“No Brasil, não tem essa coisa de professor estar na sala de aula fazendo militância política. Alguns até fazem, mas são exceções. E exceções devem ser tratadas como exceções. Você vai censurar, monitorar o que o professor está falando em sala de aula? Isso é descabido.”
Quem opina é ACM Neto, presidente nacional do DEM, partido até o momento representado no futuro governo Bolsonaro por três ministros (Onyx Lorenzoni na Casa Civil, Tereza Cristina na Agricultura e Luiz Henrique Mandetta na Saúde).
A crítica deveria incomodar a próxima administração, pois vem de um importante aliado político, e o país, por fazer todo sentido.
Em entrevista concedida à Folha, o prefeito baiano demonstrou que a sua preocupação extrapola o Programa Escola sem Partido: “Me preocupa muito que o governo queira apagar um passado equivocado de um viés ideológico de esquerda imprimindo um viés ideológico de direita. […] Temos que ficar atentos para evitar que exageros aconteçam numa área e na outra”.
Vale destacar que o Escola sem Partido foi rejeitado inclusive por Olavo de Carvalho, prócer do fanatismo à direta da arquibancada a tal ponto que conseguiu emplacar dois ministros no time de Bolsonaro — Ernesto Araújo no Itamaraty e o colombiano Ricardo Vélez Rodríguez na Educação.
Mais do que razoáveis, as falas de ACM são complementares. Dialogam, inclusive, com o discurso de Janaína Paschoal em julho, durante a Convenção Nacional PSL, quando questionou o “pensamento único” e o perigo de o partido se transformar em um “PT ao contrário”.
Janaína antes e ACM Neto agora estão cobertos de razão. E não consigo encontrar motivos para supor que seus temores não se confirmem.
Na verdade, o processo de substituição de uma influência de esquerda por outra conservadora já começou. Assim como a retórica de quem se diz conservador já se assemelha com aquela historicamente adotada pela militância petista.
Como se fossem robôs funcionando no automático, os mais ferrenhos apoiadores de Jair Bolsonaro simplesmente se recusam a tolerar quaisquer críticas ao futuro presidente.
Para esses, a premissa acolhida quando a crítica acontece é tão banal quanto imatura: quem reclama de Bolsonaro só pode ser petista, devoto de Lula ou alguém preocupado com a perda de privilégios comuns no período em que o Partido dos Trabalhadores esteve no poder.
ACM Neto foi bem. Acendeu o alarme. Infelizmente, porém, tarde demais.
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