“A eleição de Renan Calheiros não chega a pôr em xeque a retórica de Jair Bolsonaro durante a campanha, mas é claro que respinga no alardeado purismo desta chamada “nova era”— graças também à infantilização do eleitor, sua incapacidade de enxergar a política para além da paixão clubística.
Ainda assim, tanto o resultado no Senado quanto na Câmara vão conformando um cenário alvissareiro para a administração recém-eleita e para o país, uma vez que a agenda de reformas deve encontrar um caminho menos tortuoso do que se previa.
E se a economia se ajustar, o eleitor não só esquecerá o mau cheiro da velha política quanto endossará sua continuidade.”
Foi com o trecho acima que encerrei minha coluna anterior aqui mesmo, na Gazeta do Povo. E ele não apenas fazia sentido naquele momento como ainda faz. O que significa dizer isto mesmo que você, que me lê, está deduzindo.
A vitória de Davi Alcolumbre pode até ter provocado arroubos típicos de períodos eleitorais — não por acaso, ecos de um pleito marcado pela negação do que se convencionou chamar de “velha política” —, mas que o cidadão atento ao noticiário e na torcida pela reforma da Previdência não se iluda: era melhor para o governo ter Renan Calheiros como aliado do que será tê-lo como adversário.
Em um primeiro momento a avaliação é tão simples quanto preferível de ser feita por aqueles dispostos a enxergar o copo meio cheio. Os sucessos de Rodrigo Maia na Câmara e Alcolumbre no Senado, ambos do DEM, assim como Onyx Lorenzoni, apontam um caminho favorável para as mudanças que o país tanto almeja, com destaque para a economia e a segurança pública. Na prática, contudo, o cenário impõe preocupações à nova gestão, uma vez que, graças à inabilidade do ministro da Casa Civil, ambos os resultados oferecem desafios indigestos.
Com relação ao primeiro caso, Maia terá todas as condições para escantear Lorenzoni uma vez que este trabalhou pela sua derrota. É principalmente no Senado, entretanto, que o governo tende a se enrolar após a interferência de Onyx, que resultou não apenas na vitória de um senador obscuro, e portanto sem comprovada capacidade de articulação, mas acima de tudo em uma vitória apertada, que indica divisão e um confronto marcado com senadores experientes.
Pois, sim, que o presidente não conte com o senso patriótico de Renan Calheiros, Kátia Abreu, Paulo Rocha e grande elenco. Tampouco imagine que seja muito complicado para eles atrapalhar ou mesmo barrar pautas importantes como a da própria Previdência.
Em linhas gerais, a revelação feita pelo senador Jorge Kajuru (PSB-GO) de que criara uma enquete nas suas rede sociais para que o eleitor decidisse como ele deveria votar é sintomática: o nosso Congresso não é apenas formado por parlamentares inescrupulosos, interessados somente na própria sobrevivência política e em alguns casos até mesmo em despistar a Justiça. Há também uma turma recém-chegada que não faz a menor ideia do peso da sua responsabilidade e que confunde boa intenção com populismo barato.
Enquanto isso, Renan Calheiros, um dos senadores historicamente mais hábeis na hora de fazer costuras políticas — e cuja existência, por mais repulsiva que possa parecer, é uma realidade —, é deixado de lado. Ele e os seus. Com toda sorte de traumas que envolveram as duas sessões.
O Brasil precisa urgentemente de reformas e a da Previdência acima de todas. Dito isso, torço para que o governo compreenda que a eleição já passou. Cabe agora ser pragmático. Que esqueça um pouco as redes sociais e se concentre no que deve ser feito para viabilizar um projeto econômico sem o qual todos os demais não terão vez.
Pragmatismo, repito. Ou o fracasso virá à galope.
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