenhuma criança de 10 anos foi condenada à prisão no Reino Unido. No entanto, neste ano mais um par de crianças dessa idade foi presa por torturar e matar crianças menores.
O caso mais conhecido de punição de crianças de 10 anos no Reino Unido ocorreu em 1993, quando Jon Venables e Robert Thompson torturaram e mataram seu vizinho de 2 anos de idade, James Bulger. Em 2011, dois irmãos de 10 e 11 anos torturaram por 90 minutos e depois mataram duas crianças menores. A crueldade dos atos e a publicidade dos casos forçam o governo a manter a posição.
A declaração oficial é que “estabelecer a responsabilidade criminal aos 10 anos de idade dá flexibilidade no enfrentamento de comportamentos nocivos pelas crianças e possibilitam intervenção precoce para ajudar a prevenir futuros comportamentos ilícitos".
Nem todos os casos, no entanto, são da gravidade sádica desses, que ficaram famosos. O único caso de criança de 10 anos que chegou à Corte Juvenil de Manchester este ano é de um menino que apontou uma pistola de airsoft para o segurança do shopping e gritou "fat Paki", paquistanês gordo. Foi processado por agressão e ofensa racial, mas o Ministério Público optou por não pedir a prisão, pedir tratamento e acompanhamento.
Falar em números é importante para comparar a realidade do Reino Unido com a nossa. Lá, os crimes cometidos por crianças de 10 anos caem consistentemente desde 2010, quando chegaram a 903 em todo o país - sendo que uma única criança pode ser indiciada em um ou mais crimes. Em 2017, foram 122 crimes em todo o país.
No mesmo período, apenas no Estado de São Paulo foram apreendidos 20.521 menores de 12 a 17 anos de idade. Não se trata de comparação entre números aqui, já que o Brasil nem tem as estatísticas dos delitos cometidos por menores de 12 anos. Mas a proporção e a tendência de aumento ano a ano no Brasil mostram que estamos lidando com realidades muito diferentes.
Há um ponto que chama muito a atenção no processo de discussão da maioridade penal no Reino Unido: a preocupação real com as vítimas.
Como essas discussões no Brasil são frequentemente emocionais e muito útil para o marketing dos políticos tanto a favor quanto contra, as vítimas acabam atendendo a essa demanda em vez de serem tratadas com respeito pelo Poder Público.
Quem é contra a redução da maioridade penal tende a se comportar como se as vítimas, diante de um criminoso menor de idade, não tivessem o direito à verdade, à indignação e à justiça. Quem é a favor de reduzir a maioridade penal frequentemente usa a imagem e o sofrimento das vítimas de criminosos menores de idade sem propor algo concreto para elas.
Na legislação que subiu a maioridade penal de 8 para 12 anos na Escócia, há uma longa explicação sobre como são tratadas as questões importantes para todas as pessoas que podem ter interesse no tema, incluindo a sociedade em geral.
"Nós sabemos que responder ao comportamento infantil de uma maneira criminalizante e estigmatizante serve apenas para escalar o problema e promover novos danos. A Escócia tem métodos comprovados para controntar e corrigir comportamentos infantis sem precisar de resposta da justiça criminal", diz o documento.
As vítimas não são esquecidas, no entanto. "As vítimas saberão que os incidentes serão investigados em sua totalidade para descobrir o que aconteceu, que elas ainda têm direito à informação e a apoio e que as agências governamentais tomarão as medidas necessárias para responder ao comportamento da criança e minimizar o risco de recorrência", declarou o parlamento Escocês.
O Poder Público deve respeito à sociedade e oferecer soluções para o que incomoda. O primeiro passo disso é ter o trabalho de conhecer a realidade para saber quais desafios enfrentar. Não temos nem os dados corretos sobre números de crimes e taxas de solução, mas sabemos que, em homicídios, não chega a 10%.
A população tem todo o direito de se envolver emocionalmente e se exaltar quando fala em maioridade penal e impunidade, as autoridades públicas não. O dever das autoridades é ouvir as demandas do povo e, com base em dados e fatos, encontrar caminhos reais para atendê-las.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
Deputados da base governista pressionam Lira a arquivar anistia após indiciamento de Bolsonaro
A gestão pública, um pouco menos engessada
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF
Deixe sua opinião