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Madeleine Lacsko

Madeleine Lacsko

Reflexões sobre princípios e cidadania

Pandemia

Vacinação de adolescentes: treta política importa mais que informar o cidadão

Uma vacina nova contra uma doença nova terá várias revisões de procedimentos. (Foto: Átila Alberti/Tribuna do Paraná)

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Hoje eu ia escrever sobre outra coisa, mas quando o tema é comunicação em vacinação e combate a epidemias, eu não resisto. Uma das coisas mais importantes e gratificantes que já fiz foi ser parte da equipe que erradicou a pólio em Angola. Não haverá vacina, remédio e médico suficientes se não houver boa comunicação. É revoltante ver o tratamento que nós, brasileiros, estamos recebendo na pandemia.

Decidi parar de ser colunista por um dia e voltar à minha prática da década passada, comunicação durante emergências em saúde. Se você conhece quem tem filhos adolescentes e entrou em pânico com a palhaçada generalizada de hoje, compartilhe o texto. A primeira coisa a saber é que não há razão para pânico e são naturais revisões de procedimentos em vacinas e remédios novos. Agora explico o imbroglio, que é recente e terá um desfecho.

Nós vemos vacinas e remédios como milagres ou salvação, mas eles não são nada disso. Estamos diante da busca pelo mal menor. Aliás, da aspirina infantil à vacina da Covid, não há bem que se faça ao corpo, há contenção de danos. Esqueça neste momento os gigantescos interesses econômicos das Big Pharma - que existem sim - e a manipulação política e narrativa sobre Covid. Pense naquilo que você realmente conhece, cuida e pode controlar, o bem estar da sua família.

Ninguém aplicou em adolescentes algo que mata ou compromete para sempre. Verificou-se antes se havia essa probabilidade. Você já deve ter recebido as postagens questionando a vacinação, muitas delas absolutamente verídicas e fundamentadas na ciência. É bom que essas postagens existam, significa que os cientistas estão acompanhando e revendo procedimentos. Ainda vai acontecer várias vezes, é assim.

O que acontece com a vacina da Covid em adolescentes?

O corpo de crianças e adolescentes é diferente do corpo adulto. Tanto as doenças desenvolvem-se nele de forma diferente quanto remédios e vacinas têm ações diferentes muitas vezes. Para se ter uma ideia da diferença, a taxa de internação por Covid em idosos é de 15%. A cada 100 que contraem a doença, 15 são internados.

Na medida técnica mais usada, a cada milhão de idosos que contraem Covid, temos 150 mil internações. Já entre adolescentes saudáveis, a cada milhão que contraem Covid temos 26,7 internações. Então não precisa de vacina? Ocorre que alguns desses internados morrem e não é admissível perder vidas humanas podendo evitar. Quando você vacina idosos, a probabilidade de internação cai muito e imaginou-se a reprodução deste efeito em adolescentes.

No Reino Unido, na União Europeia, em Israel e nos Estados Unidos, foram acompanhados todos os adolescentes que receberam vacinas para ver se o número de internações caía vertiginosamente como ocorre em outras faixas etárias. Verificou-se que infelizmente isso não aconteceu e, novamente, teremos de buscar novas soluções. Nenhuma mãe e nenhum pai merecem ter de enterrar um filho simplesmente porque estava confuso para nós, adultos.

As taxas de crianças vacinadas internadas não tiveram muita alteração, então foram ver as causas. Miocardite, uma infecção no coração, que é sintoma colateral da vacina, mas insignificante nas outras faixas etárias. Se você consultar o doutor Google, vai ler que é causada por infecção viral e pode gerar morte. Existem infinitos tipos de miocardite e, entre os adolescentes acompanhados, não há registro de morte ou sequelas.

Ocorre que, pelo menos de acordo com os levantamentos preliminares, a chance de um adolescente ser internado pelo efeito colateral da vacina, após tomar duas doses, é maior que a dele ser internado por Covid. Por outro lado, não há registro de mortes pelo efeito colateral da vacina, mas há quem perdeu filho para a Covid. O que se faz agora? Um freio de arrumação. Existe alguma solução melhor que essa e os cientistas vão achar.

O que dizem os estudos

Já havia diversos estudos que suspeitavam da relação entre a miocardite e a vacina, mas não pareciam conclusivos. A informação nova veio na última quinta-feira, com um estudo ainda não revisado, publicado na Universidade da California. O resultado separa meninas de meninos e aí ficou claríssimo o que ocorre. Meninos entre 12 e 15 anos são os que acabam mais internados por efeito colateral do que por Covid.

