Parece que foi ontem: toda e qualquer situação capaz de constranger o governo era imediatamente atribuída ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Na pior das hipóteses o grão-mestre tucano servia como régua de comparação. Não importava quantos anos já haviam se passado desde a constituição do zeitgeist petista, tampouco o fato de FHC ter entregue a Luiz Inácio um país redondo. A narrativa precisava ser martelada para tomar conta do inconsciente coletivo.
O fato de o governo Bolsonaro usar e abusar de estratagemas caros ao PT enquanto este comandou o país não é novidade. Ele se vale inclusive, e com destaque, do discurso divisionista e da exigência de devoção. Entretanto vale destacar a desenvoltura com que o presidente, seus ministros e rebentos se negam a assumir qualquer responsabilidade pelas várias mazelas amealhadas em pouco mais de dez meses.
São inúmeros os episódios. É como se Dilma Rousseff tivesse deixado a cadeira semana passada. Ou que um governo de transição como o de Michel Temer, capaz de preparar um terreno menos árido para quem viesse depois, nem sequer houvesse tido vez. E, se você que me lê não estiver com a memória em seus melhores dias, nem é preciso se esforçar muito: ontem mesmo (24) o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Partido Novo), usou sua conta no Twitter para insinuar que o Greenpeace estaria por trás das toneladas de óleo que avançam por toda costa brasileira.
Nem mesmo por instantes a ilação do ministro fica de pé, contudo isso pouco o interessa. Salles não está preocupado em elucidar os fatos, mas somente em se livrar da culpa. E para isso nada melhor do que sapecar um espantalho qualquer no porão de antolhos usados desde a eleição para conduzir a massa à credulidade e imbecilização.
Outro exemplo no mesmo estilo? Há cerca de um mês, quando do vexame internacional por conta das queimadas na Amazônia, o presidente Jair Bolsonaro apontou o dedo para ONGs. Sempre sem provas, na base de um achismo empapado de ignorância, o mito não se refutou em criar mais uma teoria conspiratória forjada no molde da dicotomia eleitoral.
A postura do governo, para dizer o mínimo, é indigna. Todavia ela diz muito sobre nós. Só uma sociedade especialmente obtusa poderia ser capaz de comprar, por anos, entra governo, sai governo, uma retórica que consiste em atribuir a conta ao antecessor.
No caso do bolsonarismo, pelo menos, há um quê de deboche: não se trata apenas de botar suas caneladas na conta dos rivais políticos. Tudo vale para forçar o discurso. E quanto mais improvável for a tese, melhor ela fica.
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