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Marcio Antonio Campos

Marcio Antonio Campos

Vaticano, CNBB e Igreja Católica em geral. Coluna atualizada às terças-feiras

Moral e sacramentos

O que desejam os defensores do “caminho sinodal” alemão?

Integrantes da Assembleia Sinodal alemã durante entrevista coletiva em fevereiro de 2022; o bispo Georg Bätzing é o segundo da esquerda para a direita. (Foto: Roland Wittek/EFE/EPA)

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Admito, já fui mais fã do cardeal Christoph Schönborn, arcebispo de Viena. É discípulo de Joseph Ratzinger, foi editor do Catecismo da Igreja Católica, até resenhei positivamente um livro dele no meu blog de ciência e fé. Mas, de uns anos pra cá, ele tem liderado (ou ao menos presenciado impassivelmente) uma avacalhação da liturgia em sua arquidiocese, sem falar de declarações bem complicadas no campo de vista moral, por exemplo sobre o reconhecimento de uniões homoafetivas. Já o cardeal Walter Kasper nunca me inspirou muita confiança mesmo; ele foi o grande promotor da ideia de dar a comunhão indiscriminadamente a católicos divorciados que estivessem em uma nova união civil e que acabou se tornando um dos temas centrais do Sínodo sobre a Família de 2014-15 – uma bela resposta às propostas de Kasper está em um livro de Stephan Kampowski e Juan José Pérez-Soba –, mas antes disso já costumava defender algumas ideias bem heterodoxas em termos de ecumenismo e moral.

Então, quando tanto Schönborn quanto Kasper criticam o tal “caminho sinodal” alemão, é porque a coisa está mesmo saindo completamente do controle. Em junho, Schönborn concedeu uma entrevista criticando os ataques do “caminho sinodal” ao ministério ordenado e à Tradição católica. Kasper já tinha usado termos até mais fortes em novembro de 2021, quando falou em “sínodo farsesco”, e voltou a tratar do assunto no fim do mês passado, poucos dias depois da entrevista de Schönborn, afirmando que não se deve “reinventar a Igreja” e que a insistência da Assembleia Sinodal em desafiar o ensinamento católico equivalia a um “golpe de Estado” dentro da Igreja.

Se os alemães conseguem fazer Christoph Schönborn e Walter Kasper soarem “conservadores”, então é porque todos os limites foram ultrapassados. E meio que foram mesmo

O “caminho sinodal” alemão já foi bastante criticado por bispos e cardeais de fidelidade indiscutível ao ensinamento católico, como Raymond Burke e George Pell. Até aí, é o esperado. Mas, se os alemães conseguem fazer Schönborn e Kasper soarem “conservadores”, então é porque todos os limites foram ultrapassados. E meio que foram mesmo.

Afinal, esse “caminho sinodal” consiste em uma Assembleia Sinodal composta por todos os bispos do país, mais um número equivalente de leigos de um aparelhadíssimo Comitê Central de Católicos Alemães, e representantes de ordens religiosas e outros grupos católicos. Seu trabalho, iniciado em 2019 e previsto para terminar em 2023, é passar resoluções que basicamente negam toda a moral sexual da Igreja, além de minar os sacramentos do Matrimônio, da Eucaristia e da Ordem: ordenação de mulheres, cerimônias públicas de bênção para uniões homoafetivas, comunhão para divorciados em nova união, aceitação da contracepção artificial, está tudo lá. Ainda por cima, há uma pressão para que as resoluções dessa assembleia se tornem “impositivas” para todas as dioceses alemãs.

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E o papa? Francisco mandou uma carta aos católicos alemães já em 2019, alertando para a crise de fé no país e pedindo foco na evangelização. Mais recentemente, ele afirmou, em conversa com os editores de revistas jesuítas, ter dito ao presidente da conferência episcopal alemã, Georg Bätzing, que “vocês já têm uma boa Igreja Evangélica, não precisamos de duas”. Bätzing é um entusiasta do “caminho sinodal” e já disse estar decepcionado com o fato de o papa Francisco não realizar as mudanças que eles querem – algo que, como bem sabemos, papa nenhum pode fazer mesmo. Até o finado Carlos Heitor Cony, ateu, sabia disso e o afirmava em suas crônicas sempre que apareciam esses clamores por “mudanças” na Igreja.

Bätzing também respondeu às críticas de bispos, garantindo que a Igreja na Alemanha não caminha para um cisma. Bom, disso eu nunca duvidei, e isso tem a ver com o que realmente querem os promotores do “caminho sinodal”. O papa acertou na mosca com seu comentário irônico a Bätzing, pois já existem não uma, mas várias igrejas no mundo inteiro que fazem tudo isso que os “sinodais” alemães desejam: ordenam mulheres, aceitam todo tipo de relacionamento sexual etc. Não seria muito mais fácil eles simplesmente deixarem de ser católicos e entrarem em alguma dessas igrejas, aquela que mais lhes apeteça? Claro que seria, mas não é esse o ponto. Se os dissidentes apenas saíssem, a Igreja Católica continuaria defendendo a sã doutrina, a santidade do casamento, a moral sexual conforme a natureza humana, e é isso que os defensores do “caminho sinodal” não suportam. É preciso, para eles, transformar a Igreja por dentro para que não sobre mais ninguém proclamando a verdade; um cisma formal não serve, pelo contrário: seria a opção mais contraproducente porque deixaria claro o caráter dessa rebelião. É óbvio que esse objetivo de revolucionar a Igreja não tem como ter sucesso, mas causa lá seu estrago.

Não é coisa só da nossa cabeça

Na Nicarágua, o ditador Daniel Ortega expulsa do país as Missionárias de Caridade (a ordem religiosa fundada por Santa Teresa de Calcutá). Na Espanha, radicais de esquerda achincalham o arcebispo de Pamplona e outros membros do clero durante a tradicionalíssima Festa de São Firmino (boa parte da cobertura jornalística tratou o caso como um protesto puramente político, dirigido ao prefeito de Pamplona, mas nas imagens – como a que encabeça esta reportagem – é possível ver também cartazes com mensagens anticlericais). Na Nigéria, dois padres são mortos por extremistas no fim de junho. Nos Estados Unidos, abortistas vandalizam igrejas após a histórica derrubada de Roe v. Wade. Mas ainda tem gente querendo que acreditemos que “cristofobia” é algo que só existe nas nossas cabeças...

Biden dobra a aposta. Como os bispos responderão?

O presidente norte-americano, Joe Biden, assinou uma ordem executiva (de alcance ainda incerto) para tentar ampliar o acesso ao aborto nos Estados Unidos, e disse não descartar a decretação de um estado de emergência de saúde pública, tudo para tentar reverter os efeitos da decisão recente da Suprema Corte e contornar o poder dos estados, que agora podem proibir o aborto. Ou seja, ele está trabalhando ativamente para promover o aborto em seu país. O que mais Biden e sua cúmplice no Legislativo, a deputada Nancy Pelosi, precisarão fazer para o cardeal-arcebispo de Washington acordar? Sacrificar um bebê de 22 semanas em um culto satânico em pleno Salão Oval da Casa Branca?

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