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Marcel van Hattem

Marcel van Hattem

Chega de interesses políticos ou ideológicos mesquinhos, anistia já!

Advogados e familiares de presos em 8 de janeiro denunciam série de violações de direitos
Manifestantes nos atos do dia 8 de janeiro de 2023. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.)

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O termo anistia refere-se normalmente ao perdão de dívidas. Neste momento, no Brasil, mais uma vez fala-se muito nessa palavra. Consequência, porém, de uma falsa narrativa, a direita brasileira hoje busca aprovar um “perdão" a centenas de pessoas que, sob o ponto de vista estrito da lei ou da Constituição, nada devem à Justiça. Contudo, ainda assim, estamos a reivindicar que os perseguidos políticos do 8 de Janeiro, bem como tantos outras vítimas dos abusos estatais cometidos pelo Supremo Tribunal Federal, sejam anistiados das penas a que estão sendo condenados injustamente.

É claro que, dentre os brasileiros que participaram dos protestos e vandalismos de 8 de janeiro de 2023, há quem tenha depredado patrimônio público e participado de atividades violentas. Caso identificados, a proposta de lei de anistia, Projeto de Lei 2858/2022, relatado por Rodrigo Valadares, exclui tais contraventores de seus efeitos. Porém, para que isso possa efetivamente ocorrer, é preciso que suas condutas sejam individualizadas – o que até o momento não foi o caso – e que suas penas sejam condizentes com o que estabelece o Código Penal, algo muito diferente das condenações absurdas e desproporcionais de até 17 anos de prisão dadas já a dezenas de investigados pelo STF.

Chegará o dia em que a anistia será aprovada e no qual o Brasil reconhecerá a inocência de milhares de seus compatriotas, perseguidos políticos

Voltando, porém, aos brasileiros que estão sofrendo com processos kafkianos, sem direito a duplo grau de jurisdição, apesar de não possuírem foro especial, sem que suas condutas sejam individualizadas e enfrentando todo tipo de afronta aos seus direitos humanos mais básicos, inclusive em desrespeito às prerrogativas de seus advogados, é inadmissível que o Congresso Nacional permaneça inerte.

A CPI do Abuso de Autoridade, já protocolada e aguardando instalação do presidente da Câmara, Arthur Lira; e o impeachment de Alexandre de Moraes, protocolado no Senado e aguardando deliberação do presidente, Rodrigo Pacheco, são medidas importantes no escopo institucional e de médio prazo, porém ainda insuficientes para endereçar as injustiças diárias a que são submetidos brasileiros inocentes e que clamam por solução imediata.

A cada dia que passa, o cidadão que se encontra na cadeia injustamente ou em situação análoga à prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica e sem direito de acessar redes sociais ou de conviver normalmente com seus amigos e familiares, está perdendo um dia da sua vida que deveria estar desfrutando em liberdade. É um crime protelar a aprovação da anistia a essas pessoas em nome de qualquer outro interesse. A realidade, porém, é que tanto ideológica como politicamente, a Câmara dos Deputados tem atravancado essa discussão, a exemplo do que se observou nesta semana na CCJ.

De um lado, a esquerda demonstra sua completa incapacidade de ser coerente. Em lugar de defender direitos humanos para todos, abraça apenas as garantias fundamentais quando em defesa dos seus. Assassinos, terroristas, assaltantes de bancos… esquerdistas célebres e, de fato, criminosos, obtiveram anistia ainda há poucas décadas no Brasil apesar de terem cometido crimes bárbaros. A justificativa é a de que agiam politicamente, apesar de nem sempre ter sido a ideologia o motivo principal de suas ações.

Agora, diante de brasileiros acusados de golpismo, de terrorismo e de depredação, mesmo sem que haja contra a maioria deles qualquer prova irrefutável ou mesmo duvidosa, o PT e seus puxadinhos preferem obstruir as votações para manter a narrativa que dá sustentação ao governo Lula: a de que foi vítima de uma tentativa de golpe de Estado conduzidos por vovozinhas com a bandeira do Brasil no ombro e uma Bíblia na mão. Risível – e revoltante.

De outro lado, a disputa pela presidência da Câmara entre diferentes candidaturas revela que o mesquinho interesse da busca do poder pelo poder é mais forte do que a empatia com quem está injustamente encarcerado pelo Estado. Antônio Brito, Elmar Nascimento, Hugo Motta: os três candidatos à presidência da Câmara não apenas têm dado sinais de desinteresse na matéria como, de forma repugnante, os partidos dos primeiros auxiliaram na obstrução à tramitação do projeto de lei na última semana e o padrinho do último, Arthur Lira, preferiu puxar o fio da tomada usando da manobra de abrir a Ordem do Dia no plenário da Câmara encerrando a reunião da CCJ quando a comissão estava prestes a deliberar sobre a matéria. O objetivo sórdido de todos é manter a carta do PL da Anistia na manga nas negociações do apoio da oposição às suas candidaturas na sucessão da presidência da Câmara. É como o terrorista que faz reféns para obtenção de finalidades políticas: a chantagem é explícita.

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É fundamental, portanto, que a oposição mantenha sua pressão e, principalmente, que a sociedade acompanhe cada passo o mais próximo possível. A presença de familiares de presos políticos na reunião da CCJ, em especial da viúva e órfãs de Cleriston Pereira da Cunha, o Clezão, morto na Papuda sob custódia do Estado, foi fundamental para que o tema, pelo menos, fosse pautado e avançasse.

É preciso expor à sociedade os comezinhos interesses ideológicos e políticos que tentam se sobrepor ou que fazem perverso uso da dor dessas pessoas. Chegará o dia em que a anistia será aprovada e no qual o Brasil reconhecerá a inocência de milhares de seus compatriotas, perseguidos políticos que farão jus à reparação do Estado, na medida daquilo que será possível reparar pois, infelizmente, o tempo e as vidas perdidas jamais voltarão.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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