A probabilidade de um menino saudável que contraiu Covid ser internado é de 26,7 casos em cada milhão. A probabilidade de internação de um garoto de 12 a 15 anos por efeito colateral da 2a dose da vacina é de 162,2 por milhão, 6 vezes mais. Entre os garotos de 16 e 17 anos, a probabilidade é de 94 por milhão, 4 vezes mais. Já entre as meninas de 12 a 15 anos, a probabilidade de internação por efeito colateral da vacina é 13 por milhão, metade das internações por Covid. Nas meninas funciona.

O NHS, Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, está reconsiderando os critérios de vacinação de adolescentes. O mesmo ocorre no CDC norte-americano, na União Europeia e em Israel. O estudo é só com vacinas da Pfizer e Moderna, as únicas que esses países aplicaram em adolescentes. Agora, os cientistas têm diversas sugestões para progredirmos e uma unanimidade: os governos terão de mudar seus planos iniciais.

A questão é como fazer isso. O Reino Unido está recrutando vacinadores para escolas e agora cogita dar apenas a primeira dose para adolescentes. Os números de casos do efeito colateral natural da Pfizer, miocardite, são bem menores na primeira dose e a segunda dose não traz benefícios que compensem este risco.

Entre os especialistas internacionais, a sugestão é fazer um acompanhamento de caso mais aprofundado de um grupo de adolescentes vacinados antes de decidir sobre políticas públicas. Uma das sugestões é fazer um exame de troponina logo após a aplicação da primeira dose. A troponina é um marcador biológico de lesões no tecido cardíaco. Ter troponina no sangue não significa ter um problema do coração que precise de remédio ou hospital, mas todo mundo que tem algo grave no coração tem troponina alta.

Quem foi criança há muito tempo, como eu, lembra que nós pegávamos catapora e as mães já levavam toda a primaiada para pegar. Não havia vacina e a doença em criança é quase nada, em adulto é um pesadelo, gravíssima. O mesmo ocorre com caxumba e sarampo. Até com gripe, que é um resfriadinho no filho e vira uma coisa do outro mundo na gente. Doenças virais são mais graves em adultos.

Espero que esse esclarecimento chegue aos aflitos. É cruel enfiar pais em briga política e tentativa de sinalizar virtude em plena pandemia. O anúncio do ministro da Saúde foi abrupto e sem os esclarecimentos suficientes. As reações a ele pioraram ainda mais a situação. A nota do Ministério da Saúde tem diversas imprecisões. Adversários políticos, jornalistas e cientistas nas redes focaram em desmentir os pontos obscuros e esqueceram de informar o público o básico.

O ministro tem razão quando fala que a Anvisa precisa ser o centro de todas as decisões. Você deve lembrar daquele delírio terraplanista de defenderem a vacina Sputnik contra os técnicos da Anvisa que, no final, estava certíssima. Para vencer um vírus, é preciso unir o povo. Não adianta esperar isso dos nossos políticos, os interesses e as brigas deles vêm sempre primeiro. O anúncio do ministro foi feito de forma incendiária e virou mais uma briga política benéfica para políticos, influencers e jornalismo declaratório. Você, que pagou a entrada do circo e a alimentação do picadeiro, não deve ter visto vantagem nenhuma.

A nota técnica do Ministério da Saúde é uma piada de mau gosto com as famílias brasileiras. As reações a ela são igualmente patéticas. A fixação em desmentir cada ponto para alimentar-se da treta é mais importante que esclarecer as pessoas sobre a saúde dos filhos delas. O Artur Marques, brasileiro que mora na Alemanha, enviou-me o comunicado do governo deles sobre o mesmo tema. O nosso tem uma página mal escrita, o deles é um livro de 56, o 33o a ser publicado para o cidadão comum.

As pessoas só nos tratam da forma que permitimos. Se os políticos acham que não devem satisfação e os formadores de opinião preferem desqualificar político a servir o público, é porque ensinamos isso. O cidadão agora vai assumir um lado da treta, bater boca defendendo um e xingando outro. Formadores de opinião vão desmentir ponto a ponto da nota do Ministério da Saúde. Esse esforço de desinformação e desserviço gerará muitos likes e compartilhamentos do cidadão, que precisa de nomes de peso em seu bate-boca particular sobre o tema.

Em quem confiar? Só deixaremos de ser massa de manobra quando pararmos de ser reféns de paixões e ilusões. Há milênios se divide para conquistar e reinar. Há milênios nos deixamos enganar por quem ganha com divisionismo. Nos apaixonamos por um grupo ou uma ideia e entregamos nosso destino a relacionamentos abusivos. A primeira coisa para combater um vírus é informação de qualidade. Não temos porque ainda não sabemos exigir respeito.

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